Olivier Wieviorka. ‘A derrota alemã deveu-se à superioridade da economia soviética’

Olivier Wieviorka. ‘A derrota alemã deveu-se à superioridade da economia soviética’


Historiador francês e descendente de judeus polacos, autor de História total da Segunda Guerra Mundial, não nega os crimes cometidos pelos Aliados. Mas ressalva: ‘A violência dos Aliados é de uma natureza diferente da da violência dos estados totalitários’


Espalhada por três continentes – Europa, África e Ásia –, a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) travou-se em terra, no céu, no mar e até debaixo de água. Foi uma época de grandes líderes políticos e militares, mas também de verdadeiros monstros. De picos de heroísmo e de horrores inimagináveis, bastando mencionar os infames campos de concentração e os seus crematórios, os cercos de Leninegrado e Estalinegrado, as bombas atómicas de Hiroxima e Nagasáqui.

Em 1941, o poder nazi e os seus aliados ou fantoches controlavam mais de metade da população europeia – 280 milhões de pessoas, da França à Lituânia, da Noruega aos Balcãs, passando pela Grécia, Holanda, Bélgica, Finlândia e Polónia –, enquanto o Japão se assumia como a potência indiscutível do Oriente. Juntos, pareciam invencíveis.

Mas Olivier Wieviorka defende que nesse terceiro ano da guerra Hitler já tinha perdido o conflito. «Custa-nos a perceber isso, porque pensamos sempre na Alemanha como um país muito poderoso, muito industrial. Mas na verdade tinha uma economia muito fraca».

Especialista na história da Resistência, este historiador francês, descendente de judeus polacos que foram vítimas de antissemitismo e fugiram para França no período entre guerras, traz um importante contributo a um campo de estudos muito dominado pela academia britânica.

«Tenho um profundo respeito pelos meus colegas britânicos, são muito bons a contar a História de uma maneira vívida. Aprendi muito com eles», reconhece. «Mas, como a Grã-Bretanha ganhou a guerra, por vezes há um certo viés, uma espécie de visão patriótica».

A sua História Total da Segunda Guerra Mundial (ed. Crítica) tenta corrigir esse viés apresentando os factos sob uma perspetiva isenta e abrangente. Sem descurar geografias mais periféricas, avalia também planos menos óbvios do conflito – como «o estratégico, o ideológico, o económico, o logístico, o diplomático, o geopolítico, não esquecendo ainda a história social e memorial».

O resultado é uma obra monumental que condensa em cerca de 800 páginas décadas de trabalho e de investigação. Ao Nascer do SOL, num recanto sossegado de um hotel do centro de Lisboa, o autor falou sobre o conflito, as suas nuances e complexidades, das raízes na Guerra de 14-18 à reconstrução da Alemanha e do Japão.

Hitler, Estaline e Churchill participaram os três diretamente na Grande Guerra de 14-18. Este facto mostra que houve uma continuidade entre esta e a Segunda Guerra Mundial? Podemos dizer que a Segunda Guerra Mundial foi uma consequência da Grande Guerra e do Tratado de Versalhes?

Sim, pode-se argumentar que a Segunda Guerra Mundial é um legado da Guerra de 14-18, porque os termos do Tratado de Versalhes foram considerados injustos. Nesse sentido, podemos analisar a Segunda Guerra Mundial como uma consequência da Primeira Guerra. Mas penso que essa ideia, não sendo completamente falsa, também não é rigorosa, porque o nazismo, o bolchevismo, o fascismo e o poder político no Japão eram de uma natureza completamente diferente. A Primeira Guerra Mundial, em certa medida, ainda é uma guerra clássica, por riqueza e territórios. Não existe uma grande discrepância entre a Primeira Guerra Mundial e as Guerras dos Balcãs [1912-13], por exemplo. A Segunda Guerra Mundial é também uma guerra ideológica, uma guerra que envolveu os civis, muito mais do que a Primeira, e em que há também uma nova maneira de combater. Claro que tem algumas raízes na Primeira Guerra Mundial, e deve-se em parte às condições do Tratado de Versalhes. Mas tem também uma originalidade profunda, pelo que tenho muitas reservas relativamente a essa comparação.

É consensual que a guerra começa a 1 de setembro de 1939 com a invasão da Polónia. Sei que tem antepassados polacos. Isso teve algum peso no seu interesse por este período?

Por que escrevi este livro? Penso que há dois elementos. Um elemento pessoal, que é, claro, o facto de a minha família ter sido atingida pela Segunda Guerra Mundial. Pode parecer um pouco estranho, mas a guerra, por um lado, estava ausente, porque os meus pais quase não falavam sobre ela, mas por outro lado estava muito presente, porque De Gaulle, um herói da guerra, ocupou o poder durante a minha juventude. Isso teve o seu papel. Mas penso que a Segunda Guerra Mundial também é muito interessante porque coloca questões que em grande medida são eternas. ‘O que teria eu feito se estivesse lá? Teria colaborado com os alemães? Teria colaborado com os japoneses? Ter-me-ia juntado à Resistência?’. São questões que obrigatoriamente cada um se coloca a si próprio. E que continuam a ser muito importantes hoje. É por isso que me interesso pela Segunda Guerra Mundial. Não é um tema que se esgote numa análise fria, é um conflito incrível que envolve toda a humanidade e coloca questões muito, muito profundas, às quais tentei responder neste livro.

Uma dessas questões diz respeito à responsabilidade coletiva do povo alemão. Acha que os alemães têm de se penitenciar pelos crimes de Hitler?

É difícil responder a essa pergunta. É verdade que os alemães, de um modo geral, foram solidários com o regime. A resistência e a oposição sempre foram fracas, ao contrário do que aconteceu em Itália. No entanto, parece-me difícil sustentar que devam penitenciar-se pelo nazismo. Os filhos e os netos não podem ser responsabilizados pelo que fizeram os seus antepassados. Ao mesmo tempo, o passado do país cria deveres coletivos e deveria levar à exclusão de qualquer ressurgimento ou qualquer nostalgia do regime de Hitler.

Escreve que, até 1942, a vitória dos nazis parecia certa. Qual foi o momento de viragem da guerra?

Não escrevi exatamente isso. O que escrevi é que, para as pessoas que viviam na Europa naquela época, até 1942 a Alemanha parecia invencível. Mas, na realidade, a Alemanha já tinha perdido a guerra em 1941, porque a economia alemã era muito fraca.

Era fraca?

Custa-nos perceber isso, porque pensamos sempre na Alemanha como um país muito poderoso, muito industrial. Mas na verdade não era uma potência assim tão terrível. Quando a Wermacht [Forças Armadas alemãs] foi travada em Moscovo em 1941, claro que a contraofensiva liderada pelo general Júkov foi um revés para o exército alemão. Mas a verdade é que os alemães não podiam avançar porque não tinham petróleo. Mesmo que o Exército Vermelho não fosse capaz de conter o ímpeto dos alemães, estes não teriam conseguido progredir, devido a essa falha económica. A Alemanha não tinha matérias-primas, não tinha petróleo, não tinha borracha, por isso era impossível ganhar a guerra. A menos que o poder comunista tivesse colapsado. Mas não foi o caso.

Há um momento em que os alemães se encontram às portas de Moscovo e os soviéticos têm tudo preparado para a saída de Estaline. O comboio especial está à espera para o levar, mas à última da hora Estaline diz a Motolov: ‘Vai andando, que eu ainda fico’. Isso pode ter dado um sinal importante?

De facto, houve em 1941 um momento de pânico nos círculos do poder da União Soviética. Mas Estaline percebeu que não podia deixar Moscovo e isso acabou por ser um elemento muito importante para acalmar a população e mostrar que o poder ainda resistia. Mas mesmo que nesse momento de pânico tivessem fugido, poderiam transferir muitas fábricas do lado ocidental para o leste do país. E o exército alemão, que tinha tido um sucesso enorme em junho, julho e agosto, em setembro e outubro começou a abrandar. E foi aí, em outubro de 1941, que o Estado-Maior alemão percebeu que aquilo que julgava que ia ser uma blitzkrieg [guerra-relâmpago] afinal seria uma longa guerra. E isso ia levantar novas dificuldades à Alemanha justamente por causa da situação económica.

Isso deve ter sido um golpe terrível para os militares alemães. É curioso, que os russos derrotaram Napoleão em 1812 em parte devido à decisão de abandonar Moscovo. E, em 1941…

Em parte venceram devido à decisão de não abandonar Moscovo.

Acha que Hitler teve mais olhos que barriga?

Claro. Os alemães, e Hitler em particular, sobreavaliaram as suas possibilidades. Temos de ser cautelosos porque, por um lado, a liderança nazi foi bastante astuta. Os nazis obtiveram, com recurso à brutalidade, o que os políticos alemães do período entre guerras não tinham conseguido obter – refiro-me à revisão do Tratado de Versalhes. Por outro lado, não eram pessoas muito cultas, nunca tinham verdadeiramente viajado, e por isso ignoravam, por exemplo, o que eram os Estados Unidos. Quando alguns responsáveis nazis disseram a Göring [uma das figuras-chave do Terceiro Reich, chefe da Luftwaffe, a força aérea] que os americanos estavam a produzir aviões aos milhares, Göring respondeu que estavam a mentir. Não acreditava, porque estava alheado do mundo e, ao mesmo tempo, acreditava na máquina da propaganda, o que se revelou muito perigoso.

Uma das vantagens dos soviéticos no embate com os alemães era o número quase ilimitado de homens. Estaline via os seus soldados como carne para canhão?

Há um historiador britânico, John Ellis, que tem um livro intitulado Brute Force [Força Bruta], em que diz: ‘Não andem à procura da genialidade dos generais, basta olhar para os números’. A riqueza da União Soviética era inacreditável. Falo de riqueza humana – havia muitas pessoas que podiam tornar-se soldados –, mas também de território – era um território gigantesco, que lhes dava uma grande vantagem em termos de espaço, pois as tropas podiam retirar-se facilmente – e finalmente riqueza de recursos, como petróleo e matérias-primas. Estaline foi muito esperto na organização da indústria de guerra. Ao contrário do que disseram os generais alemães, a vitória russa não se deveu ao inverno nem à neve, até porque toda a gente sabe que o inverno russo é frio. A derrota alemã deveu-se à superioridade da economia soviética. Desse ponto de vista, Estaline estava certo. Por outro lado, desbaratou muitos recursos humanos ordenando ofensivas e contraofensivas. Isso foi um erro terrível, porque sacrificou sem necessidade as vidas de muitos, muitos soldados. Nisso há uma enorme diferença entre os soviéticos, de um lado, e os norte-americanos, do outro. No exército americano a vida era realmente sagrada, e na Rússia não.

Foi por isso, então, que a União Soviética perdeu tantos milhões de pessoas na guerra [estima-se que cerca de 25 milhões].

Muitos soldados foram sacrificados. Mas devemos ter presente que a guerra na Frente Oriental foi especialmente bárbara e muitas dessas vidas foram ceifadas pelos alemães. Por exemplo, mais de metade dos prisioneiros de guerra russos foram mortos pelos alemães, fosse por execução ou pelas más condições e maus tratos. Estaline é certamente responsável pela morte de milhões de russos mas os alemães também são.

Este verão li o livro de Ben MacIntyre sobre Colditz, a prisão alemã de alta segurança para oficiais aliados, e fiquei surpreendido com o tratamento que recebiam – que contrasta com o que acontecia nos campos de concentração. E pensei se isso poderia resultar do facto de os campos serem geridos pelas SS [a polícia do Estado, tutelada por Heirich Himmler, o n.º 2 do regime], e não pelo exército, que, apesar de tudo, era uma instituição antiga, com certas regras e princípios.

Devemos fazer aqui algumas precisões. Falando de uma forma geral, as autoridades alemãs respeitaram a Convenção de Genebra. Mesmo prisioneiros de guerra judeus não eram executados pelos alemães porque estavam protegidos pelas normas do direito internacional. Os alemães respeitaram essa lei, mas nem sempre. No caso dos prisioneiros de guerra polacos, diziam: ‘Estes prisioneiros de guerra não são polacos, porque não existe Estado polaco’. Uma parte da Polónia tinha sido anexada pela Alemanha e a outra parte transformada naquilo a se chamou Governo Geral. Portanto a Polónia não existia. E usaram este pretexto para dizer: ‘Como não existe um Estado polaco, também não existem prisioneiros de guerra polacos, portanto podemos fazer com eles o que nos apetecer’. Já em relação aos russos, a União Soviética não tinha ratificado as convenções. Os alemães disseram: ‘Como não assinaram, os prisioneiros deles não são abrangidos por estas convenções’, o que era falso, porque não se era obrigado a assinar o acordo para ter os seus prisioneiros de guerra protegidos pela lei. Sim, a Alemanha respeitou as convenções internacionais para os prisioneiros de guerra, mas nem sempre.

Certo…

Em relação à ideia de uma grande discrepância entre a Wermacht, que era um exército profissional, com um ethos profissional, por um lado, e a SS, bárbara e horrível, temos de ser muito cuidadosos. Sabemos, por exemplo, que alguns oficiais alemães estiveram envolvidos em massacres na Frente Oriental. Distinguir entre uma ‘boa’ Wermacht e uma ‘má’ SS é algo desfasado da realidade.

Tem um livro publicado sobre a Resistência em França. Há muitas histórias de heroísmo entre essas pessoas anónimas ou o seu papel também foi exagerado?

Ambos. Por um lado, a Resistência foi um fenómeno incrível, porque raramente foi organizada por líderes proeminentes. No caso francês, houve muito poucos generais, muito poucos políticos e muito poucos intelectuais envolvidos. Em grande medida, a Resistência nasceu espontaneamente. 

Entre as pessoas comuns?

Sim. Se vir, por exemplo, Henri Frenay, era apenas um capitão, e criou o mais poderoso movimento de resistência. Isso é espantoso. E podemos dizer que por toda a parte, tanto na Europa como na Ásia, os membros da Resistência foram verdadeiros heróis. Mas isso não significa que tenham desempenhado um papel muito importante na libertação do seu país. De uma forma geral, os membros da Resistência foram bons a recolher informações, foram bons espiões, também foram muito relevantes no apoio à opinião pública, mostrando que a vitória alemã não era uma fatalidade. Do ponto de vista político e do moral tiveram um papel importantíssimo. Mas no campo militar a sua intervenção foi mínima. Em França, os Maquis [movimento de guerrilha que atuou sobretudo no meio rural] tiveram um papel mínimo na libertação. A França foi libertada pelos exércitos regulares anglo-americanos.

Por falar nisso, algumas pessoas acusam os Americanos de terem entrado demasiado tarde na Guerra, e só na sequência do ataque a Pearl Harbour. Face ao que já se sabia sobre os crimes dos nazis, Roosevelt não tinha obrigação de intervir mais cedo?

Uma coisa é se o devia ter feito, outra coisa é se o podia ter feito. Roosevelt abominava Hitler. Não há qualquer complacência de Roosevelt para com Hitler. Digo isto porque até certo ponto Churchill admirava Mussolini. Não era o caso. Mas Roosevelt tinha de lidar com uma opinião pública que era isolacionista. A intervenção americana em 1917 [na Grande Guerra] não era considerada propriamente como uma bênção pela população americana. Muitas pessoas, como Lindbergh [o famoso aviador] eram contra o envolvimento americano, e Roosevelt também estava numa posição delicada porque o New Deal [grande plano de reformas e obras públicas para vencer a Grande Depressão] não tinha a aprovação de todos os americanos. A sua margem de manobra era muito, muito limitada. E na verdade foi fazendo o seu melhor para ajudar os países amigos e a Grã-Bretanha com o envio de material de guerra. Mas teria sido muito difícil para ele envolver o país na guerra mais cedo – os americanos não teriam concordado com isso.

Assinalaram-se em junho 80 anos do desembarque na Normandia [6 de junho de 1944]. Na conferência de Teerão [final de 1943], Estaline pressionou muito os aliados para levarem a cabo a invasão da Europa, enquanto Churchill tentava protelá-la. Hoje sabemos que resultou em pleno, mas na altura havia dúvidas do seu desfecho?

Churchill opunha-se completamente ao desembarque na Normandia, porque defendia o uso de uma estratégia indireta, o que significava enfraquecer o exército alemão na periferia – no Mediterrâneo, no Norte de África e no Médio Oriente –, onde se podia obter vitórias com poucos homens. Essa era a sua estratégia: desgastar o exército alemão na periferia e depois atacar. Roosevelt era contra esta estratégia, porque, e isto é um legado da Guerra Civil, para os americanos tem de se atacar o inimigo onde ele é mais forte. Como o nordeste europeu era o ponto forte do exército alemão, havia que focar-se neste setor das operações. Até Teerão, em finais de novembro de 1943, Churchill ganhou, porque conseguiu convencer Roosevelt a intervir no Norte de África – novembro de 1942 –, na Sicília – julho de 1943 –, etc. Mas os dividendos destas campanhas eram muito escassos. Por isso Roosevelt, convencido pelo seu chefe do Estado-Maior do Exército, George Marshall, decidiu apoiar Estaline. Estaline reivindicava uma segunda frente, e essa decisão acabou por ser tomada em Teerão em 1943.

Quando se fala da Segunda Guerra Mundial, fala-se sobretudo dos crimes nazis. Mas também houve crimes, e não foram poucos, cometidos pelos Aliados. O seu livro fala das violações das mulheres alemãs cometidas pelos soldados do Exército Vermelho, e claro, há os bombardeamentos de Dresden, de Colónia e de Tóquio, para não falar de Hiroxima e Nagasáqui. Houve muita violência e destruição desnecessárias levadas a cabo pelos Aliados?

Julgo que tem de se fazer uma distinção – não entre os Aliados e o Eixo, mas entre os estados totalitários e os outros. A violência nunca foi glorificada enquanto tal pelas democracias, como a Grã-Bretanha, a França e os Estados Unidos. É verdade que houve crimes de guerra. Por exemplo, não foram feitos muitos prisioneiros durante os primeiros dias da reconquista da Normandia.

Isso significa que foram executados?

Foram executados. Mas isso não fazia parte do sistema. Também houve violações perpetradas por franceses em Itália, por soldados americanos em França, mas nunca o alto comando deu cobertura ou encorajou esses crimes. Pelo contrário, a violência é inerente à cultura, ao ethos dos estados totalitários. Os historiadores estimam que mais de dois milhões de mulheres alemãs foram violadas pelo Exército Vermelho. E, pelo menos no início, estas violações foram encorajadas pelo Estado-maior soviético. Quando se fala dos bombardeamentos de Dresden, é claro que não eram necessários. Havia a ideia – especialmente do lado britânico – que era uma forma de quebrar a solidariedade da população em relação aos líderes, e que não resultou. Mas não foi uma maneira de castigar os alemães, ou de os exterminar. Existe de facto uma violência da guerra do lado Aliado. Mas é de uma natureza diferente da da violência dos estados totalitários.

À beira do final da Guerra, o Decreto Nero, assinado por Hitler, ordenava a destruição de todas as infraestruturas na Alemanha que pudessem vir a ser utilizadas pelos Aliados, o que comprometia o próprio futuro da Alemanha. No Japão, tivemos as duas bombas atómicas. Não é surpreendente que os dois países mais devastados pela guerra se tenham tornado superpotências económicas e industriais de forma relativamente rápida?

Sim, tem razão. Mas devemos notar que o Decreto Nero nem sempre foi aplicado. Speer, que era o ministro do Armamento, tentou sabotá-lo. Além disso, apesar dos bombardeamentos – e isso foi uma surpresa para os americanos que chegaram à Alemanha a seguir à guerra – o potencial industrial alemão manteve-se quase intacto. Apenas cerca de 5% do potencial industrial tinha sido destruído. Portanto a Alemanha teve uma base para recuperar. No caso do Japão, foi mais difícil. Mas repare que a emergência como potência industrial não foi imediata, levou algum tempo. Diria que só se afirmou como tal na década de 1970, ou seja, cerca de 25 anos depois do fim da guerra.