O início de um novo ano é sempre um momento de resoluções, entre balanços e expetativas individuais, comunitárias, nacionais e globais. Esperamos e, em demasiados casos, desesperamos que as resoluções de início de ano sejam pouco mais que o fogo fátuo dos fogos de artifícios que acompanham a época em muitas geografias. Vislumbram, mas são demasiado efémeros. Fruto da configuração católica e da formatação educativa, também do lastro democrático do exercício político, do modelo de organização social e das dinâmicas prevalecentes, somos sobretudo gente de estar à espera. À espera do governo ou do presidente da Câmara. À espera de Bruxelas. À espera da NATO. À espera da América, da China ou de outras relevâncias. Na escola, ensinaram-nos sobretudo a reproduzir e a debitar, sem questionar o suficiente, sem incentivar a procura de respostas, sem gerar os filtros de pensamento próprio que nos habilitassem a não ficar à espera, a construir caminhos e respostas, se necessário com tentativa-erro, e a ter quadros mentais que nos blindassem minimamente face aos riscos existentes e aos emergentes. Esta baixa configuração cívica e de ambição, como o revelam as iliteracias de estudos recentes, é pasto para o conformismo, a errada perceção dos equilíbrios entre direitos e deveres, a gratidão perante as notícias positivas, mas também para as disfunções, a desinformação e os populismos. Quem não questiona, aceita, conforma-se, fica à espera.
Sem sentido de perenidade, entraremos em 2025, muito à espera, sobretudo por falta de caminhos próprios de defesa dos nossos interesses como comunidade.
Entramos à espera de que o governo responda às necessidades essenciais, acumuladas e emergentes, com equilíbrio, sustentação e noção de que não dispondo de maioria parlamentar não se pode comportar como um galifão do poder que não olha a meios para tentar atingir determinados fins. O vale tudo nunca foi solução.
Entramos à espera de que Trump não faça tantos estragos como os expectáveis, pela verborreia proferida, pelos protagonistas da envolvente presidencial e pelos sinais dados, colocando a Europa desprotegida e sem o trabalho de casa feito, num momento em que a orientação é a de enxotar outras potências por riscos que radicam mais no preconceito do que em impactos negativos imediatos nas nossas vidas cada vez mais digitais e expostas a novas ameaças de intrusão e escrutínio abusivo.
Entramos à espera de que saiam soluções para os problemas estruturais do país, que precisam que alguém não espere, não se fique preso aos particulares, mas tenha visão, sentido estratégico do bem comum e disponibilidade para o compromisso que faça perdurar a construção das respostas. Entramos à espera que o governo faça mais do que diz para resolver os problemas do SNS, em vez da reposição de stocks de cargos públicos, à boleia da inexistência clara da definição sobre o que são cargos de confiança política, que entrariam e sairiam ao ritmo de cada governo, sem indemnizações. Aliás, a última vez que um governo mexeu nas estruturas vitais de serviços públicos em véspera de risco acrescido foi em 2017, na proteção civil e não correu bem. Não resolver os problemas e desestabilizar o que funciona, dá sempre asneira. Pode ser o caso das Unidades Locais de Saúde Familiares com direções removidas de supetão, apesar dos resultados, antes dos picos de pressão do inverno.
Em 2025, será mais uma oportunidade para os ajustes que se impõem, mas tardam, colocando em risco o normal funcionamento das instituições, do estado de direito e da democracia.
Viver em sociedade implica a existência de regras, direitos e deveres, individuais e comunitários que são parte do contrato social, devendo ser observado por todos sem exceção num quadro democrático. Na ausência de autoridade e de filtro cívico para interiorizar as regras, agir em conformidade e ter a capacidade de gerar um pensamento estruturado, viveríamos em modo de selva, não por um qualquer contágio alienígena, mas pela natureza dos autóctones. Que 2025 nos traga maior consciência cívica, capacidade de escrutínio e exigência política.
Um dos maiores riscos da democracia é a falta de respostas para as pessoas e para os territórios em contextos em que não resulta claro o sentido, a justiça e o perfil das opções políticas, a par das disfunções do modelo de organização social, económica e judicial. Há um problema de indiferença perante os sinais de risco. Há um desafio de ajuste da capacidade de resposta às necessidades, no tempo certo, que acelerou significativamente ao longo dos anos, em especial com o advento do mundo digital. Há um problema de relevantes intromissões sem escrutínio democrático eficaz, das ofensivas de cibersegurança de estados à expressão dos humores de intrusão de Elon Musk em processos democráticos, passando por novas formas de desinformação, manipulação de massas e entorses de mecanismos democráticos. A democracia está debaixo de fogo e é preciso defendê-la, desde logo, agilizando os seus mecanismos de resposta às pessoas.
São muitas as nuvens de incerteza no horizonte, mas há, como sempre, resoluções que enunciadas no princípio de cada ano, podem começar a fazer caminho a partir da ambição, da resiliência e da determinação de cada um em linha com outros, em função das disponibilidades. Estar à espera nunca foi grande solução, porque não há espaços vazios e há sempre quem não hesite em socorrer-se de todos os meios para atingir determinados fins, mesmo pela inação.
A todas e a todos, um Bom Ano de 2025, que a nós 2024 não deixa nenhuma saudade.
NOTAS FINAIS
DA CEDÊNCIA INDECOROSA DE MONTENEGRO A ROSALINO. O exemplo vem de cima. Bem pode o governo invocar poupanças com a fusão das secretarias gerais dos ministérios que fazer uma lei à medida para pagar milhares ao Ronaldo da Casa em Ordem, que deve ser o perfil de Hélder Rosalino, será sempre indecoroso face às dificuldades generalizadas de muitos portugueses.
PREPOTÊNCIA DO DINHEIRO DE MUSK. Escrevo o que penso, não para agradar. Os suportes digitais são como os chapéus e há muitos. Indignado com as sucessivas expressões de unção monetária arrogante de Elon Musk deixarei a partir de hoje o Twitter, agora travestido de Xis. Aufwiedersehen, Herr Musk!