A exigência no sítio errado


O país está pejado de exigências com a participação dos atletas portugueses nos jogos olímpicos de Paris, mas mantêm uma inusitada tolerância com falhas graves do funcionamento do Estado.


Em férias na tranquilidade de Almograve, em Odemira, no Baixo Alentejo, não deixa de emergir uma enorme contradição nacional em torno da exigência com terceiros. Somos, por regra, pouco exigentes com nós próprios, mas não deixamos de exercitar com terceiros, na vida real ou nas redes sociais, um acréscimo de exigência em relação a terceiros, das dinâmicas da vida corrente aos mais complexos exercícios de cidadania e de organização das comunidades, onde também podemos integrar a atividade política, plena de treinadores de bancada.

O país está pejado de exigências com a participação dos atletas portugueses nos jogos olímpicos de Paris, mas mantêm uma inusitada tolerância com falhas graves do funcionamento do Estado e dos seus serviços, para os quais contribui de forma substancial quem trabalha, em especial por conta de outrem.

A participação de Portugal nos Jogos Olímpicos de Paris, não é mais nem menos do que o reflexo do investimento que é feito na promoção da atividade física e das modalidades desportivas. Investimos muito pouco no combate ao sedentarismo e na afirmação das modalidades, em especial, além do futebol, mas queremos resultados quando nos confrontamos com que faz dessa aposta uma opção estratégica de valorização dos estilos de vida saudáveis e de práticas que concorrem para a formação de bons cidadãos, pelos valores, interações e exemplos que veiculam. O desporto tem o poder de transformar os cidadãos e as realidades, como já tive oportunidade de testemunhar em contextos complexos no programa Desperta no Desporto que em tempos o Governo Civil de Lisboa, em articulação com o Município de Loures, promoveu em freguesias do seu território ao abrigo de um Contrato Local de Segurança. Houve cidadãos tocados por dinâmicas positivas, com resultados de integração e de realização porque se investiu, mas não. Em Portugal, quer-se colher sem verdadeiramente semear, como se a sorte e os resultados não dessem muito trabalho e exigissem muito mais que os sacrifícios individuais e a perseverança das envolventes diretas. Em Portugal, desdenha-se da excecionalidade dos atletas apurados e dos resultados, como se as medalhas nascessem por geração espontânea. Nunca foi assim, ou melhor, talvez tenha sido pela existência de portugueses excecionais que contra as probabilidades de boa parte das nossas realidades na abordagem ao desporto, conseguem-se sobrepor às circunstâncias. E sendo certo que desde Carlos Lopes e Rosa Mota algumas coisas mudaram para melhor, o grosso da aposta estruturada na atividade desportiva, como prevenção em saúde e como afirmação de potencialidades desportivas é das últimas das listas de prioridades de um país com pouca visão estratégica e pensamento estruturado e muita preocupação com as respostas ao quotidiano, às emergências e aos interesses instalados. É preciso muito mais para podermos ser mais exigentes com quem foi a Paris e que não foi desta vez.

Podemos começar desde logo com o descalabro na saúde, que em parte vinha de trás, que não foi atalhado pelo atual governo e que tem de suscitar uma exigência e clamor nacional sem igual.

Em 2024, mais de 50 anos depois da implantação do regime democrático, não posso aceitar que uma grávida de Leiria tenha de ter de ir ao Porto ter um nascituro ou que uma grávida com um nado morto tenha de mendigar para ser atendida no Hospital de Caldas da Rainha. É abaixo de humano, de civilizacional e de mínimos de funcionamento de um Estado que é impulsionado para responder a cada vez mais, sem assegurar previamente os mínimos para a generalidade da população.

Aqui sim, é exigível mais exigência, na vida real ou no plano digital, mesmo amplamente distraídos pelas férias e pelo calor das circunstâncias de Verão.

O país precisa de cuidar de mínimos de acessibilidade a bens e serviços essenciais antes de querer abalançar-se a novas realidades exigências de modernidade, sob pena de ser um enorme fracasso no que importa, em tempo útil, apesar dos indicadores e dos resultados que acariciam os burocratas, mas deixam as pessoas pouco mais do que entregues a si próprias e às vicissitudes de um certo fatalismo das disponibilidades. Esperava-se pela natureza das narrativas vigentes e das alternativas, plenas de conforto nos funcionamentos e na facilidade das soluções para mitigar ou erradicar os problemas, por exemplo, no Serviço Nacional de Saúde, que as pessoas e o país não estivessem sujeitos à veraneante pandemia de encerramento de serviços de saúde por falta de profissionais. Esperava-se, porque o discurso da solução alternativa sempre foi mais próximo da facilidade do que da complexidade da situação e da construção de soluções. Em vez de tudo isso temos recorrentes situações que envergonham qualquer democrata português, transportando os cidadãos sem acesso aos cuidados para situações indignas de um Estado membro da União Europeia. Quem não percebe a gravidade da situação e a sangria que gera na consciência e coração de quem tem mínimos de compromisso com a democracia, o desenvolvimento e a coesão, está próximo de não perceber nada. Pode continuar a exigir medalhas de ouro em Paris, quando tem de exigir mais investimento na atividade física e no desporto, mas sobretudo serviços básicos fundamentais de proximidade, em tempo útil.

Urge mais exigência no tempo e no sítio certo.

NOTAS FINAIS

RIDÍCULO PAN. A espiral esotérica e pós-moderna é geradora de prioridades inacreditáveis. O PAN, num momento em que os portugueses se confrontam com tantas dificuldades, também no acesso aos serviços do Estado, resolveu priorizar a apresentação de uma resolução no parlamento português em defesa da colónia de gatinhos do Palácio de São Bento. Esta gente não se toca. Não tem noção institucional mínima das funções que desempenha e do que deve ser a sua missão de acordo com uma visão integrada do país?

PETRIFICADO PCP. Depois da União Europeia, da Nato e da Ucrânia, o PCP não hesitou em dar cobertura a visões retrógradas e desfasadas, até contestadas pelos comunistas venezuelanos, mais conhecedores da realidade do um qualquer Comité Central. O PCP, por compromisso ideológico, deu cobertura aos desmandos antidemocráticos e à fraude do regime de Maduro. E pensar que é com esta gente que o atual PS quer conversar sobre autárquicas.

A exigência no sítio errado


O país está pejado de exigências com a participação dos atletas portugueses nos jogos olímpicos de Paris, mas mantêm uma inusitada tolerância com falhas graves do funcionamento do Estado.


Em férias na tranquilidade de Almograve, em Odemira, no Baixo Alentejo, não deixa de emergir uma enorme contradição nacional em torno da exigência com terceiros. Somos, por regra, pouco exigentes com nós próprios, mas não deixamos de exercitar com terceiros, na vida real ou nas redes sociais, um acréscimo de exigência em relação a terceiros, das dinâmicas da vida corrente aos mais complexos exercícios de cidadania e de organização das comunidades, onde também podemos integrar a atividade política, plena de treinadores de bancada.

O país está pejado de exigências com a participação dos atletas portugueses nos jogos olímpicos de Paris, mas mantêm uma inusitada tolerância com falhas graves do funcionamento do Estado e dos seus serviços, para os quais contribui de forma substancial quem trabalha, em especial por conta de outrem.

A participação de Portugal nos Jogos Olímpicos de Paris, não é mais nem menos do que o reflexo do investimento que é feito na promoção da atividade física e das modalidades desportivas. Investimos muito pouco no combate ao sedentarismo e na afirmação das modalidades, em especial, além do futebol, mas queremos resultados quando nos confrontamos com que faz dessa aposta uma opção estratégica de valorização dos estilos de vida saudáveis e de práticas que concorrem para a formação de bons cidadãos, pelos valores, interações e exemplos que veiculam. O desporto tem o poder de transformar os cidadãos e as realidades, como já tive oportunidade de testemunhar em contextos complexos no programa Desperta no Desporto que em tempos o Governo Civil de Lisboa, em articulação com o Município de Loures, promoveu em freguesias do seu território ao abrigo de um Contrato Local de Segurança. Houve cidadãos tocados por dinâmicas positivas, com resultados de integração e de realização porque se investiu, mas não. Em Portugal, quer-se colher sem verdadeiramente semear, como se a sorte e os resultados não dessem muito trabalho e exigissem muito mais que os sacrifícios individuais e a perseverança das envolventes diretas. Em Portugal, desdenha-se da excecionalidade dos atletas apurados e dos resultados, como se as medalhas nascessem por geração espontânea. Nunca foi assim, ou melhor, talvez tenha sido pela existência de portugueses excecionais que contra as probabilidades de boa parte das nossas realidades na abordagem ao desporto, conseguem-se sobrepor às circunstâncias. E sendo certo que desde Carlos Lopes e Rosa Mota algumas coisas mudaram para melhor, o grosso da aposta estruturada na atividade desportiva, como prevenção em saúde e como afirmação de potencialidades desportivas é das últimas das listas de prioridades de um país com pouca visão estratégica e pensamento estruturado e muita preocupação com as respostas ao quotidiano, às emergências e aos interesses instalados. É preciso muito mais para podermos ser mais exigentes com quem foi a Paris e que não foi desta vez.

Podemos começar desde logo com o descalabro na saúde, que em parte vinha de trás, que não foi atalhado pelo atual governo e que tem de suscitar uma exigência e clamor nacional sem igual.

Em 2024, mais de 50 anos depois da implantação do regime democrático, não posso aceitar que uma grávida de Leiria tenha de ter de ir ao Porto ter um nascituro ou que uma grávida com um nado morto tenha de mendigar para ser atendida no Hospital de Caldas da Rainha. É abaixo de humano, de civilizacional e de mínimos de funcionamento de um Estado que é impulsionado para responder a cada vez mais, sem assegurar previamente os mínimos para a generalidade da população.

Aqui sim, é exigível mais exigência, na vida real ou no plano digital, mesmo amplamente distraídos pelas férias e pelo calor das circunstâncias de Verão.

O país precisa de cuidar de mínimos de acessibilidade a bens e serviços essenciais antes de querer abalançar-se a novas realidades exigências de modernidade, sob pena de ser um enorme fracasso no que importa, em tempo útil, apesar dos indicadores e dos resultados que acariciam os burocratas, mas deixam as pessoas pouco mais do que entregues a si próprias e às vicissitudes de um certo fatalismo das disponibilidades. Esperava-se pela natureza das narrativas vigentes e das alternativas, plenas de conforto nos funcionamentos e na facilidade das soluções para mitigar ou erradicar os problemas, por exemplo, no Serviço Nacional de Saúde, que as pessoas e o país não estivessem sujeitos à veraneante pandemia de encerramento de serviços de saúde por falta de profissionais. Esperava-se, porque o discurso da solução alternativa sempre foi mais próximo da facilidade do que da complexidade da situação e da construção de soluções. Em vez de tudo isso temos recorrentes situações que envergonham qualquer democrata português, transportando os cidadãos sem acesso aos cuidados para situações indignas de um Estado membro da União Europeia. Quem não percebe a gravidade da situação e a sangria que gera na consciência e coração de quem tem mínimos de compromisso com a democracia, o desenvolvimento e a coesão, está próximo de não perceber nada. Pode continuar a exigir medalhas de ouro em Paris, quando tem de exigir mais investimento na atividade física e no desporto, mas sobretudo serviços básicos fundamentais de proximidade, em tempo útil.

Urge mais exigência no tempo e no sítio certo.

NOTAS FINAIS

RIDÍCULO PAN. A espiral esotérica e pós-moderna é geradora de prioridades inacreditáveis. O PAN, num momento em que os portugueses se confrontam com tantas dificuldades, também no acesso aos serviços do Estado, resolveu priorizar a apresentação de uma resolução no parlamento português em defesa da colónia de gatinhos do Palácio de São Bento. Esta gente não se toca. Não tem noção institucional mínima das funções que desempenha e do que deve ser a sua missão de acordo com uma visão integrada do país?

PETRIFICADO PCP. Depois da União Europeia, da Nato e da Ucrânia, o PCP não hesitou em dar cobertura a visões retrógradas e desfasadas, até contestadas pelos comunistas venezuelanos, mais conhecedores da realidade do um qualquer Comité Central. O PCP, por compromisso ideológico, deu cobertura aos desmandos antidemocráticos e à fraude do regime de Maduro. E pensar que é com esta gente que o atual PS quer conversar sobre autárquicas.