Vivemos num país onde a greve parece ser o desporto nacional, e, curiosamente, este desporto acontece sempre a uma sexta-feira. Professores? Sexta-feira. Profissionais de saúde? Também sexta-feira. Será que a sexta-feira foi promovida a dia oficial da indignação ou apenas um passaporte para um fim de semana prolongado?
Reparem que não estou a tirar o mérito às causas destas pessoas. Têm os seus motivos laborais. Eu, como qualquer português com bom senso, entendo perfeitamente que há reivindicações legítimas. Quem sou eu para dizer que os professores não merecem melhores condições de trabalho? Quem sou eu para julgar os trabalhadores não docentes que exigem a criação de carreiras especiais, aumentos salariais, melhores condições de trabalho e a revisão da portaria de rácio? Ou que os profissionais de saúde não têm motivos para se manifestar por mais dinheiro ao fim do mês?
Mas, convenhamos, será que as greves perdem algum impacto quando coincidem, quase sempre, com a sexta-feira? Há quem diga que na segunda-feira é uma ressaca emocional do fim de semana, então, nada de greves. Terça-feira? Trabalho à vista! Mas sexta-feira, ah, sexta-feira é o dia perfeito.
E não é que, de repente, a sociedade inteira já percebeu o truque de calendário? “Greve à sexta-feira? Lá vão eles querer mais um fim de semana prolongado.” E nós, enquanto público, que devíamos estar a par das reivindicações, já começamos a bocejar. “Ah, mais uma greve? À sexta? Está bem…”
No meio disto, temos um Governo que mal abriu as gavetas e já está a ser brindado com greves por todos os lados. Só que o efeito destas manifestações, que deveriam ser sérias e impactantes, começa a dissipar-se entre a simpatia pelo descanso merecido e o eco distante da verdadeira mensagem. A palavra “greve” já não agita as águas como antigamente. Antigamente uma greve era uma novidade, um grito de alerta. Hoje, soa mais a mais uma sexta-feira com as cadeiras vazias e os sapatos guardados.
E não me interpretem mal. Não estou a sugerir que não se façam greves, mas será que não vale a pena rever a estratégia? Imaginem uma greve a uma terça-feira – que surpresa! Ou melhor, uma greve a uma quinta-feira! Uma pequena revolução no calendário de greves poderia, de facto, devolver o impacto às reivindicações.
Mas aqui entre nós, caros amigos que não fizeram greve hoje, parece-me que há aqui um padrão. Sexta-feira é sinónimo de fim de semana alargado, de descanso, e talvez as greves sejam mais um reflexo disso do que propriamente da urgência das questões. Queremos realmente lutar por melhores condições ou, no fundo, só estamos a lutar por mais um dia no sofá? Ou as duas coisas?
É claro que, no final, a decisão cabe aos sindicatos. Se calhar, depois de meses e meses de greves à sexta-feira, podemos acabar por reconhecer um padrão curioso: o desejo por um bom fim de semana prolongado é, ao que parece, a mais legítima de todas as reivindicações. Ou então, indiretamente, é uma mensagem para debatermos a semana de trabalho de 4 dias.