Privatização. TAP pronta para levantar novo voo

Privatização. TAP pronta para levantar novo voo


Depois da última injeção feita pelo Governo, a companhia de aviação está pronta para ser privatizada. Executivo acredita que caderno de encargos estará pronto até março, mas especialistas deixam alertas quanto à operação.


A TAP já está preparada para ser vendida, após a última entrada de capital na companhia aérea, no valor de 343 milhões de euros e a par da conclusão das operações societárias na Portugália, na UCS – Cuidados Integrados de Saúde e na Cateringpor, detidas pela TAP SGPS. A empresa acaba de anunciar que transportou 16,1 milhões de passageiros em 2024, mais 1,6 %do que no ano anterior. As regras de privatização serão decididas até ao próximo mês de março, altura em que o caderno de encargos será conhecido, assim como a definição da percentagem do capital a alienar.

Ao Nascer do SOL, Sérgio Palma Brito afirma que as aquisições destas companhias «foram meras manobras contabilísticas internas sem qualquer significado». Mas com ou sem manobras, o especialista chama a atenção para a importância de o Governo criar «nos termos da lei uma comissão de acompanhamento formada por pessoas credíveis e independentes com a missão de garantir a transparência do processo de alienação», defendendo que espera que o ministro Miguel Pinto Luz «compreenda isto muito facilmente».

Já Pedro Castro, especialista em aviação, estranha a integração da Cateringpor e recorda que a Comissão Europeia, em troca da recapitalização de três mil milhões de euros, impôs uma série de condições e restrições. Como tal, a empresa deveria ser privatizada à parte da TAP. «Apesar de a operação estar dependente da decisão do Tribunal de Contas, parece que o Governo já está a contar com luz verde, o que não é o suposto. O suposto é estas entidades serem objetivas e independentes para porem em causa aquilo que o Governo acha. E o Executivo, nas suas declarações, quase que reduz isso como se fosse ‘falta só o carimbo’», diz ao nosso jornal.

O responsável põe também em causa a última entrada de capital na companhia de aviação. «Se a TAP dá lucros, se a TAP está numa boa situação, por que é que foi feita esta última injeção?», questiona. E acrescenta: «A doação que os portugueses fizeram à TAP terminou agora com essa última transferência mas a reestruturação não, só termina no final de 2025».

Potenciais interessados

Já em relação à percentagem a alienar, Sérgio Palma Brito não tem dúvidas: «Quanto a vender a 100% do capital estou de acordo, tenho quase a certeza que será essa a posição do ministro, mas não é de certeza a posição de Pedro Nuno Santos, que já reafirmou isso inúmeras vezes, e tanto quanto sei o Chega não é muito favorável à reprivatização da TAP. Podemos ter daquelas situações em que a TAP está pronta, mas o Estado português não. São precisos dois para dançar o tango».

Para já, há três grandes interessados na compra da TAP que já se reuniram com o Governo. O International Airlines Group, dono da British Airways e da Ibéria, a Air France e a alemã Lufthansa. A confirmar-se a aquisição por um destes grupos, a empresa irá tornar-se num dos grandes europeus, mantendo o hub estratégico em Lisboa, sendo a ponte aérea entre a Europa e o Brasil.

Pedro Castro vê com naturalidade esta participação de interesses. «Enquanto companhia aérea manifestaria sempre o interesse na TAP para ter acesso a todos os dados que vão estar disponíveis ao investidor. Estes três grupos, ainda que com as cláusulas de confidencialidade, vão ter acesso a todos os dados de como a TAP – um concorrente seu – funciona», acrescentando que cada um desses investidores já está a fazer a sua vida sem a empresa portuguesa. E dá exemplos: «A Lufthansa está agora ‘entretida’ com a ITA e já revelou que o que quer fazer com a ITA, em Roma e no hub de Roma, é algo parecido ao que poderá fazer em Lisboa».

Já em relação à Air France KLM, o especialista acredita que o que tem programado e planeado para a TAP também o poderá fazer com a Air Europa, «uma companhia espanhola muito semelhante à TAP no seu conceito de exploração do tráfego para as Américas», recordando que a empresa também estava interessada em comprar a Iberia e só não o fez porque a Comissão Europeia não iria aprovar essa aquisição. «Está ali aberta uma janela de oportunidade para a Air France KLM com a Air Europa, que já faz parte da aliança da Air France KLM que é a aliança Sky Team», salienta.

Quanto à IAG, chama a atenção para o facto de ainda não ter um plano B para a TAP. «O plano B da IAG para a TAP era a Air Europa. Não havendo, está livre», conclui.

Pouco otimista em relação aos potenciais interessados está Sérgio Palma Brito. «Quem analisar o dossiê verifica que o grupo que mais precisa de comprar a TAP por causa dos voos para o Brasil é a Lufthansa e é o grupo que pode manter o hub dos Estados Unidos de que ninguém fala. Já o IAG pode vir com falinhas mansas, no entanto, tem várias declarações em relatórios e contas a dizer que quer fazer de Madrid um grande hub ao nível de Amesterdão e nesse sentido o que faria ao hub de Lisboa?», questiona, acrescentando ainda que há que somar mais problemas. «Os voos Brasil não são deslocalizáveis porque fazem parte de um acordo entre o Governo português e o brasileiro. E como o IAG tem a Iberia, o hub Estados Unidos ficaria ameaçado porque concorre diretamente com Madrid».

E aponta o dedo à Comissão Europeia. «A politica de concorrência da Comissão Europeia no que toca às fusões e consolidações das companhias áreas na Europa é errada, estúpida e suicida. Estão muito preocupados com o facto de haver monopólio ou quase monopólio dentro da Europa e esquecem-se que as companhias europeias estão em concorrência com as americanas e que a consolidação é um fator da competitividade. A Comissão Europeia está a cometer um erro histórico».

Recorde-se que o administrador do IAG já disse que o negócio da TAP é interessante por «muitas razões», como o hub que é visto como «um ativo tremendo», assim como a conectividade com a América Latina e com a América do Norte, que seria «um bom complemento» à operação das companhias que compõem o grupo IAG, como a Aer Lingus.

O mesmo caminho é seguido pelo grupo da Air France. «Temos interesse em seguir esta oportunidade, assumindo que está dentro das nossas ambições estratégicas e que somos capazes de cumprir com o que o Governo português procura», já afirmou o presidente executivo do grupo aéreo franco-neerlandês, Benjamin Smith. Também a Lufthansa tem mostrado o seu interesse em adquirir a TAP, mas acenando uma posição minoritária: menos de 20%.