A Fraude


Diversas organizações da União Europeia e outros organismos internacionais têm vindo a chamar à atenção dos governantes para casos recorrentes de abusos da força.


Nos últimos dias os levantamentos da periferia de Lisboa têm dominado as notícias. As imagens dos caixotes do lixo a arder e das forças policiais fortemente armadas a avançar para os bairros repetem-se infinitamente passando uma mensagem subliminar racista e securitária. Uma fraude.

A verdade é que um homem Negro, Odair Moniz, foi morto a sangue-frio com tiros disparados pela Polícia. Nos primeiros dias a narrativa televisiva era simples. Um bandido a fugir da Polícia num carro roubado acabou encurralado e resistiu violentamente à Polícia brandindo uma arma branca. As televisões, esquecidas das práticas de investigação, olvidadas do princípio básico do jornalismo de ouvir as várias partes, ignorando testemunhos populares, limitavam-se a reproduzir acriticamente os comunicados da Polícia. Uma fraude.

Mas as manifestações dos jovens acabaram por alertar os portugueses de que algo estava errado nessa narrativa simplista. Alguns jornalistas investigaram. O carro roubado passou a ser o legitimo carro da vítima. O “bandido” revelou-se um querido chefe de família, uma pessoa respeitada, socialmente envolvida com a sua comunidade, voluntário em ações de solidariedade. A fraude começava a desvanecer-se.

A arma branca, a faca ameaçadora que motivou os disparos, é agora de muito duvidosa existência. A arma principal na cena do crime é a arma que disparou os tiros fatais. Nada aponta, considerando o seu perfil e o seu histórico, para que Odair estivesse a desenvolver qualquer atividade reprovável no momento em que foi morto. A narrativa inicial desmoronou-se. 

Pelo contrário, o perfil e o histórico do modo de atuação da Polícia apontam para casos de brutalidade e violência sobre os moradores de bairros pobres e racializados da coroa periférica das grandes cidades. Diversas organizações da União Europeia e outros organismos internacionais têm vindo a chamar à atenção dos governantes para estes casos recorrentes de abusos da força.

A infiltração da extrema-direita racista nas forças de segurança está igualmente bem documentada. Recordemos a necessidade dos comandos policiais de ordenarem aos seus homens que retirassem tatuagens de cariz fascista/nazista que foi amplamente noticiada. Se as não tivessem para que seria a ordem? Se fosse só um ou dois, mais valia falar com eles do que emitir uma ordem geral. Também uma investigação jornalista encontrou centenas de elementos das forças da ordem em chats extremistas e xenófobos.

Nestas circunstâncias aceitar a narrativa da Polícia sem a questionar não parece ingenuidade, mas conivência. Uma conivência perigosa entre a comunicação social e os elementos extremistas e racistas infiltrados nas forças policiais (provavelmente até postos de grande responsabilidade).

Na Alemanha este ano uma investigação das autoridades permitiu identificar mais de 400 polícias com ligações e simpatias à extrema-direita. Medidas exemplares foram tomadas contra estes elementos.

Na Inglaterra há uns anos um relatório independente de um antigo Juiz levou à conclusão que a Polícia era institucionalmente racista. Foi tomado um conjunto alargado de medidas. Umas funcionaram outras não. Podemos aprender com a experiência.

Portugal precisa de levar a cabo uma investigação rigorosa, profunda e independente dos níveis de infiltração da Polícia por elementos da extrema-direita racista e xenófoba que leve ao afastamento destas pessoas. Precisa também de analisar detalhadamente as práticas e os comportamentos dos seus agentes policiais, principalmente quando atuam em certas zonas urbanas.

Para que a segurança em todos os bairros aumente. Para que não seja a Polícia a ser percebida como a fonte de perigo e insegurança.

Meter a cabeça na areia e defender o indefensável é a pior alternativa. É a que a curto, médio e longo prazo gerará maior insegurança para o maior número de pessoas,

Para isso é preciso começar por um primeiro passo. Rever as narrativas fraudulentas. Trazer a Verdade ao primeiro plano. É preciso fazer Justiça a Odair Moniz.

A Fraude


Diversas organizações da União Europeia e outros organismos internacionais têm vindo a chamar à atenção dos governantes para casos recorrentes de abusos da força.


Nos últimos dias os levantamentos da periferia de Lisboa têm dominado as notícias. As imagens dos caixotes do lixo a arder e das forças policiais fortemente armadas a avançar para os bairros repetem-se infinitamente passando uma mensagem subliminar racista e securitária. Uma fraude.

A verdade é que um homem Negro, Odair Moniz, foi morto a sangue-frio com tiros disparados pela Polícia. Nos primeiros dias a narrativa televisiva era simples. Um bandido a fugir da Polícia num carro roubado acabou encurralado e resistiu violentamente à Polícia brandindo uma arma branca. As televisões, esquecidas das práticas de investigação, olvidadas do princípio básico do jornalismo de ouvir as várias partes, ignorando testemunhos populares, limitavam-se a reproduzir acriticamente os comunicados da Polícia. Uma fraude.

Mas as manifestações dos jovens acabaram por alertar os portugueses de que algo estava errado nessa narrativa simplista. Alguns jornalistas investigaram. O carro roubado passou a ser o legitimo carro da vítima. O “bandido” revelou-se um querido chefe de família, uma pessoa respeitada, socialmente envolvida com a sua comunidade, voluntário em ações de solidariedade. A fraude começava a desvanecer-se.

A arma branca, a faca ameaçadora que motivou os disparos, é agora de muito duvidosa existência. A arma principal na cena do crime é a arma que disparou os tiros fatais. Nada aponta, considerando o seu perfil e o seu histórico, para que Odair estivesse a desenvolver qualquer atividade reprovável no momento em que foi morto. A narrativa inicial desmoronou-se. 

Pelo contrário, o perfil e o histórico do modo de atuação da Polícia apontam para casos de brutalidade e violência sobre os moradores de bairros pobres e racializados da coroa periférica das grandes cidades. Diversas organizações da União Europeia e outros organismos internacionais têm vindo a chamar à atenção dos governantes para estes casos recorrentes de abusos da força.

A infiltração da extrema-direita racista nas forças de segurança está igualmente bem documentada. Recordemos a necessidade dos comandos policiais de ordenarem aos seus homens que retirassem tatuagens de cariz fascista/nazista que foi amplamente noticiada. Se as não tivessem para que seria a ordem? Se fosse só um ou dois, mais valia falar com eles do que emitir uma ordem geral. Também uma investigação jornalista encontrou centenas de elementos das forças da ordem em chats extremistas e xenófobos.

Nestas circunstâncias aceitar a narrativa da Polícia sem a questionar não parece ingenuidade, mas conivência. Uma conivência perigosa entre a comunicação social e os elementos extremistas e racistas infiltrados nas forças policiais (provavelmente até postos de grande responsabilidade).

Na Alemanha este ano uma investigação das autoridades permitiu identificar mais de 400 polícias com ligações e simpatias à extrema-direita. Medidas exemplares foram tomadas contra estes elementos.

Na Inglaterra há uns anos um relatório independente de um antigo Juiz levou à conclusão que a Polícia era institucionalmente racista. Foi tomado um conjunto alargado de medidas. Umas funcionaram outras não. Podemos aprender com a experiência.

Portugal precisa de levar a cabo uma investigação rigorosa, profunda e independente dos níveis de infiltração da Polícia por elementos da extrema-direita racista e xenófoba que leve ao afastamento destas pessoas. Precisa também de analisar detalhadamente as práticas e os comportamentos dos seus agentes policiais, principalmente quando atuam em certas zonas urbanas.

Para que a segurança em todos os bairros aumente. Para que não seja a Polícia a ser percebida como a fonte de perigo e insegurança.

Meter a cabeça na areia e defender o indefensável é a pior alternativa. É a que a curto, médio e longo prazo gerará maior insegurança para o maior número de pessoas,

Para isso é preciso começar por um primeiro passo. Rever as narrativas fraudulentas. Trazer a Verdade ao primeiro plano. É preciso fazer Justiça a Odair Moniz.