Há quem associe o fim desta estação do ano às vindimas. A poda dá-se, por norma, em janeiro. Na primavera formam-se os cachos e é no verão que os pequenos bagos ganham sabor, cheiro e cor. Entre setembro e outubro já se encontram maduros e, por isso, prontos para se transformarem em vinho.
Somos conhecidos além fronteiras pela qualidade dos nossos vinhos, sendo incontáveis os prémios e distinções conquistados em concursos internacionais. Os turistas chegam (cada vez mais) de todos os recantos do mundo e, na capital, é difícil encontrar quem esteja sentado numa esplanada sem um copo ou uma garrafa de vinho em cima da mesa.
Mas se há quem venha até Portugal para visitar monumentos, aproveitar as praias, passear pelas cidades, conhecer a gastronomia – degustando os nossos vinhos nos momentos de pausa -, outros vêm com o outro objetivo: conhecer as vindimas portuguesas, as regiões onde estas se encontram, os seus produtores, pisar uva e beber vinho. Em 2023, segundo dados da Associação Portuguesa de Enoturismo (APENO), Portugal foi considerado o segundo maior destino mundial nesta área – segmento da atividade turística que se baseia na viagem motivada pela apreciação do sabor e aroma dos vinhos e das tradições e cultura das localidades que produzem esta bebida. À frente surge apenas Itália, enquanto países como Espanha, França, Nova Zelândia, Argentina ou Austrália, ficam atrás.
Uma experiência de luxo O Douro e o Alentejo são as regiões onde se concentra o maior número de espaços dedicados a esta atividade. É na zona histórica da alfândega de Vila Nova de Gaia, a poucos passos da zona ribeirinha, que se encontra a Churchill’s – uma cave de vinho do Porto em funcionamento e um centro de visitas onde todos os dias visitantes de todo o mundo provam vinhos do Porto e do Douro. Até 2017 a Quinta da Gricha era “apenas” a casa da Churchill’s no Douro, onde se produzia esses vinhos “da forma mais tradicional possível”: “Uvas apanhadas e selecionadas à mão, e pisadas a pé nos tradicionais lagares de granito datados de 1852”, explica Ana Pinto, diretora de marketing do espaço. Em 2017, terminaram as obras de renovação da casa que existia na propriedade – datada do século XIX -, e das estruturas existentes para a produção de vinho, e foi o ano em que abriram o enoturismo – a Gricha Vineyard House. “Com apenas quatro quartos de luxo – Urze, Alfazema, Esteva e Zimbro -, a Gricha Vineyard House oferece uma experiência única, pessoal e intimista, da vida numa adega em funcionamento no Douro”, afirma a responsável. “Convidamos os hóspedes a experienciar a tranquilidade e a simplicidade da vida no meio das vinhas, aprender sobre viticultura e enologia nas nossas visitas personalizadas, provar os vinhos da Churchill’s entre os terraços do Douro ou com vista para os nossos lagares de 1852, relaxar ao pé da piscina com vista para o infinito, ou simplesmente descontrair no terraço enquanto contemplam a vista panorâmica sobre o vale do Douro”, detalha.
Além disso, as pessoas podem fazer parte do processo, “metendo o pé na uva”. Literalmente. Aliás, a Churchill’s é uma das poucas casas de vinho do Porto que ainda pisa todas as suas uvas a pé, porque acredita “ser esta a melhor forma de produzir vinhos do Porto de alta qualidade”. E por isso, estas experiências de vindima, garante Ana Pinho, “são um convite único a participar no ritual mais tradicional da produção de vinho no Douro”. “É especial saber que daqui a uns anos, quando saírem os vinhos da vindima de 2024, há um bocadinho de nós na sua produção”, frisa.
Os dois programas começam no mês de setembro e ocorrem todas as quartas e sábados até ao dia 21 do mesmo mês: A Excecional Experiência Da Vindima custa 185 por pessoa e a Autêntica Experiência Da Vindima 95. De acordo com Ana Pinho, a Excecional Experiência da Vindima oferece “uma vivência mais completa”. O dia começa às 10 da manhã com o desafio da apanha da uva juntamente com a equipa de viticultura, seguido por um lanche de vindima na Cozinha dos “Caseiros”. Pela manhã, os participantes terão ainda a oportunidade de provar uma seleção especial de vinhos, que inclui dois Porto Vintage e dois Tawny, antes de se aventurarem na tradicional “pisa a pé” nos antigos lagares de granito de 1852. Esta experiência termina com um almoço tradicional servido no idílico Pátio das Laranjeiras, acompanhado por vinhos “frescos e elegantes”. Caso os visitantes prefiram começar mais tarde, a Autêntica Experiência da Vindima inclui pisa a pé nos lagares da Quinta da Gricha e um almoço tradicional no Pátio das Laranjeiras, onde os participantes terão a ocasião de provar quatro vinhos dos vinhos emblemáticos da quinta. E é precisamente esta experiência mais prática que mais marca quem visita o espaço nesta altura. “Ver a Quinta em pleno funcionamento, tal e qual como seria se os visitantes não estivessem lá. É mesmo uma experiência autêntica, sem luzes nem câmaras, a não ser claro as que servem para ajudar a registar memórias que vão ficar para a vida!”, sublinha a diretora de marketing. Segundo Ana Pinho, no turismo em geral há uma procura cada vez maior por experiências mais intimistas e mais autênticas. “Na Quinta da Gricha recebemos hóspedes de todo o mundo – EUA, Reino Unido, Alemanha, Itália, Japão -, mas também portugueses, que nos visitam para uns dias de tranquilidade no Douro e para desfrutar desta região única no mundo”, adianta ainda.
Meter a ‘a mão na massa’ Na Quinta da Mainova, no Alentejo, o enoturismo “é uma experiência que combina a paixão pelo vinho com a imersão do universo agrícola”. “Para nós, o enoturismo vai além de uma simples visita, que se iniciou faz dois anos… É uma forma de compartilhar a nossa filosofia e valores”, explica Bárbara Monteiro, uma das proprietárias do espaço. “Por se tratar de um projeto família, Mainova é o simbolismo de toda a família e a representação da história da Herdade da Fonte Santa situada no Vimieiro, Arraiolos”, revela. Aqui, além dos vinhos, os visitantes podem degustar os azeites. “Na Mainova oferecemos vários programas de enoturismo e klivoturismo que permitem os nossos visitantes explorar a vinha|/olival, degustar os vinhos e/ou azeites e vivenciar a cultura da empresa”, explica. Os programas vão dos 45 euros aos 80. “Todas as nossas visitas incluem visita às nossas vinhas e olival – incluindo o nosso olival milenar – de jipe e uma tábua de produtos regionais”, adianta. Aqui, os visitantes não põem o pé na uva, mas sim as mãos. “Temos um dia dedicado especialmente à vindima, no dia 7 de setembro – Moinante Experience – onde é dada a oportunidade de literalmente ‘colocar as mãos na massa’, fazendo a apanha da uva no campo e ajudar na mesa de seleção e escolha de uva. Assim, os visitantes entendem de forma mais íntima e autêntica o que está por trás de uma garrafa de vinho”, revela Bárbara Monteiro.
Tal como na Quinta da Gricha, na Mainova, os visitantes vêm de várias partes do mundo, com um crescimento notável de visitantes provenientes dos EUA. “Os portugueses também têm um peso significativo e deixa-nos muito feliz que comecemos a ser um destino de enoturismo reconhecido a nível nacional e internacional”, frisa a responsável. “Dentro deste pouco tempo, temos sentido um crescimento muito positivo nesta área de negócio. Acreditamos que o futuro do enoturismo em Portugal é promissor, sendo um país muito interessante pela quantidade de regiões vitivinícolas que temos. O setor está cada vez mais focado em práticas sustentáveis e num turismo responsável, que é muito valorizado. Temos todo o potencial para sermos um país de destaque como destino de enoturismo de alta qualidade, atraindo turistas internacionais e gerar benefícios significativos para as economias locais e comunidades”, acredita Bárbara Monteiro.
Desde os anos 90 que, na Adega João Portugal Ramos, em Estremoz, cidade portuguesa no distrito de Évora, na região do Alentejo, se realizam as vindimas. E, ao longo dos anos, “o número de visitantes tem vindo a crescer”, afirmou, no ano passado ao i, Vera Magalhães, responsável pelo enoturismo no local. No entanto, só há sete anos é que, na época das vindimas, os visitantes – que são sobretudo americanos, canadianos e brasileiros -, “podem meter a mão na massa”. Segundo a especialista, o que as pessoas procuram nesta atividade é uma “experiência real”, um momento de “divertimento” e “aprendizagem”.
Nesta adega, as pessoas que compram o programa – com o custo de 80 euros onde está incluído um kit de trabalho composto por um chapéu e uma t-shirt – começam o dia no campo, onde selecionam e apanham uvas com a orientação do pessoal responsável. Depois, seguem para a adega, onde é feita a experiência de “pisa pé” nos lagares de mármore. É aqui que se faz a fermentação. “O ‘pisa uva’ é feito com um fato e uma espécie de meias, tal como os fatos dos pescadores que vêm até cá acima e possuem umas botas incorporadas de borracha”, revelou na altura. Ou seja, na Adega João Ramos de Portugal, a pessoa não está descalça nos lagares que, por não terem altura, não permitem a participação de crianças. Segue-se uma visita à adega, onde as pessoas ficam a conhecer todo o funcionamento do espaço. “A pessoa é depois encaminhada para o almoço onde se dão as provas”, concluiu a responsável, acrescentando que esta experiência só está disponível nesta época e durante 15/20 dias.