Ali onde termina a jurisdição oficial, na fronteira que abre para lá do tempo mau que nos servem, há quem diga que se alcança uma época suspensa, intersticial às demais, um jardim cujos trilhos de terra batida estão densamente rodeados de arbustos, árvores, plantas tropicais, juncos e papiros… Ali se reúne gente que traz notícias de toda a parte, delírios, efabulações, matérias instáveis. No centro do jardim há uma espécie de zona resguardada, com um telheiro protegendo o silêncio de uns bancos corridos para se estar umas horas a ler. Não há qualquer caixa do correio, mas chegam encomendas e caixas a toda a hora, que o carteiro atira ali para o monte, fugindo logo de seguida. Este lugar fica na fronteira do entardecer eterno, e, a cada geração, vai tendo alguns patrocinadores. Ao longo de décadas, Assírio Bacelar foi um deles.
Em 1972, ao lado de José Antunes Ribeiro, João Carlos Alvim, Mário Reis e Carlos Caeiro, cofundou a editora de intervenção político-cultural Assírio & Alvim, inspirada na ação até ali desenvolvida na livraria e editora Ulmeiro. Vários dos autores até então publicados na sua icónica coleção Cadernos Peninsulares, passaram da Ulmeiro para a Assírio & Alvim. Bacelar ocupava as funções de diretor comercial, tratando da logística da editora até 1976, de onde viria a sair em rutura com Homero da Silva Cardoso, então diretor da empresa. Mais tarde, fundou a Editora Vega, juntamente com João Carlos Alvim e Vítor Paiva, onde retomou o programa centrado na literatura e no ensaio. Entre os autores portugueses, cabe reconhecer-lhe o papel que teve como o primeiro editor de António Lobo Antunes, tendo os seus quatro romances iniciais, que saíram entre 1979 e 1981, e incidiram sobre as vivências da Guerra Colonial sido primeiro publicados com o selo da Vega. Até 1982, Memória de elefante e Os cus de Judas contaram nove edições. Outros autores que integraram o catálogo são Mário de Carvalho, Domingos Lobo, Hugo Santos e Miguel Barbosa. Além da atividade editorial, que Bacelar exerceu com empenho, mas não sei uma boa dose de controvérsias e conflitos, sobretudo por alegados calotes aos autores que publicou, distinguiu-se ainda como autor de literatura infantojuvenil e publicou ainda um romance autobiográfico, Memórias de um brinquedo que se partiu.