Dizer a verdade e fazer o discurso da Paz é e sempre será um problema


A cavalo da guerra, assistimos, agora, a exorbitantes opiniões sobre a liberdade de expressão e os direitos cívicos dos portugueses.


  1. Não sei se e quando estas linhas que aqui escrevo forem publicadas o mundo permanece o mesmo.

Como referiu, no Brasil, o nosso primeiro-ministro, fala-se, hoje, mais em guerra e na sua preparação do que em paz e na vontade de a negociar.

Curiosamente, ou talvez não, esta preocupação manifestada pelo primeiro-ministro não tem sido alvo de glosas dos comentadores, quase todos alinhados com o partido da guerra.

E, no entanto, tal afirmação mereceria uma atenção especial, até na medida em que põe o enfoque deste problema maior num plano distinto do desenvolvido por outros governantes de países europeus, que parece não entenderem para onde o clima guerreiro, que ajudam a desenvolver, pode levar o mundo.

A verdade, porém, é que todas as partes envolvidas neste conflito europeu, que decorre em solo ucraniano e russo, apoiado, a ocidente, pelos EUA e, a oriente, por um conjunto de outras grandes e médias potências, não têm já muito espaço de recuo para evitar uma catástrofe mundial: a guerra nuclear.

O facto é que os mísseis americanos começaram a ser disparados contra Rússia e que ninguém sabe qual poderá ser a resposta desta, até porque a sua atual doutrina sobre a utilização de armas nucleares permite o seu uso nestas circunstâncias.  

De repente, parece estarem todos dementes, senis ou cegos.

E, como popularmente se diz, “não há pior cego do que o que não quer ver”.

De repente, parece não poderem os países envolvidos na guerra contar entre os seus governantes com pessoas capazes de, seriamente, avaliar os riscos de destruição total que o mundo está a correr.

De repente, parece que só as teorias apocalípticas, que, há vários anos já, vaticinam uma iminente guerra europeia ou mundial, entusiasmam e influenciam um conjunto alargado de enfraquecidos líderes ocidentais que, por isso, pouco dizem e menos fazem para, como seria mais natural, reencontrarem os caminhos da paz.

Será que querem mesmo caminhar na direção da guerra?

Quero com isto dizer: será que querem mesmo envolver as suas forças militares e expor os seus civis a uma guerra de consequências imprevistas?

E, se o quiserem, já perguntaram aos povos que governam se é esse o caminho que pretendem seguir e porquê?

Pelo que tenho observado na vila onde vivo, o número de cidadãos estrangeiros ricos de países mais diretamente envolvidos no conflito armado, novos e mais velhos, mas todos com idade de prestar serviço militar, cresce todos os dias e com eles, também, o das viaturas de luxo com matrículas estrangeiras, que percorrem as nossas ruas.

Será que, também, mesmo nesses países, há gente que não está entusiasmada em participar na guerra?

Quantos milhões de cidadãos de tais países decidiram não querer combater nesta guerra e, por isso, se refugiaram em outras regiões do mundo?

  1. O problema da guerra, para além das consequências terríveis que sempre traz para vida e bens da grande maioria dos cidadãos europeus – outros, que guerreiam por procuração, estão longe e mais protegidos – não se limita, tão só, à inevitável destruição do nosso mundo.

Mesmo que a guerra não venha a espalhar-se, de imediato, a outras geografias, a cavalo da ideologia belicista, assistimos, agora paralelamente, à expressão pública de exorbitantes opiniões sobre a liberdade e os direitos cívicos dos portugueses.

Temos presenciado, com efeito, declarações de representantes diplomáticos de outros países que, não se contendo e interferindo, assim, voluntaria ou involuntariamente, na nossa soberania, – preconizam soluções políticas para condicionar a nossa liberdade de expressão e de publicação de obras literárias, soluções que não se compaginam com os princípios da nossa Constituição.

Aconselho, a este exato propósito, a leitura, ou visionamento, de uma muito recente e explícita entrevista de uma diplomata estrangeira à CNN Portugal.

As medidas aí alvitradas – com espantosa sinceridade, reconheça-se – só no tempo da ditadura eram, entre nós, habituais e possíveis.

Mas isso eram outros tempos: tempos do nosso “fascismo”.

Não sei, e se calhar, por ora, nem tenho de saber, qual foi a reação do Ministério dos Negócios Estrangeiros português a tal intromissão nos assuntos internos do nosso país, designadamente no que respeita à admoestação sobre a “exagerada” liberdade de publicação de obras literárias por parte das nossas editoras.

Por vezes, nestes casos, a reação a tais atuações abusivas exige, num primeiro passo, uma intervenção discreta, pelo menos mais discreta do que a interferência, confessada, da dita representante estrangeira.

Admito, no entanto, ter curiosidade em saber qual seria, por exemplo, a atitude das autoridades, das editoras e da opinião pública britânicas face a uma tal iniciativa de um embaixador estrangeiro no seu país, mesmo que este fosse o do grande irmão.

Curiosamente, nenhum comentador se referiu – no momento em que escrevo estas linhas – a tal inopinado depoimento e à coerção implícita que nele se refere ter acontecido.

  1. Sei, porém, que se tais opiniões esdrúxulas tivessem sido emitidas por qualquer responsável de outra das potências em guerra, não tenhamos dúvidas de que os telejornais, as primeiras páginas dos jornais e a boa consciência dos comentadores e publicitários do mundo ocidental se teriam indignado com tal abuso e execrado a ideologia opressiva subjacente.

Até por este exemplo, e como já aqui escrevi, no atual conflito, não se contrapõem, realmente, países democráticos a autocracias, com mais ou menos nuances, mais ou menos abusos e limitações, estes diferentes regimes e os seus sucedâneos coexistem nos dois lados.

Por isso, bem-avisado andou o nosso primeiro-ministro, quando, na Cimeira dos 20, rejeitando o canto da sereia guerreira, colocou a ênfase da atitude de Portugal no discurso sobre a paz e nos caminhos para a obter.

Seguindo o conselho sempre avisado do Papa, estaremos, porventura, ante o momento derradeiro para contrapor ao ribombante e selvagem canto guerreiro o som das vozes doridas dos que, já no campo da batalha, ou, ainda fora dele, preferem entoar cânticos de paz.

Dizer a verdade e fazer o discurso da Paz é e sempre será um problema


A cavalo da guerra, assistimos, agora, a exorbitantes opiniões sobre a liberdade de expressão e os direitos cívicos dos portugueses.


  1. Não sei se e quando estas linhas que aqui escrevo forem publicadas o mundo permanece o mesmo.

Como referiu, no Brasil, o nosso primeiro-ministro, fala-se, hoje, mais em guerra e na sua preparação do que em paz e na vontade de a negociar.

Curiosamente, ou talvez não, esta preocupação manifestada pelo primeiro-ministro não tem sido alvo de glosas dos comentadores, quase todos alinhados com o partido da guerra.

E, no entanto, tal afirmação mereceria uma atenção especial, até na medida em que põe o enfoque deste problema maior num plano distinto do desenvolvido por outros governantes de países europeus, que parece não entenderem para onde o clima guerreiro, que ajudam a desenvolver, pode levar o mundo.

A verdade, porém, é que todas as partes envolvidas neste conflito europeu, que decorre em solo ucraniano e russo, apoiado, a ocidente, pelos EUA e, a oriente, por um conjunto de outras grandes e médias potências, não têm já muito espaço de recuo para evitar uma catástrofe mundial: a guerra nuclear.

O facto é que os mísseis americanos começaram a ser disparados contra Rússia e que ninguém sabe qual poderá ser a resposta desta, até porque a sua atual doutrina sobre a utilização de armas nucleares permite o seu uso nestas circunstâncias.  

De repente, parece estarem todos dementes, senis ou cegos.

E, como popularmente se diz, “não há pior cego do que o que não quer ver”.

De repente, parece não poderem os países envolvidos na guerra contar entre os seus governantes com pessoas capazes de, seriamente, avaliar os riscos de destruição total que o mundo está a correr.

De repente, parece que só as teorias apocalípticas, que, há vários anos já, vaticinam uma iminente guerra europeia ou mundial, entusiasmam e influenciam um conjunto alargado de enfraquecidos líderes ocidentais que, por isso, pouco dizem e menos fazem para, como seria mais natural, reencontrarem os caminhos da paz.

Será que querem mesmo caminhar na direção da guerra?

Quero com isto dizer: será que querem mesmo envolver as suas forças militares e expor os seus civis a uma guerra de consequências imprevistas?

E, se o quiserem, já perguntaram aos povos que governam se é esse o caminho que pretendem seguir e porquê?

Pelo que tenho observado na vila onde vivo, o número de cidadãos estrangeiros ricos de países mais diretamente envolvidos no conflito armado, novos e mais velhos, mas todos com idade de prestar serviço militar, cresce todos os dias e com eles, também, o das viaturas de luxo com matrículas estrangeiras, que percorrem as nossas ruas.

Será que, também, mesmo nesses países, há gente que não está entusiasmada em participar na guerra?

Quantos milhões de cidadãos de tais países decidiram não querer combater nesta guerra e, por isso, se refugiaram em outras regiões do mundo?

  1. O problema da guerra, para além das consequências terríveis que sempre traz para vida e bens da grande maioria dos cidadãos europeus – outros, que guerreiam por procuração, estão longe e mais protegidos – não se limita, tão só, à inevitável destruição do nosso mundo.

Mesmo que a guerra não venha a espalhar-se, de imediato, a outras geografias, a cavalo da ideologia belicista, assistimos, agora paralelamente, à expressão pública de exorbitantes opiniões sobre a liberdade e os direitos cívicos dos portugueses.

Temos presenciado, com efeito, declarações de representantes diplomáticos de outros países que, não se contendo e interferindo, assim, voluntaria ou involuntariamente, na nossa soberania, – preconizam soluções políticas para condicionar a nossa liberdade de expressão e de publicação de obras literárias, soluções que não se compaginam com os princípios da nossa Constituição.

Aconselho, a este exato propósito, a leitura, ou visionamento, de uma muito recente e explícita entrevista de uma diplomata estrangeira à CNN Portugal.

As medidas aí alvitradas – com espantosa sinceridade, reconheça-se – só no tempo da ditadura eram, entre nós, habituais e possíveis.

Mas isso eram outros tempos: tempos do nosso “fascismo”.

Não sei, e se calhar, por ora, nem tenho de saber, qual foi a reação do Ministério dos Negócios Estrangeiros português a tal intromissão nos assuntos internos do nosso país, designadamente no que respeita à admoestação sobre a “exagerada” liberdade de publicação de obras literárias por parte das nossas editoras.

Por vezes, nestes casos, a reação a tais atuações abusivas exige, num primeiro passo, uma intervenção discreta, pelo menos mais discreta do que a interferência, confessada, da dita representante estrangeira.

Admito, no entanto, ter curiosidade em saber qual seria, por exemplo, a atitude das autoridades, das editoras e da opinião pública britânicas face a uma tal iniciativa de um embaixador estrangeiro no seu país, mesmo que este fosse o do grande irmão.

Curiosamente, nenhum comentador se referiu – no momento em que escrevo estas linhas – a tal inopinado depoimento e à coerção implícita que nele se refere ter acontecido.

  1. Sei, porém, que se tais opiniões esdrúxulas tivessem sido emitidas por qualquer responsável de outra das potências em guerra, não tenhamos dúvidas de que os telejornais, as primeiras páginas dos jornais e a boa consciência dos comentadores e publicitários do mundo ocidental se teriam indignado com tal abuso e execrado a ideologia opressiva subjacente.

Até por este exemplo, e como já aqui escrevi, no atual conflito, não se contrapõem, realmente, países democráticos a autocracias, com mais ou menos nuances, mais ou menos abusos e limitações, estes diferentes regimes e os seus sucedâneos coexistem nos dois lados.

Por isso, bem-avisado andou o nosso primeiro-ministro, quando, na Cimeira dos 20, rejeitando o canto da sereia guerreira, colocou a ênfase da atitude de Portugal no discurso sobre a paz e nos caminhos para a obter.

Seguindo o conselho sempre avisado do Papa, estaremos, porventura, ante o momento derradeiro para contrapor ao ribombante e selvagem canto guerreiro o som das vozes doridas dos que, já no campo da batalha, ou, ainda fora dele, preferem entoar cânticos de paz.