Há dias vi na televisão a utilização da tecnologia da sterea-litografia para a construção de umas casas enormes a serem usadas na lua, o que me fez recordar uma pequena história que resolvi agora contar, pensando que poderá ter algum efeito pedagógico útil na compreensão dos problemas da economia e da sociedade portuguesas.
Há cerca de vinte anos, um domingo, estava com um amigo e colaborador da empresa num hotel em Los Angeles à espera de um voo nessa noite para Tóquio e sem nada para fazermos, quando vimos um anúncio de haver na cidade uma feira de tecnologia, que resolvemos visitar. Em boa hora diga-se, porque deparamos com a primeira apresentação mundial de uma pequena máquina que utilizava uma nova tecnologia para produzir um pequeno apito. O apito não era uma escolha acidental, porque permitia mostrar que com a nova tecnologia era possível produzir um produto com um outro componente no seu interior, no caso a esfera. Era o início do que vinte anos depois vi agora na televisão.
Fiquei entusiasmado com a nova oportunidade tecnológica por duas razões: (1) porque a tecnologia seria útil para a produção dos protótipos que eram parte da produção da nossa empresa, mas maquinados em máquinas CNC; (2) porque acreditava que uma nova tecnologia no seu início, do ponto de vista meramente empresarial era demasiado cara e seria inteligente esperar pela sua evolução, mas que do ponto de vista da investigação seria uma oportunidade de promover o seu futuro desenvolvimento.
Recordo que, por esse tempo, considerava ser prematura e excessivamente cara a opção do Governo de António Guterres de investir numa nova tecnologia desenvolvida por outros: a produção de energia eléctrica pela via eólica, na sua fase inicial da curva de preço, então excessivo, preço esse que estimava iria descer rapidamente como de facto aconteceu. Mas uma opção que serviu para que os preços da electricidade, já excessivos ao tempo, estejam ainda hoje a ser pagos por muitas famílias e empresas, dados os prazos escandalosos concedidos nos contractos então feitos. Denunciei isso mesmo nos jornais e fui ameaçado com um processo judicial, o que, como era previsível, nunca aconteceu, apesar de ter enviado uma carta aos promotores a aceitar o desafio de debater em tribunal as leis então feitas.
Voltando à história inicial, chegado a Lisboa, do ponto de vista meramente empresarial decidimos esperar pela descida dos preços, mas recordo que algumas semanas depois fui ao IST falar com um dirigente e professor da instituição a quem transmiti a notícia do aparecimento da nova tecnologia e a sugerir que a escola pudesse fazer investigação nessa área, ainda no seu início, porque os novos avanços seriam inevitáveis. Nada feito, o dito professor contou-me algumas cenas das dificuldades da instituição e nada mais aconteceu.
Não desisti e algum tempo depois apresentámos ao PEDIP, com origem na empresa Iberomoldes, um projecto de dotar alguns centros de investigação nacionais – recordo a Cefamol, o IST, uma universidade do Porto e o INETI – com os equipamentos necessários, então já de maior dimensão e qualidade, projecto que foi aprovado e os equipamentos foram todos entregues nas diversas instituições. Sei hoje que a Cefamol continua a utilizar com sucesso a máquina que lhe foi atribuída, mas que eu saiba nenhuma investigação foi feita e presumo que as restantes máquinas se encontrem hoje armazenadas algures. De facto, não sei.
Nos anos seguintes fui convidado e visitei por duas vezes uma universidade inglesa que iniciara a investigação e a divulgação dessa nova área tecnológica e com sucesso Se bem me recordo decidiram usar metais em vez de materiais plásticos na sua investigação e durante as minhas visitas assisti a duas feiras organizadas pela universidade no sentido de divulgar os novos equipamentos produzidos.
A moral desta história é óbvia e ao tempo conduziu-me à convicção de que existe em Portugal um problema na qualidade das decisões e que o edifício dos recursos humanos e da educação dos portugueses deve ser reiniciado pela base, nas creches e no pré-escolar, como a forma útil de mudar a mentalidade dominante em muitos centros de investigação nacionais como, aliás, na economia. Porque o problema da educação em Portugal, sei-o hoje, não é o da ausência de conhecimentos, mas do desenvolvimento de comportamentos éticos úteis à sociedade e das competências mais variadas úteis à economia, pelo que não basta apenas formar professores universitários e ter centros de investigação.
Portugal vive hoje uma encruzilhada no seu processo de desenvolvimento que só pode ser bem resolvida na escola, iniciando o edifício pelos alicerces. Claro que muito pode ser, entretanto, melhorado, assim haja talento e vontade, mas o essencial reside nas profundas mudanças a realizar na forma e no conteúdo com que formamos o futuro das nossas crianças.