Mariana Mortágua, deputada e coordenadora do Bloco de Esquerda, alertou hoje, durante o 13.º Encontro Nacional do Trabalho do partido, realizado no Centro de Artes e Ofícios de Ovar, para o crescente fenómeno da “uberização” do trabalho, mediado por plataformas digitais como a Glovo e a Uber.
A deputada criticou a transformação das relações de trabalho, afirmando que “esta nova forma de trabalho banaliza a transferência de riscos e custos do trabalho do empregador para o trabalhador”, que, segundo ela, “agora tem todos os riscos e todos os custos”. Mariana Mortágua sublinhou que, em situações como doença ou acidente, a responsabilidade recai exclusivamente sobre o trabalhador, que também se torna “o gestor do seu próprio tempo”, uma vez que “o patrão se demitiu da função de organizar o trabalho e de gerir o trabalho”.
A deputada afirmou ainda que essa realidade é frequentemente vendida como uma forma de “autonomia”, mas, na verdade, trata-se de “uma falsa autonomia”. Segundo Mortágua, a falta de regulamentação no que diz respeito ao horário de trabalho, férias e limitações de riscos no trabalho cria uma pressão para que o trabalhador seja forçado a trabalhar longas jornadas, incluindo fins de semana. “Se não há um limite de oito horas de trabalho, se não há um limite ou uma obrigação para dias de férias, se não há uma obrigação que diga que quando há riscos de trabalho tu não podes trabalhar àquelas horas, o que vai acontecer é que essa autonomia se transforma numa pressão para que esse trabalhador trabalhe 12 horas por dia, para que trabalhe ao fim de semana”, explicou.
Além disso, a deputada alertou para o impacto que essas condições podem ter na saúde e no sustento dos trabalhadores, dado que “não está garantido um salário mínimo” e há uma exigência de “disponibilidade permanente”. Mariana Mortágua também criticou a centralização do trabalho através das plataformas digitais, que, segundo ela, controlam a localização e o comportamento dos trabalhadores por meio de algoritmos, criando uma situação em que uma “multidão de trabalhadores competem entre si pelo preço”.
A deputada argumentou que a “uberização” do trabalho não é uma consequência inevitável da tecnologia, mas sim o reflexo de décadas de mudanças legislativas que enfraqueceram a regulamentação laboral. Na sua visão, o modelo neoliberal transforma os cidadãos em “indivíduos, atomizados, separados” sem uma “sociedade, comunidade, Estado”, criando um cenário onde “não há regra” nem “lei”, e onde a riqueza se concentra num número reduzido de “verdadeiros patrões”, enquanto os trabalhadores se tornam uma “multidão de trabalhadores precários, a quem se chamam empreendedores e patrões”.
Por fim, Mariana Mortágua criticou o “sectarismo na organização laboral e nos sindicatos”, que, segundo ela, dificulta a representação dos trabalhadores das plataformas digitais, que estão sujeitos a “precarização e exploração”. A deputada enfatizou a necessidade de encontrar o que une todos os trabalhadores, “migrantes ou não migrantes”, os que trabalham “em nome individual” ou os que têm um “contrato coletivo de trabalho”, incluindo aqueles que prestam serviços de limpeza.