Médio Oriente. Um conflito histórico sem fim à vista

Médio Oriente. Um conflito histórico sem fim à vista


O conflito no Médio Oriente parece estar longe do fim e ninguém vislumbra uma resolução consistente. A crise humanitária agrava-se a cada dia que passa


Desde a fundação do Estado de Israel, na sequência de um período de genocídio contra a população judaica, que a situação no Médio Oriente é marcada por instabilidade e conflitos entre os israelitas e os vizinhos árabes.

Em 1948 a guerra israelo-árabe; nos anos 50 várias insurgências palestinianas e a crise do Suez; em 1967 a guerra dos seis dias; de 1967 a 1970 a guerra de Desgaste; em 1973 a guerra do Yom Kippur; em 1982 a guerra do Líbano; de 1987 e 1993 a primeira intifada; de 2000 a 2005 a segunda intifada; em 2006 nova guerra com o Líbano; em 2008 a guerra em Gaza, que se repetiu em 2012 e 2014; em 2021 a crise israelo-palestiniana; e, a última, a guerra entre Israel e o Hamas. Trata-se de uma região com feridas profundas e difíceis de sarar, dando origem a novos conflitos de forma regular. Em outubro do ano passado estalou mais uma vez um conflito que está no centro da política internacional, a par da guerra na Ucrânia.

O 7 de outubro 

A 7 de outubro de 2023, Israel sofreu um ataque sem precedentes. O Hamas, grupo terrorista que controla a Faixa de Gaza desde 2006, atravessou as fronteiras israelitas por todos os meios possíveis naquela que foi uma das mais surpreendentes e flagrantes brechas de segurança da história de Israel. Morreram mais de mil israelitas, dos quais 815 eram civis, e foram capturadas mais de 200 pessoas. 101 ainda estão em Gaza como reféns.

Os Kibutz no sul de Israel foram brutalmente destruídos e os paraquedistas do Hamas atacaram ainda um festival de música, espalhando o terror e proporcionando imagens de barbárie.

Henrique Cymerman, correspondente internacional no Médio Oriente, disse ao Nascer do SOL no dia 8 de outubro de 2023 que Israel vivia “os dias mais dramáticos da sua história. É como um 11 de setembro, mas até maior”. “O atual Governo cometeu um erro, flirtando com o Hamas e permitindo a entrada de 20 mil palestinianos para trabalhar. Houve uma colaboração de facto”, acrescentou.

Além da proverbial inimizade entre os povos, o Hamas, alimentado pelo Irão, teve como objetivo matar os acordos de Abraão – que estabeleceram a paz entre Israel e os Emirados Árabes Unidos – e também os acordos entre a Arábia Saudita e Israel mediados pelos Estados Unidos. Os objetivos foram parcialmente cumpridos.

A retaliação 

O Governo israelita declarou estado de guerra de forma imediata e o que se seguiu, e segue, foi uma luta incessante pela aniquilação do Hamas. Porém, o complexo sistema de túneis da organização na Faixa de Gaza dificulta a tarefa das Forças de Defesa de Israel, e a resposta ao 7 de outubro tem estado debaixo de duras críticas quanto à sua legalidade e proporcionalidade. A crise humanitária resultante da retaliação israelita é evidente e os bombardeamentos na região não foram ainda interrompidos, algo que também desgastou a relação do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, com Washington, o seu maior e mais importante aliado.

A guerra rapidamente se espalhou com a entrada em cena do Hezbollah, um proxy do Irão no Líbano, e Israel trava uma guerra em duas frentes desde o início.

A incapacidade da ONU A relevância e peso na resolução de conflitos internacionais da Organização das Nações Unidas há muito que é colocada em causam e o conflito em Gaza é mais um exemplo. Os constantes apelos e resoluções de cessar-fogo não surtem qualquer efeito prático ou vinculativo.

Foi também conhecido que alguns funcionários da UNRWA, a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Médio Oriente, estiveram provavelmente envolvidos no ataque de 7 de outubro.

Netanyahu: o sobrevivente em declínio 

A figura principal deste conflito que dura já há cerca de um ano é o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu. “Bibi”, como é conhecido, esteve envolvido em casos judiciais e a sua tentativa de “reformar” o sistema de justiça – retirando poder ao Supremo Tribunal e ameaçando o Estado de direito da única democracia da região – no verão de 2023 levou milhares de israelitas à rua, colocando o líder do Executivo debaixo de uma enorme pressão.

Mas, como é característico em tempos de guerra, os israelitas unem-se e o assunto ficou naturalmente em segundo plano. Ainda assim, a sobrevivência política de Netanyahu no pós-guerra não é garantida, já que o povo não lhe deverá perdoar a clamorosa falha de segurança, a gestão da guerra e as tentativas passadas de acabar com o sistema de freios e contrapesos que norteia qualquer democracia liberal.

Para lá disto, em maio deste ano, o procurador principal do Tribunal Penal Internacional anunciou que iria pedir a emissão de mandados de captura a Netanyahu, ao seu ministro da Defesa e a três líderes do Hamas por crimes de guerra e crimes contra a Humanidade.

O Irão e a escalada 

A ideia mais comum, no início do conflito, seria de que o Irão não se envolveria de forma direta no conflito, deixando os seus proxies atuar. Porém, o ataque de Israel à embaixada iraniana em Damasco que vitimou mortalmente membros de topo da Guarda Revolucionária do Irão fez soar os alarmes de uma escalada. O Irão retaliou, mas acabou por apostar numa estratégia de contenção, não sendo também do seu interesse um conflito a larga escala com os EUA.

Os iranianos seguiram a mesma linha quando um dos líderes do Hamas, Ismail Haniyeh, foi assassinado em Teerão – ao que tudo indica por Israel.

A guerra no Médio Oriente, que já transcende a Faixa de Gaza, é um dos focos de conflito principais – abrindo uma nova frente na qual os EUA se digladiam com os seus maiores rivais de forma indireta. O cessar-fogo é a preocupação mais urgente para que não se agrave o desastre humanitário, mas não parece haver condições para uma paz duradoura e sustentável numa das regiões mais propensas a conflitos do último século.