Venezuela: Em política, o que parece, é.


Em política, usamos muito uma máxima bem portuguesa com particular clareza: “O que parece, é.” Esta frase ganha um novo significado ao olharmos para as recentes eleições na Venezuela, onde Nicolás Maduro foi reeleito sob um véu de controvérsia e suspeita de fraude.


Segundo os dados divulgados, Maduro obteve 51,2% dos votos contra os 44,2% do principal candidato da oposição, Edmundo Gonzalez Urrutia. O anúncio dos resultados foi feito após um atraso de seis horas, com o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela a atribuir o atraso a um ataque ao sistema de transmissão de dados.

A oposição, liderada à cabeça por Maria Corina Machado, contestou veementemente os resultados, afirmando que Gonzalez Urrutia é o verdadeiro vencedor. Este cenário não é novo na Venezuela, onde a desconfiança nas instituições eleitorais é profunda e bem fundamentada por décadas de descrédito. A comunidade internacional tem insistido na necessidade de transparência, exigindo a publicação das atas eleitorais, que ainda não foram apresentadas.

Enquanto isso, nas ruas da Venezuela, a realidade é sombria. As longas filas para comprar alimentos básicos, a escassez de medicamentos e o aumento da criminalidade são um reflexo de uma nação em crise. O salário mínimo na Venezuela é de cerca de 4 euros por mês, uma quantia irrisória comparada com outros países da América do Sul. Na Colômbia, o salário mínimo é de aproximadamente 243 euros por mês; no Chile, cerca de 450 euros por mês; e na Argentina, cerca de 285 euros por mês. O Brasil tem cerca de 240 euros por mês. Estes números evidenciam a grave situação económica da Venezuela e a dificuldade extrema que os seus cidadãos enfrentam para sobreviver. Neste cenário, os nossos poucos 820 euros em Portugal até parecem significativos… só que não. Esta disparidade reflete a extrema pobreza e dificuldades que os venezuelanos enfrentam diariamente. A desconfiança nos resultados eleitorais não só aprofunda a divisão política, mas também alimenta um clima de insegurança e desesperança entre os cidadãos. A perceção de fraude eleitoral e manipulação política gera um ambiente onde a lei e a ordem são constantemente desafiadas.

A frase “o que parece, é” aplica-se dolorosamente bem neste país da América do Sul. Para muitos, Maduro parece não ter ganho de forma justa, e esta perceção é poderosa. Quando a confiança nas eleições é corroída, a própria essência da democracia é posta em causa. E na Venezuela, onde a insegurança reina, a confiança no sistema é um luxo que poucos podem se dar ao luxo de ter.

Nas esquinas de Caracas, a tristeza é palpável. A insegurança causada pelo descrédito nos resultados políticos transforma-se em medo diário. Histórias de violência e de famílias separadas pela necessidade de emigrar em busca de um futuro melhor são comuns. Este ambiente de desconfiança e incerteza afeta todas as camadas da sociedade, desde o trabalhador comum até o empresário.

Este fenómeno não é exclusivo da Venezuela. Em várias partes do mundo, temos visto como a manipulação da perceção pública pode minar a confiança nas instituições democráticas. Nos Estados Unidos, a suspeição de fraude eleitoral nas eleições de 2020 levou a um ataque ao Capitólio, numa tentativa de reverter os resultados reconhecidos internacionalmente. No Brasil, as eleições de 2022 foram marcadas por desinformação e acusações infundadas de manipulação eleitoral. Na Rússia, as eleições são frequentemente criticadas por falta de transparência e repressão à oposição, com Vladimir Putin mantendo-se no poder através de reformas constitucionais controversas e resultados eleitorais questionáveis. A política tornou-se um teatro onde a aparência muitas vezes supera a realidade. E, num ambiente onde a desinformação é uma arma poderosa, o que parece, acaba por ser aceite como verdade. É crucial, portanto, que os líderes mundiais e as instituições internacionais mantenham a pressão sobre o governo venezuelano para garantir transparência e justiça. A democracia não pode sobreviver apenas de aparências; necessita de substância, de veracidade e de confiança pública. A desconfiança generalizada nos processos eleitorais e a insegurança crescente são venenos lentos que corroem a estrutura social de qualquer país.

Uma nota de lamento. É vergonhoso observar o Partido Comunista Português (PCP) felicitar Nicolás Maduro pela sua controversa reeleição, enquanto o próprio Partido Comunista Venezuelano (PCV) se distancia das ações de Maduro e questiona a legitimidade do processo eleitoral. O PCV tem criticado abertamente o regime de Maduro, denunciando a repressão e a falta de transparência nas eleições. Esta divergência entre o apoio do PCP e a condenação do PCV destaca a desconexão e o desrespeito pelos princípios democráticos, evidenciando uma falta de solidariedade real com o povo venezuelano que sofre diariamente as consequências de um governo autoritário e corrupto. O PCP falhou com o povo venezuelano por capricho ideológico bacoco que, não deixa de ser irónico, acaba por ser desmentido e criticado pelos seus próprios camaradas comunistas venezuelanos…

Ao observarmos a situação na Venezuela, somos forçados a recordar ou pelo menos pensar na sorte que temos em Portugal de confiarmos nos resultados expressos em urna, em podermos votar sabendo que o resultado será mesmo aquele que todos vão reconhecer publicamente. A importância de eleições livres e justas, da necessidade de transparência e da urgência de restaurar a confiança nas instituições democráticas é vital. Porque, no final do dia, em política, o que parece, muitas vezes, é.

Carlos Gouveia Martins


Venezuela: Em política, o que parece, é.


Em política, usamos muito uma máxima bem portuguesa com particular clareza: “O que parece, é.” Esta frase ganha um novo significado ao olharmos para as recentes eleições na Venezuela, onde Nicolás Maduro foi reeleito sob um véu de controvérsia e suspeita de fraude.


Segundo os dados divulgados, Maduro obteve 51,2% dos votos contra os 44,2% do principal candidato da oposição, Edmundo Gonzalez Urrutia. O anúncio dos resultados foi feito após um atraso de seis horas, com o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela a atribuir o atraso a um ataque ao sistema de transmissão de dados.

A oposição, liderada à cabeça por Maria Corina Machado, contestou veementemente os resultados, afirmando que Gonzalez Urrutia é o verdadeiro vencedor. Este cenário não é novo na Venezuela, onde a desconfiança nas instituições eleitorais é profunda e bem fundamentada por décadas de descrédito. A comunidade internacional tem insistido na necessidade de transparência, exigindo a publicação das atas eleitorais, que ainda não foram apresentadas.

Enquanto isso, nas ruas da Venezuela, a realidade é sombria. As longas filas para comprar alimentos básicos, a escassez de medicamentos e o aumento da criminalidade são um reflexo de uma nação em crise. O salário mínimo na Venezuela é de cerca de 4 euros por mês, uma quantia irrisória comparada com outros países da América do Sul. Na Colômbia, o salário mínimo é de aproximadamente 243 euros por mês; no Chile, cerca de 450 euros por mês; e na Argentina, cerca de 285 euros por mês. O Brasil tem cerca de 240 euros por mês. Estes números evidenciam a grave situação económica da Venezuela e a dificuldade extrema que os seus cidadãos enfrentam para sobreviver. Neste cenário, os nossos poucos 820 euros em Portugal até parecem significativos… só que não. Esta disparidade reflete a extrema pobreza e dificuldades que os venezuelanos enfrentam diariamente. A desconfiança nos resultados eleitorais não só aprofunda a divisão política, mas também alimenta um clima de insegurança e desesperança entre os cidadãos. A perceção de fraude eleitoral e manipulação política gera um ambiente onde a lei e a ordem são constantemente desafiadas.

A frase “o que parece, é” aplica-se dolorosamente bem neste país da América do Sul. Para muitos, Maduro parece não ter ganho de forma justa, e esta perceção é poderosa. Quando a confiança nas eleições é corroída, a própria essência da democracia é posta em causa. E na Venezuela, onde a insegurança reina, a confiança no sistema é um luxo que poucos podem se dar ao luxo de ter.

Nas esquinas de Caracas, a tristeza é palpável. A insegurança causada pelo descrédito nos resultados políticos transforma-se em medo diário. Histórias de violência e de famílias separadas pela necessidade de emigrar em busca de um futuro melhor são comuns. Este ambiente de desconfiança e incerteza afeta todas as camadas da sociedade, desde o trabalhador comum até o empresário.

Este fenómeno não é exclusivo da Venezuela. Em várias partes do mundo, temos visto como a manipulação da perceção pública pode minar a confiança nas instituições democráticas. Nos Estados Unidos, a suspeição de fraude eleitoral nas eleições de 2020 levou a um ataque ao Capitólio, numa tentativa de reverter os resultados reconhecidos internacionalmente. No Brasil, as eleições de 2022 foram marcadas por desinformação e acusações infundadas de manipulação eleitoral. Na Rússia, as eleições são frequentemente criticadas por falta de transparência e repressão à oposição, com Vladimir Putin mantendo-se no poder através de reformas constitucionais controversas e resultados eleitorais questionáveis. A política tornou-se um teatro onde a aparência muitas vezes supera a realidade. E, num ambiente onde a desinformação é uma arma poderosa, o que parece, acaba por ser aceite como verdade. É crucial, portanto, que os líderes mundiais e as instituições internacionais mantenham a pressão sobre o governo venezuelano para garantir transparência e justiça. A democracia não pode sobreviver apenas de aparências; necessita de substância, de veracidade e de confiança pública. A desconfiança generalizada nos processos eleitorais e a insegurança crescente são venenos lentos que corroem a estrutura social de qualquer país.

Uma nota de lamento. É vergonhoso observar o Partido Comunista Português (PCP) felicitar Nicolás Maduro pela sua controversa reeleição, enquanto o próprio Partido Comunista Venezuelano (PCV) se distancia das ações de Maduro e questiona a legitimidade do processo eleitoral. O PCV tem criticado abertamente o regime de Maduro, denunciando a repressão e a falta de transparência nas eleições. Esta divergência entre o apoio do PCP e a condenação do PCV destaca a desconexão e o desrespeito pelos princípios democráticos, evidenciando uma falta de solidariedade real com o povo venezuelano que sofre diariamente as consequências de um governo autoritário e corrupto. O PCP falhou com o povo venezuelano por capricho ideológico bacoco que, não deixa de ser irónico, acaba por ser desmentido e criticado pelos seus próprios camaradas comunistas venezuelanos…

Ao observarmos a situação na Venezuela, somos forçados a recordar ou pelo menos pensar na sorte que temos em Portugal de confiarmos nos resultados expressos em urna, em podermos votar sabendo que o resultado será mesmo aquele que todos vão reconhecer publicamente. A importância de eleições livres e justas, da necessidade de transparência e da urgência de restaurar a confiança nas instituições democráticas é vital. Porque, no final do dia, em política, o que parece, muitas vezes, é.

Carlos Gouveia Martins