Donald Trump será, de novo, o Presidente dos Estados Unidos da América. A vitória chegou logo na madrugada de quarta-feira, com o candidato republicano a ganhar de forma mais confortável do que se previa. As sondagens favoreciam o ex-Presidente, agora Presidente-eleito, mas é certo que falharam, já que apontavam para uma decisão renhida até ao fim, com os swing-states a poderem cair para qualquer lado. Trump venceu em todos, conquistando 312 votos na totalidade do Colégio Eleitoral, e, ao contrário do que aconteceu em 2016, quando venceu Hillary Clinton, conseguiu uma vantagem de sensivelmente 3% no voto popular. Além disto, os republicanos conseguiram reconquistar uma maioria no Senado e estão bem posicionados para manter a maioria na Câmara dos Representantes, e mantêm a maioria no Supremo Tribunal.
Os eleitores americanos optaram pela rutura em detrimento da continuidade e, mesmo havendo vários tópicos em que os candidatos apresentavam propostas diametralmente opostas, a economia e a imigração foram, talvez, os fatores decisivos. A política externa também sofrerá uma mudança relevante, bem como outras questões socioculturais.
«Vamos curar o nosso país», afirmou Trump no seu discurso vitorioso, «não havia outro caminho que não a vitória», acrescentou. Kamala Harris adiou inicialmente o seu discurso de concessão, tendo-se dirigido à sua campanha e aos seus apoiantes no final da tarde de quarta-feira na Universidade de Howard: «A minha lealdade a todos esses princípios [que guiaram a campanha] é o que me faz dizer que, enquanto concedo esta eleição, não concedo a luta que alimentou esta campanha», disse a ainda vice-presidente, notando ainda que «às vezes, a luta leva tempo. Isso não significa que não venceremos. Não desistam. Vocês têm poder». Foram dois discursos diferentes do habitual, sem a inflamação inerente a uma campanha, e é seguro dizer que a transição de poder decorrerá tranquilamente. Bastante mais que em 2017 e 2021.
Venceu Trump, ou perdeu Kamala?
Ambas as hipóteses podem estar certas. Donald Trump, independentemente de todo o imbróglio judicial, que ainda não está resolvido, e dos acontecimentos de 6 de janeiro de 2021, conseguiu voltar a galvanizar o Partido Republicano contra todas as probabilidades. Rodeou-se de figuras como Elon Musk, Robert F. Kennedy, Tulsi Gabbard e, principalmente, J. D. Vance – o próximo vice-presidente americano. A nova direita pós-liberal registou uma grande vitória na quarta-feira. Diferente do conservadorismo liberal do partido na época de Ronald Reagan, onde o livre mercado era privilegiado, o pós-liberalismo fez aumentar o leque eleitoral, chegando a cidadãos que outrora votariam no Partido Democrata. É o caso da classe operária e dos sindicalistas que o novo Partido Democrata descurou. A sociologia do voto mudou de forma significativa e é um fator explicativo para a vitória de Trump, na qual a estratégia da equipa de campanha, através de um conjunto de associações, desempenhou um papel fundamental.
Mas se é verdade que Trump, e sua respetiva equipa, ganhou a eleição, também é verdade que o Partido Democrata, na pessoa de Kamala Harris, a perdeu. A tentativa de encobrimento das incapacidades de Biden até ao último momento e a escolha da até então apagada vice-presidente, sem passar pelo processo natural, democrático e desgastante das primárias, revelou-se um erro fatal. Esta derrota expressiva é uma mensagem clara que o eleitorado americano envia à cúpula do Partido Democrata, que lhes tentou impor uma candidata a três meses do ato eleitoral.
É também uma mensagem no prisma ideológico. Os democratas, tomados pela ala da esquerda mais radical – não tradicional –, ou woke, cujas preocupações assumem uma relevância mínima para a grande maioria dos votantes, estão assim forçados a mudar de rumo de forma a revitalizar o partido. Caso contrário, o caminho da Sala Oval parece aberto para J. D. Vance em 2028. Se há algo de bom para o Partido Democrata nesta eleição, é precisamente o choque de realidade que os levará, provavelmente, de volta ao centro.
Reação internacional
Foram vários os líderes mundiais a felicitar Donald Trump pela vitória sobre Kamala Harris. De Emmanuel Macron a Javier Milei, passando por Keir Starmer, Luís Montenegro e Pedro Sánchez, houve uma parabenização transversal, como é natural.
Mas, de todas as mensagens, destacam-se as do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky e do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu. Os dois aliados do ocidente que estão neste momento abraços com um conflito, parecem estar entusiasmados pela vitória de Trump. Zelensky disse que quer «uma era com uns Estados Unidos fortes sob a liderança decisiva do Presidente Trump» e apelou a uma «paz pela força». Netanyahu, cujas divergências com a administração Biden-Harris eram por demais evidentes, deixou uma provocação à anterior liderança: «[O retorno de Trump à Casa Branca] oferece um novo início para a América e um novo compromisso poderoso para com a grande aliança entre Israel e Estados Unidos».
Com Donald Trump, a política de dissuasão deve voltar a ser a máxima condutora da política externa americana, em detrimento da ‘desescalada’, uma característica de Biden e de Kamala, que foi um dos fatores responsáveis pela erupção dos conflitos atuais.
Trump e a Justiça
Trump conseguiu tornar-se de novo inquilino da Casa Branca, sendo apenas o segundo da história dos Estados Unidos a servir dois mandatos não consecutivos, independentemente do imbróglio judicial em que está metido. É mesmo o primeiro Presidente a ser objeto de uma acusação penal. Mas, tendo ganho a eleição, o que acontece agora?
Trump enfrenta quatro processos penais, atualmente pendentes. Primeiro, e a nível federal, pela tentativa de reversão das eleições de 2020. Segundo, pelo caso de se ter apoderado de documentos da Casa Branca. Terceiro, pela alegada falsificação de registos comerciais no Tribunal de Nova Iorque. Por último, enfrenta também um processo relativo à sua conduta nas eleições de 2020 no Estado da Geórgia.
Segundo a Forbes, a decisão sobre se as condenações de Trump se mantêm ou não será tomada no próximo dia 12, tendo sido adiadas para o período pós-eleitoral de modo a não haver acusações de que a decisão seria tomada de forma política. Os advogados de Trump adiaram todos os processos e o Presidente-eleito solicitou ao Supremo Tribunal a imunidade presidencial (quando ainda era apenas ex-Presidente). Donald Trump tem também outros casos civis pendentes. Assim, resta esperar pelo desenvolvimento dos casos.
Por fim, Donald Trump aceitou o convite de Joe Biden para visitar a Casa Branca, mesmo já conhecendo os cantos à casa, e tomará posse no dia 20 de janeiro de 2025.