New Year, Same Planet. Seca, inundações e calor extremo entre os desafios para 2025

New Year, Same Planet. Seca, inundações e calor extremo entre os desafios para 2025


2025 marca um novo capítulo na corrida contra o aquecimento global. Fenómenos como inundações, incêndios, calor extremo e seca estão entre os desafios ambientais para este ano. O relógio climático não pára: restam apenas quatro anos para agir.


2025 representa menos um ano na contagem decrescente para evitar os piores impactos das mudanças climáticas. Temos quatro anos e 198 dias para limitar o aumento da temperatura global a 1,5 graus Celsius, de acordo com climate clock (relógio climático). Este limite é crucial para evitar eventos climáticos extremos – como incêndios e inundações devastadoras –, perda de biodiversidade e elevação do nível do mar, que colocam em risco vidas humanas, ecossistemas e economias inteiras.

“Estamos a jogar à roleta russa com o nosso planeta”. Foi assim que António Guterres descreveu a corrida contra o tempo para limitar o aumento das temperaturas globais, num discurso sobre a ação climática no Museu Americano de História Natural. De facto, o tempo não parece estar do nosso lado. O ano de 2024 foi o mais quente de que há registo e o primeiro em que as temperaturas médias globais deverão ultrapassar o objetivo do Acordo de Paris de 1,5 graus Celsius acima do período pré-industrial.

 Ainda assim, caso este limiar seja ultrapassado, não significa que haja uma violação do Acordo de Paris. Para isso, o limite teria de ser de ser ultrapassado de forma persistente, durante um período de 20 a 30 anos.

Mas mesmo nos níveis atuais de aquecimento global, já há impactos climáticos devastadores, como ondas de calor extremas, chuvas intensas e secas; reduções nas camadas de gelo; aceleração na subida do nível do mar e o aquecimento do oceano.

“Continuamos, coletivamente, a poluir alegremente e a não conseguir pôr em prática os compromissos que assumidos na sequência Acordo de Paris. Isto não é um problema para um futuro longínquo, é um problema de hoje. Quanto mais tempo demorarmos a levar o assunto a sério, piores vão ser as consequências”, alerta o engenheiro ambiental João Joanaz de Melo.

Em 2024, o aumento das temperaturas foi parcialmente justificado pelo fenómeno climático “El Niño”, que causa o aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico equatorial central e oriental.

Entre os três anos mais quentes

Em 2025, surge o fenómeno oposto – “La Niña” – que deverá arrefecer ligeiramente as temperaturas globais. Ainda assim, as consequências não serão tão positivas. As previsões para este ano apontam para que a temperatura média global seja a terceira mais elevada de que há registo, de acordo com o Met Office do Reino Unido, o Centro Líder da Organização Meteorológica Mundial (OMM) para Previsão Climática Anual a Decenal.

A temperatura média global para 2025 está prevista entre 1,29°C e 1,53°C (com uma estimativa central de 1,41°C) acima da média do período pré-industrial (1850-1900). Caso as previsões se concretizem, isso significa que 2024 é o décimo segundo ano consecutivo em que as temperaturas atingem pelo menos 1,0°C acima dos níveis pré-industriais e o terceiro ano consecutivo em que as temperaturas excedem 1,3°C.

“Andamos a bater recordes de temperatura global todos anos. Se continuarmos a fazer a mesma coisa, os resultados vão os mesmos”, critica o também professor associado na Universidade Nova de Lisboa.

As temperaturas elevadas agravam problemas como incêndios florestais, que já devastaram milhões de hectares em países como Canadá e Grécia, e também Portugal.

De acordo com a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, 2024 foi um dos piores anos da última década em termos de áreas ardida. Recorde-se do incêndio que deflagrou a 14 de agosto na Madeira, em que arderam mais de cinco mil hectares ou a semana negra de 15 a 21 de setembro, em que 128 incêndios provocaram nove vítimas mortais e a destruição de milhares de hectares de povoamentos florestais maioritariamente de eucalipto, no distrito de Aveiro, e pinhais, em Viseu.

Sem políticas urgentes e eficazes de gestão florestal, tragédias semelhantes poderão vir a acontecer em 2025. “É inevitável. Temos um problema estrutural, uma vulnerabilidade muito alta, e andamos fazer paliativos e a pôr pensos rápidos na hemorragia”, critica Joanaz de Melo. “Enquanto essa elevada vulnerabilidade existir, vamos continuar a ter incêndios”.

Num relatório publicado na semana passada, a Quercus apela à “ação concreta e/ou reforço de medidas”, esperando que seja publicado o novo Regulamento Faixas de Gestão de Combustível, importante para a regulamentação do Sistema de Gestão Integrada dos Fogos Rurais (SGIFR), e reprogramado o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC 2023-2027).

Seca e escassez de água

Em diversas regiões do mundo, a escassez de água tornou-se uma realidade cada vez mais grave, que se deverá continuar a sentir em 2025, com o aumento da temperatura global e, por consequência, dos períodos de seca.

A combinação de chuvas irregulares e temperaturas elevadas deverá agravar a seca em países como o Brasil, a Austrália e partes da África Subsaariana. Essas condições dificultam a produção agrícola, elevam os preços dos alimentos e ameaçam a segurança alimentar de milhões de pessoas. Além disso, reservatórios secos e rios em níveis críticos comprometem o fornecimento de água potável para comunidades e indústrias.

Mais de 75% das terras do mundo ficaram mais secas nas últimas três décadas, alertou a Organização das Nações Unidas num relatório publicado em dezembro, que revela uma crise que poderá afetar até cinco mil milhões de pessoas até 2100.

Entre 1990 e 2020, 4,3 milhões de quilómetros quadrados de zonas húmidas foram transformados em terras secas, uma área maior do que a Índia, indica o documento, divulgado na COP16.

Só em 2023, mais de 50% das bacias hidrográficas do planeta registaram redução no volume de água, tornando-o o ano mais seco para os rios do planeta em três décadas, aponta o relatório anual da Organização Meteorológica Mundial (OMM).

Em Portugal, “desde praticamente 2017, com abrandamentos nos anos de 2020 e 2021, o país tem vivido em grande parte do seu território cenário de seca durante quase todo o ano, como foi o caso de 2024, sendo particularmente grave na região do barlavento algarvio”, refere o relatório da Quercus, que destacou a seca como o pior que aconteceu a nível ambiental no ano passado.

A expectativa é a de que o inverno e os primeiros meses de 2025 garantam precipitação suficiente para preparar o país para o verão, já que na primeira quinzena de dezembro, o volume armazenado de água esteve aquém das médias para este mês, com exceção de algumas bacias hidrográfica, revela o Boletim Semanal de Albufeiras, publicado pelo Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH).

Inundações e chuvas intensas

Enquanto algumas regiões sofrem com a falta de água, outras enfrentam chuvas excessivas e inundações destrutivas. É o outro lado da moeda de um clima cada vez mais instável.

O exemplo mais recente foram as cheias de outubro, em Espanha, as mais mortíferas num único país europeu desde 1967. O cenário catastrófico vitimou mais de 200 pessoas e deixou dezenas de desaparecidos em Valência. Além disso, a acumulação de lixo e lama causadas pelos deslizamentos de terra e resíduos trazidos pelas cheias também foi apontado como um problema de saúde pública na região, como consequência das cheias.

Em 2025, tempestades severas deverão continuar a causar deslizamentos de terra, destruição de infraestruturas e deslocamento em massa de populações, principalmente em países como Paquistão e Indonésia.

Mas nada garante que o mesmo não possa acontecer em território nacional, dada a imprevisibilidade destes fenómenos. A acontecer, as consequências seriam devastadoras, já que existem pelo menos 26.500 edifícios construídos em zonas suscetíveis a inundações, normalmente associados a leitos de rios, em Portugal Continental. Os dados são do mais recente Relatório do Estado do Ordenamento do Território 2024 (REOT), coordenado pela Direcção-Geral do Território, que alerta para a urgência de uma política eficaz de ordenamento do território.

Preservação dos Glaciares

O derretimento acelerado das calotas polares e glaciares continua a elevar os níveis dos oceanos. Pequenos estados insulares, como Tuvalu e Maldivas, estão em risco iminente de desaparecer. Enquanto isso, grandes cidades costeiras, como Miami e Xangai, sofrem inundações periódicas e infiltrações de água salgada em reservatórios subterrâneos.

Em 2023, um relatório da Organização das Nações Unidas alertava uma subida alarmante do nível médio do mar. Entre 2013 e 2022, registava-se uma subida média por ano de 4,62 milímetros, o que representa o dobro da década anterior. Uma das consequências mais significativas da subida do nível do mar são as inundações e a erosão costeira.

Por ser uma região costeira, Portugal está mais suscetível a esta ameaça. Em 2024, o nível médio do mar (NMM) medido no marégrafo de Cascais atingiu “o maior valor de sempre”, de 23,3 centímetros acima do referencial ‘Cascais1938’ (que correspondente à média do nível do mar entre 1882-1938). Nos últimos 25 anos o marégrafo de Cascais observou uma subida de 9,7 cm, correspondendo a uma taxa média de quatro milímetros por ano, o que significa que em 2025 este valor continuará a subir.

Estima-se que haja 225.000 pessoas residentes nas áreas costeiras vulneráveis à subida do nível médio do mar, em Portugal continental, num cenário probabilístico para 2100, de acordo com o Censos 2011.

Como forma de assinalar a urgência deste problema, a Assembleia Geral da ONU declarou 2025 o Ano Internacional da Preservação dos Glaciares, uma iniciativa proposta pelo Tajiquistão e adotada por unanimidade na 77.ª sessão da Assembleia.

Com o cenário geopolítico global torna-se ainda mais importante recentrar as atenções no problema climático. “As situações de guerra que temos neste momento a nível internacional não ajudam. A atenção dos atores políticos está, prioritariamente, desviada para a forma de lidar com a guerra em cada pais e, portanto, esse esforço não está a ser investido naquilo que é o nosso futuro global”, alerta Joanaz de Melo.

Neste contexto, cimeiras como a 30.ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), que decorrerá entre 10 e 21 de novembro de 2025, em em Belém, no Pará (Brasil), são uma oportunidade para procurar soluções e estabelecer novos compromissos para o combate ao aquecimento global.