A Câmara Municipal de Lisboa está a trabalhar num conjunto de soluções de estacionamento. A informação foi avançada pelo vice-presidente da autarquia, Filipe Anacoreta Correia, que explica que uma das medidas passa por aumentar em 400 o número de lugares para residentes nos parques da EMEL e, ao mesmo tempo, avançar com parcerias com supermercados para que disponibilizem os seus parques de estacionamento durante o período noturno.
«A ideia é potenciar a capacidade de parques de estacionamento que existem na cidade mas que por razões da atividade económica dos seus proprietários não são potenciados, sobretudo no período noturno. São empresas, ou centros comerciais ou supermercados que têm parques para alimentar a sua atividade económica, mas à noite ficam vazios e temos estado num esforço muito grande junto de alguns operadores para tentar permitir o seu acesso», revela Anacoreta.
O vice-presidente da Câmara diz que para breve irá avançar um projeto-piloto com um supermercado numa zona central da cidade, não querendo adiantar qual a insígnia. Contactada pelo nosso jornal, a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) disse apenas que «não fará comentários sobre o tema» e dentro das marcas contactadas pelo Nascer do SOL, apenas a Sonae respondeu que «nesta fase é ainda muito prematuro partilhar qualquer tipo de informação sobre este tema».
Posição diferente tem a Associação Portuguesa de Centros Comerciais (APCC), ao revelar que «está totalmente disponível para ajudar a encontrar uma solução e já deu esse passo, através do protocolo de colaboração que celebrou com a EMEL, em julho do ano passado, com vista a aumentar-se a oferta de estacionamento noturno para residentes em Lisboa».
Ao nosso jornal, Carla Pinto, diretora executiva da associação, esclarece que «no âmbito desse protocolo já informou e divulgou junto dos seus associados que possuem centros comerciais com estacionamento em Lisboa, a possibilidade de disponibilizarem esses espaços à EMEL durante o período noturno, promovendo uma solução eficaz para a falta de estacionamento na cidade». Já em relação à adesão ao programa e às condições da cedência esclarece que serão depois tratadas e negociadas diretamente entre a EMEL e com os centros comerciais interessados, não estando a APCC envolvida nesta fase do processo.
É certo que, de acordo com o vice-presidente da Câmara, a ideia deste projeto não é dar lugar a uma atividade lucrativa, mas a autarquia está disponível para fazer os investimentos que forem necessários. «Se for preciso reforçar a segurança, suportar despesas com cancelas ou com tecnologia estamos disponíveis para esse investimento. O nosso objetivo é termos alternativas para o estacionamento, até porque hoje o espaço público é muito mais reivindicado e como é mais reivindicado tornou-se mais escasso».
Ainda assim, reconhece que tem sido um trabalho exigente em relação às conversações com os operadores, mas também admite que pode vir a apaziguar a relação entre moradores e supermercados. «Reconhecem que é uma boa ideia e os supermercados têm uma necessidade muito grande de terem um convívio mais harmónico com os seus vizinhos porque há sempre problemas ligados ao lixo, ao barulho, etc. Este projeto permitia, de alguma forma, reconciliar ou, pelo menos, aproximar os residentes destas atividades económicas. E nós, na Câmara, fazemos o nosso papel de encorajar soluções que sejam boas para a população».
Raio-x da oferta
Os vereadores do PCP na Câmara Municipal de Lisboa apresentaram uma proposta que visa a «avaliação dos direitos de superfície em subsolo correspondentes a concessões a privados de parques de estacionamento subterrâneos». Criticando a pressão que existe à superfície no estacionamento em Lisboa, lembram que é possível aproveitar os estacionamentos de solo, sejam eles públicos ou privados.
Anacoreta Correia já afirmou que «se tivermos a ambição de libertar o espaço público de ter cada vez mais carros não podemos interromper o processo de criar alternativas para as pessoas. Todos temos a experiência que, em muitas zonas da cidade, há falta de lugares de estacionamento para aquilo que são as necessidades das pessoas», garantindo que essa avaliação deve e está a ser feita. «Acompanhamos o PCP nessa proposta, mas temos a noção que a ideia de que não serão necessários mais parques de estacionamento não é realista».
Ao nosso jornal, o vereador João Ferreira, do PCP, explica que a proposta dos comunistas «tem a ver com aqueles estacionamentos em subsolo em parques de estacionamento que a Câmara concessionou», detalhando que são operados por entidades privadas e que, segundo dados atuais, têm cerca de mil lugares permanentemente vazios. «Os parques estão construídos, aquilo era solo principal, a Câmara deu aquilo, concessionou aquilo a empresas para nalguns casos fazerem a construção, noutros a exploração, noutros as duas coisas. Os parques estão desaproveitados. Há não muito tempo havia, em média, mil lugares permanentemente vazios. Não são aproveitados na sua totalidade. E não faz sentido quando, à superfície, temos uma pressão tão grande sobre os estacionamentos. O que faz sentido é aproveitarmos», explica ao nosso jornal.
João Ferreira defende que o principal motivo da não utilização desse espaço será o facto de «as políticas tarifárias não serem atrativas para que as pessoas» lá estacionem. «A necessidade existe, a procura existe, mas por alguma razão as pessoas preferem meter à superfície. Muito provavelmente terá a ver com as condições tarifárias», insiste. Assim, a proposta do PCP é que a autarquia de Lisboa faça uma avaliação das condições que teria o resgate dessas concessões. A ideia é que a Câmara de Carlos Moedas fale com os concessionários, tentando perceber como é que podem ajudar as pessoas e, de preferência, reaver esses espaços. «Tendo na sua posse esses parques de estacionamento a câmara poderia adaptar as políticas tarifárias melhor às necessidades das pessoas que procuram os estacionamentos: dos moradores, por exemplo. Poderia criar tarifas mais favoráveis para o estacionamento de longa duração, por exemplo. Do nosso ponto de vista até podiam ser tarifas muito favoráveis para incentivar as pessoas a deixarem o carro estacionado e a andarem de outras formas», incentivando, por exemplo, as pessoas a andarem de transportes públicos.
De acordo com o vereador comunista é necessário fazer um raio-x numa ótica de utilizar melhor. «Utilizar plenamente a capacidade instalada. É solo municipal, o município gastou dinheiro. Se se gastaram recursos naquilo, vamos aproveitar aquilo de melhor forma. O que propomos, o ideal, era que fosse a própria Câmara a fazê-lo. E por isso propomos que ela avalie as condições de resgate das concessões. Caberia à Câmara resgatar concessões que, nalguns casos, ainda têm dezenas de anos de validade para a frente, para depois ela própria estabelecer as suas políticas tarifárias» ou até mesmo ver com os próprios concessionários em que medida é que poderiam adaptar as políticas tarifárias «de forma a acolher mais estacionamento».
Sobre a possibilidade de supermercados ou centros comerciais ajudarem a colmatar esta falta de estacionamento, João Ferreira diz que essa ajuda também seria importante, ainda que não faça parte da sua proposta. Do seu ponto de vista, era importante que essa ideia avançasse não só com entidades privadas mas também com públicas. «Têm uma utilização essencialmente diurna, laboral, desses espaços e podiam à noite abrir a residentes. O que defendemos é que isto devia ter um preocupação nas políticas tarifárias: incentivar o uso do transporte público em detrimento do carro. Isso era uma preocupação. Jogarmos com estas políticas tarifárias de forma a incentivar todas aquelas pessoas que optem, no seu dia a dia, por trocar carro por transporte público ou por outros meios de transporte, como o transporte coletivo. Que não seja mais um incentivo ao uso do carro que o contrário».
Questionado sobre possível contrapartidas, o vereador do PCP diz que é preciso ver caso a caso mas que «o caso das entidades públicas até nos parece relativamente fácil que houvesse uma cedência até sem haver aqui uma intenção de fazer negócio. Claro que em alguns casos isso pode exigir por exemplo uma vigilância extra. E nesses casos a Câmara poderia suportar isso. Mas, atenção, antes de avançar para essas soluções é útil olhar para aquilo que a própria Câmara tem ou que concessionou a outros». E reforça: «O sentido da nossa proposta é isso: aquilo que é da responsabilidade mais direta da câmara, seja por que é dela o caso dos parques de estacionamento da EMEL, seja porque não é dela mas foi ela que concessionou a outros – na prática é dela – que nesses casos a câmara comesse a olhar para isso e ver como pode acabar com esta situação que é haver imensos lugares desaproveitados».
Falta de alternativas
Recentemente, o Observatório do Automóvel Club de Portugal propôs a criação de uma rede integrada de nove parques de estacionamento dissuasores no limite exterior de Lisboa com uma capacidade de 16 mil lugares de estacionamento, lembrando que, na cidade, existem 200 mil lugares para 745 mil carros. Feitas as contas, dá uma média de quase quatro carros para um lugar. E explica que «estes parques, realmente dissuasores por se situarem fora da cidade, assentam no aproveitamento da oferta de estacionamento ao longo de todo o eixo viário da Circular Regional Interior de Lisboa (CRIL) entre Algés e o Parque das Nações, que tem sido desperdiçada durante o período de maior procura diurna».
De acordo com o ACP, para cada um dos parques «deve ser implementado e promovido um conjunto de ligações que incentivem o uso dos transportes públicos com destaque para o metropolitano, comboio e Carris» e essa ligações «devem assegurar tempos, condições de conforto e segurança aceitáveis», garantindo que, atualmente, essa situação não se verifica. No entanto, reconhece que para que esta proposta seja eficaz, é preciso ainda «avaliar a implementação de corredores dedicados ao transporte público e veículos de partilha em todos os eixos adjacentes a esta rede integrada de parques de estacionamento».
Segundo o Automóvel Club de Portugal, esta nova rede de estacionamento vai proporcionar novos itinerários, «criando alternativas de acesso à cidade, descongestionando as zonas centrais da cidade, o que permite devolver espaços para os peões e reduzir as emissões de partículas nocivas».
Ao Nascer do SOL, Carlos Barbosa não hesita: «Os estacionamentos são péssimos e não há alternativa nem para entrar nem para andar em Lisboa. É evidente que não havendo estacionamento, as pessoas não têm outra maneira de vir, sem esquecer que o que há é caríssimo». De acordo com o responsável, uma das soluções passaria por estacionamentos em altura. «Tem de se construir mais estacionamento em altura», referindo que «seria possível arranjar lugares de estacionamento para três ou quatro mil carros num instante», mas mas também admite que poderão avançar parcerias com privados para resolver o problema a curto prazo, nomeadamente com supermercados e estádios de futebol. «Há tantos lugares nos estádios de futebol disponíveis durante a semana. Há tanta coisa que se pode fazer, mas o problema é que muitas vezes os estádios dizem que não querem, os supermercados também dizem o mesmo».