As Jornadas de Santa Bárbara, que evocam a padroeira dos mineiros, relâmpagos e tempestades (Santa Bárbara), são há vinte anos organizadas exclusivamente por esstudantes do Núcleo de Minas do Instituto Superior Técnico. Na sua décima nona edição as Jornadas, realizadas no passado dia 5 de dezembro , foram novamente um ponto de encontro entre academia e indústria e mais uma oportunidade para assinalar o papel fulcral dos recursos minerais e energéticos no desenvolvimento das sociedades modernas, a sua importância estratégica para uma transição energética mais verde, que se deseja rápida, e como peça fundamental na transição digital em curso. Para além da partilha entre academia e indústria, as edições mais recentes das Jornadas têm também servido para a entrega de Bolsas de Mérito, financiadas na sua totalidade por empresas nacionais e internacionais do sector, a estudantes que iniciam o seu percurso académico na Licenciatura em Engenharia de Minas e Recursos Energéticos. Estas bolsas são uma indicação da importância estratégica desta licenciatura, e dos alunos que a frequentam, para o desenvolvimento económico do país.
As matérias-primas, e em particular os recursos minerais, sempre foram centrais na matriz económica de qualquer país, mas são hoje ainda mais relevantes devido ao seu papel no desenvolvimento de sociedades energeticamente mais sustentáveis, como parte integrante dos componentes tecnológicos dos equipamentos que nos rodeiam, e particularmente estratégicas para setores críticos como a Defesa e o Espaço. Os recursos minerais e energéticos estão, e sempre estiveram, na origem de muitas tensões geopolíticas e não é por isso de estranhar o esforço liderado pela presidente da Comissão Europeia para a implementação do Regulamento Europeu das Matérias-primas Críticas, em vigor desde abril de 2024, nem o destaque dado ao setor da energia geotérmica pela presidência Húngara da União. Esses dois aspetos foram mencionados na declaração de abertura das XIX Jornadas de Santa Bárbara pela secretária de Estado da Energia.
O caso da energia geotérmica, e o seu recente ressurgimento em força como fonte de energia renovável, constante ao longo do tempo e com zero emissões de dióxido de carbono, é paradigmático. Se inicialmente a utilização do calor natural do planeta para a geração de energia estava inicialmente circunscrito a zonas muito bem delimitadas no globo, onde o gradiente geotérmico é anormalmente alto, a realidade dos sistemas geotérmicos estimulados é bastante diferente. Através do recurso a técnicas de perfuração avançadas, desenvolvidas pela indústria petrolífera ao longo das últimas décadas, é hoje possível através dos sistemas geotérmicos estimulados criar redes de produção de energia de pequena escala genericamente em qualquer localização do planeta. Este novo paradigma de produção de energia, seguro e de relativamente baixo custo de investimento, tem a capacidade de alimentar continuamente pequenas comunidades e contribuir para a resolução de um dos grandes desafios associado ao atual momento de desenvolvimento tecnológico: o processamento de grandes quantidades de dados e o treino de modelos de inteligência artificial de grande escala. Os centros de dados que armazenam, processam e modelam grandes quantidades de dados são ávidos consumidores de energia, com consumos energéticos da mesma ordem de grandeza de cidades de dimensão média, e de recursos minerais que fazem parte integrante dos chips que fazem este processamento. A possibilidade de obter energia renovável de forma contínua e previsível, ao contrário de outras fontes de energia intermitentes como são exemplo a energia eólica ou solar, e com zero emissões de dióxido de carbono abre a porta da sustentabilidade energética e ambiental a este tipo de infraestrutura tecnológica. A energia geotérmica estimulada é real e foi testada num caso piloto durante este ano pela empresa Google num dos seus centros de dados no estado do Nevada dos Estados Unidos da América.
Os recursos minerais e energéticos, e a sua utilização de forma combinada, são estratégicos para enfrentar os atuais desafios societais e uma das razões porque desejo, e prevejo, que Santa Bárbara continuará a ser celebrada nos próximos vinte anos no Técnico.
Professor do Instituto Superior Técnico,
Departamento de Engenharia de Recursos Minerais e Energéticos