O Verão do meu descontentamento


O mundo mudou, o jornalismo mudou, não quero olhar para mim mesmo como um velho dinossauro que se agarra a um universo que deixou de existir.


FRANKFURT –  É cansativo este Verão alemão que não aquece nem arrefece, ou aquece e arrefece de um dia para o outro, com chuva e relâmpagos à mistura. Já passou muito tempo desde o meu primeiro Campeonato da Europa, em 1996, quando caminhei para Inglaterra com a responsabilidade de ser enviado-especial de A Bola num tempo ainda de grandes mestres que fizeram o favor de me ensinar. Olho para a frente e pergunto-me até quando continuarei nesta luta de correr atrás de Portugal pelos estádios de todo o mundo como tem acontecido desde então. Algum dia chegará o momento de parar e ele aproxima-se a uma velocidade que não controlo. O Inverno do Nosso Descontentamento é um extraordinário livro de Jonh Steinbeck que anda à espera da minha re-leitura. O título foi tirado de uma frase de Shakespeare em Ricardo III – “Agora é o Inverno do Nosso Descontentamento, transformado em glorioso Verão por este sol de York”. Ainda não se sabe se William quis escrever “sun” ou “son”. Para mim, pouco importa. Penso apenas que este é, provavelmente, o Verão do meu descontentamento, sei lá ainda se o último Europeu da minha escrita desacertada. O mundo mudou, o jornalismo mudou, não quero olhar para mim mesmo como um velho dinossauro que se agarra a um universo que deixou de existir. Quatro anos são muitos anos, mas amanhã é já amanhã. Talvez acorde com a noção de que deixei de fazer a diferença, se alguma vez a fiz. Desculpem a melancolia, mas é do céu cinzento que ocupa todo o meu olhar, de horizonte a horizonte. É deste Inverno que resolveu tomar conta do que deveria ser Verão. E, simultaneamente, desta sensação estranha de ser avô e descobrir novas estradas para amar. Mas ainda há a chama. A paixão da crónica acima da vaga espuma das ondas do dia a dia, informação gratuita e multiplicada até ao infinito. Talvez me tenha calhado o Destino de escrever para sempre. Se calhou, aceito-o como uma dádiva.

afonso.melo@ionline.pt

O Verão do meu descontentamento


O mundo mudou, o jornalismo mudou, não quero olhar para mim mesmo como um velho dinossauro que se agarra a um universo que deixou de existir.


FRANKFURT –  É cansativo este Verão alemão que não aquece nem arrefece, ou aquece e arrefece de um dia para o outro, com chuva e relâmpagos à mistura. Já passou muito tempo desde o meu primeiro Campeonato da Europa, em 1996, quando caminhei para Inglaterra com a responsabilidade de ser enviado-especial de A Bola num tempo ainda de grandes mestres que fizeram o favor de me ensinar. Olho para a frente e pergunto-me até quando continuarei nesta luta de correr atrás de Portugal pelos estádios de todo o mundo como tem acontecido desde então. Algum dia chegará o momento de parar e ele aproxima-se a uma velocidade que não controlo. O Inverno do Nosso Descontentamento é um extraordinário livro de Jonh Steinbeck que anda à espera da minha re-leitura. O título foi tirado de uma frase de Shakespeare em Ricardo III – “Agora é o Inverno do Nosso Descontentamento, transformado em glorioso Verão por este sol de York”. Ainda não se sabe se William quis escrever “sun” ou “son”. Para mim, pouco importa. Penso apenas que este é, provavelmente, o Verão do meu descontentamento, sei lá ainda se o último Europeu da minha escrita desacertada. O mundo mudou, o jornalismo mudou, não quero olhar para mim mesmo como um velho dinossauro que se agarra a um universo que deixou de existir. Quatro anos são muitos anos, mas amanhã é já amanhã. Talvez acorde com a noção de que deixei de fazer a diferença, se alguma vez a fiz. Desculpem a melancolia, mas é do céu cinzento que ocupa todo o meu olhar, de horizonte a horizonte. É deste Inverno que resolveu tomar conta do que deveria ser Verão. E, simultaneamente, desta sensação estranha de ser avô e descobrir novas estradas para amar. Mas ainda há a chama. A paixão da crónica acima da vaga espuma das ondas do dia a dia, informação gratuita e multiplicada até ao infinito. Talvez me tenha calhado o Destino de escrever para sempre. Se calhou, aceito-o como uma dádiva.

afonso.melo@ionline.pt