Winston Leonard Spencer Churchill (1874-1965) era filho do chanceler Lord Randolph Churchill, fazia parte da alta aristocracia e estava destinado a altos cargos. Foi militar, estadista, escritor e político, com forte ligação ao Partido Conservador, embora se considerasse um liberal que defendia o livre comércio e melhorias para a classe trabalhadora. A vida do político inglês teve múltiplas e contraditórias facetas e criou, naturalmente, amigos e inimigos. Afirmou não se importar com a opinião dos outros, e disse: “Você tem inimigos? Bom. Significa que lutou por algo alguma vez na vida”. Ficou na história por ter sido primeiro-ministro do Reino Unido em duas ocasiões, e o grande responsável por parar o avanço nazi nos primeiros anos do conflito. “Velho como um profeta, jovem como um génio e sério como uma criança, avança carregado de poder e dever”, foi assim que o escritor Albert Cohen o definiu na época.
No dia de 10 maio de 1940, Hitler anunciou: “A ofensiva contra as potências ocidentais começou”, o seu plano consistia em ocupar os Países Baixos, a França e chegar a Inglaterra. Só que nesse mesmo dia Churchill assumiu o cargo de primeiro-ministro da Grã-Bretanha. Com a sua incendiária oratória ganhou o respeito do povo britânico. Para a história ficou o importante discurso “Finest Hour”, no qual inspirou os britânicos a lutar e resistir à “blitz de Londres” – bombardeamentos realizados pela Luftwaffe a Londres e outras cidades do Reino Unido – e a célebre a frase onde disse nada ter a oferecer, a não ser sangue, suor e lágrimas.
Conquistou importantes aliados, como foi o caso do Presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt – encontraram-se nove vezes durante a guerra – mas também criou inimigos para a vida, como foi Adolf Hitler. A rivalidade e a diferença entre os dois chefes de Estado ficaram bem patentes na forma como conduziram a guerra e o resultado que as suas ordens tiveram no desfecho do conflito. Se, em Dunquerque, Churchill ordenou a retirada de 300 mil soldados, encurralados por uma divisão panzer alemã no norte da França, para garantir a segurança da ilha, Hitler determinou que recuos equivaliam a traições, enviando milhares de soldados para a morte no inverno russo.
Churchill comandava o país a partir da cave de um prédio de escritórios, com a particularidade de fazer reuniões nas horas mais inusitadas. O Churchill War Rooms tornou-se um ponto turístico de Londres. Era extremamente sociável e amante de bons charutos e de uísque, que aprendeu a gostar aquando da sua passagem pela Índia. Hitler era um solitário, um homem extremamente formal, vegetariano e abstémio, em sua casa não era permitido o consumo de álcool.
Rivalidades Na década de 30, uma parte da elite britânica mostrava alguma simpatia ideológica pela política de Hitler. Contudo, Churchill sempre viu com enorme preocupação o desrespeito da Alemanha nazi ao Tratado de Versalhes, temia a modernização do exército alemão e denunciava o expansionismo germânico iniciado a partir da anexação da Áustria, em 1938. Criticou de forma contundente a postura do primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, e a forma complacente como aceitou o expansionismo germânico. Durante o conflito, o secretário dos Negócios Estrangeiros, Lord Halifax, era favorável a uma negociação com a Alemanha, o que irritou o primeiro-ministro Winston Churchill, que chegou a dizer com humor “se Hitler invadisse o inferno, eu faria pelo menos uma referência favorável ao diabo na Câmara dos Deputados”.
Hitler tinha expressado a sua admiração pelo reino britânico e esperava que a Grã-Bretanha negociasse a paz, tudo o que ele queria de Londres era um acordo que lhe permitisse dominar o Velho Continente. Foi a tenaz resistência de Churchill a qualquer tipo acordo ou tratado com Hitler que levou o Führer a cometer o grande erro de invadir a URSS, que marcou o início da derrota da Alemanha nazi.
A vida política de Churchill teve muitas contradições, uma delas foi a sua admiração por Benito Mussolini, o que motivou fortes críticas dos seus inimigos internos. Na opinião de Churchill, foi o Dulce que impediu que o bolchevismo se espalhasse pela Europa Ocidental depois de 1918, mas considerou um erro imperdoável ficar ao lado do Führer. O inimigo clássico de Churchill foi o general Charles de Gaulle, que fugiu para a Grã-Bretanha quando as tropas alemãs entraram em Paris. As quezílias entre os dois foram por vezes intensas. Depois de a guerra terminar, Churchill disse que “lamentaria viver num país governado por De Gaulle, mas lamentaria ainda mais viver num mundo, ou numa França, em que não existisse um De Gaulle”.
Ao mesmo tempo que defendia a Grã-Bretanha da ameaça nazi, Churchill lutou também para preservar o império britânico na Índia. Mohandas Karamchand Gandhi estava entre os seus inimigos, pois era visto com um “político bélico e um dínamo da destruição” e considerava-o uma ameaça à joia da coroa imperial. Dedicou-lhe inúmeros insultos racistas e chegou a dizer que o deixaria morrer na sua greve de fome: “Gandhi não deveria ser libertado por causa de uma mera ameaça de jejum”, disse. Esta inimizade foi mais uma prova da sua complexidade. O homem que desafiou Hitler e proclamou as virtudes da liberdade era o mesmo que perdia a noção de Estado com Mahatma Gandhi por apelar à desobediência civil não violenta contra os ingleses.
Relações difíceis A nível interno, Churchill nunca assumiu um compromisso permanente com qualquer partido, o seu caminho político teve sempre a ver com interesses pessoais. Em 1901, foi eleito para a Câmara dos Comuns pelo Partido Conservador e considerou os Liberais como uns “idiotas e puritanos”, afirmando ter desdém por hipócritas de todos os tipos e um ódio aos extremistas. Passado quatro anos deixou os conservadores, conscientes da animosidade que criou em muitos membros do partido. Saiu em defesa do comércio livre e do Partido Liberal e não poupou nas palavras: “Odeio o Partido Conservador, os seus homens, as suas palavras e seus métodos”. Apesar desta mudança ideológica, é um facto que esteve sempre mais perto do Partido Conservador, embora tenha sido um relacionamento tempestuoso.
Um dos episódios mais marcantes da vida política britânica foi a relação entre Churchill e Lloyd George, talvez os dois políticos britânicos mais importantes do século XX. As suas carreiras ministeriais abrangeram duas guerras mundiais, e existem mais de 1.000 cartas trocadas entre os dois políticos. Durante 40 anos foram adversários, por vezes aliados e outras rivais. Em público, tinham temperamentos totalmente opostos e, muitas vezes, discordaram violentamente sobre política, mas continuaram a ser amigos.
O primeiro-ministro ganhou a guerra, mas perdeu as eleições para o Partido Trabalhista de Clement Attlee, em julho de 1945, que defendia um Estado social moderno e uma política socialista. Deixou o cargo, mas manteve-se no Parlamento como líder da oposição “eles têm o direito de nos expulsar. Isso é democracia. É por isso que estamos a lutar”, afirmou na sua habitual forma de ver a política. Em 1951, retornou à posição de primeiro-ministro, permanecendo no cargo até 1955, quando renunciou devido a problemas de saúde.
Winston Churchill foi um exímio escritor, recebeu o Prémio Nobel da Literatura em 1953, e algumas das suas frases ficaram na história. Foi o primeiro a definir, em 1946, os países comunistas como aqueles que estão atrás de uma “cortina de ferro”, mas proferiu também declarações e comentários depreciativos, sobretudo sobre diferentes e nunca escondeu a sua crença na supremacia branca, ficando célebre a frase: “Os indianos estavam a reproduzir-se como coelhos”. Defendeu também o uso de gás venenoso contra curdos, afegãos e outras tribos: “Sou fortemente a favor do uso de gás venenoso contra tribos incivilizadas”, disse na altura, naquilo que alguns historiadores justificam com o desejo quase infantil de chocar os que estavam mais próximos. Os seus defensores disseram que essa controvérsia era descabida porque “o que ele se propunha era usar gás lacrimogéneo e não gás mostarda”.
Por tudo isso, alguns setores do Reino Unido querem rever o papel do antigo primeiro-ministro na história do Reino Unido, isto, depois de sido eleito o “Greatest Briton”, ou seja, a personalidade britânica mais importante da história, numa votação da BBC feita em 2002. Os seus defensores argumentam que Churchill não deveria ser julgado pelos padrões de hoje, e que, apesar de suas falhas, era um grande homem.