Só ontem foram conhecidos os resultados oficiais das eleições de 9 de outubro, que elegeram o novo Presidente da República, o Parlamento e as assembleias e governadores provinciais. Segundo os números divulgados pelo Conselho Constitucional de Moçambique, o candidato da Frelimo, Daniel Chapo, venceu com 65,17% dos votos, enquanto o candidato Venâncio Mondlane, apoiado pelo Podemos, ficou em segundo lugar com apenas 24,19%. A Renamo não foi além dos 6,62% e o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) encabeçado por Lutero Simango obteve apenas 4,02% dos votos. “Um novo capítulo da nossa história vai começar e nós vamos escrever juntos”, afirmou o novo chefe de Estado na rede social Facebook. “Somos uma nação forte e resiliente, um povo escolhido e abençoado. Por isso, vamos, juntos e em harmonia, vencer as atuais adversidades, e introduzir um novo capítulo na nossa história, construindo a Pérola do Índico que tanto sonhamos”, escreveu Chapo. O novo Presidente da República de Moçambique é jurista de profissão e vai suceder no cargo a Filipe Nyusi, que cumpriu dois mandatos na presidência. Desde 2016, era governador da província de Inhambane.
Recorde-se que os resultados anunciados a 24 de outubro pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) já tinham dado a vitória a Daniel Chapo com 70,67% dos votos, com Venâncio Mondlane em segundo lugar com 20,3%, só que esses resultados tiveram de ser validados pelo Conselho Constitucional, o que aconteceu ontem. Em termos de votantes, o candidato da Frelimo perdeu mais de meio milhão de votos e cinco pontos percentuais em relação ao resultado anunciado anteriormente pela CNE, mesmo assim é uma vitória folgada. O Conselho Constitucional confirmou também a vitória da Frelimo na eleição para a Assembleia da República, mas também aqui se verificou uma votação inferior do partido do Governo. Com a recontagem dos votos, a Frelimo continua a ter maioria absoluta e a poder governar a seu belo prazer com 195 lugares num parlamento de 250 deputados.
Lúcia Ribeiro, presidente do Conselho Constitucional, admitiu ter havido irregularidades no processo, mas garantiu que não influenciaram o resultado. “O Conselho Constitucional formou a sua firme convicção de que as irregularidades verificadas no decurso do processo eleitoral não influenciaram substancialmente os resultados das eleições gerais, presidenciais e legislativas, e das assembleias provinciais realizadas em todo o território nacional e na diáspora”, justificou. Desse modo, foi rejeitada a contagem que o Podemos tinha realizado, onde Mondlane ganhou com mais de metade dos votos. Recorde-se que o candidato apoiado pelo Podemos afirmou que a contagem foi manipulada a favor da Frelimo e que uma contagem paralela mostra que ganhou com 53% contra 36% de Chapo. Contudo, Mondlane nunca apresentou dados considerados credíveis que confirmassem essa vitória, e apenas o partido que o apoiou confirmou essa tese. Esses dados tinham por base atas de 59,6% dos eleitores, o que foi considerado pelos juízes do Conselho Constitucional um resultado “largamente empolado e sem correspondência com os dados oficiais”, sublinhou a juíza presidente.
Mais manifestações Recorde-se que o anúncio de vitória do partido que governa Moçambique desde a independência em 1975 provocou uma forte contestação da oposição, nomeadamente do Podemos e da Renamo, que alegam fraude eleitoral e exigem revisão dos resultados. Seguiram-se dois meses e meio de intensa contestação em todo o país. Em resposta às manifestações, a polícia usou balas reais e gás lacrimogéneo contra os manifestantes de que, segundo a ONG Plataforma Eleitoral Decide, resultaram pelo menos 130 pessoas mortas e mais de 2.000 feridas. Há ainda a registar cinco desaparecidos e 3.636 detidos.
Os protestos paralisaram as principais cidades, perturbaram a indústria e condicionaram as operações na fronteira com a África do Sul, que perdeu diariamente alguns milhões de dólares devido à paragem forçada de um dos principais corredores económicos que liga os dois países.
No dia ontem, a capital moçambicana, Maputo, e a cidade vizinha da Matola estavam quase desertas, com a maioria do comércio encerrado, as principais estradas bloqueadas e praticamente sem transportes públicos, muitos moçambicanos receavam as reações dos apoiantes de Venâncio Mondlane à divulgação dos resultados. Com o anúncio da vitória de Daniel Chapo e da Frelimo, o candidato derrotado Venâncio Mondlane perdeu a possibilidade de chegar à presidência de Moçambique e não tem nada a perder. Afirmou que pode haver uma nova fase de protestos, bem mais abrangente, e ameaçou convocar “uma revolta popular” caso o Conselho Constitucional aprovasse os resultados iniciais, como veio a acontecer. Mondlane afirmou que haverá “caos” e uma “nova revolta popular de uma escala nunca vista” com bloqueios de estradas e manifestações nas principais cidades.
Resta saber o que irá fazer a polícia e os militares perante nova onda de protestos até à próxima sexta-feira. Nos últimos dias assistiu-se a um aliviar da violência policial, mas se a dinâmica das manifestações for maior do que tem acontecido até agora é muito provável que seja decretado o Estado de Emergência no país.