A prioridade máxima da PSP, neste momento, é formar polícias que possam ser destacados para a nova Unidade de Estrangeiros e Fronteiras, que “funcionará na dependência da já existente Unidade Orgânica de Segurança Aeroportuária e Controlo de Fronteiras”, até para poder controlar melhor o fluxo migratório. Tanto assim é que dos 480 alunos que terminarão o curso a 2 de julho – segundo fontes diferentes serão só 400 – 170 têm o carimbo para se apresentar nos aeroportos nacionais, embora antes tenham de fazer um curso de especialização. O problema é que antes dessa prioridade máxima há outra que está intimamente ligada, que é o acordo entre o Governo e a Plataforma, que representa os sindicatos da PSP e as associações socioprofissionais da GNR, no que diz respeito ao famoso subsídio de missão ou de risco, como se queira dizer.
Se é verdade que muito barulho se fez antes das eleições legislativas de 10 de março – chegou mesmo a existir um boicote de muitos polícias em se deslocarem para ocorrências em carros com anomalias, isto para não falar nas mega-manifestações de protesto -, com os polícias e militares da GNR a exigirem um suplemento equivalente ao da Polícia Judiciária e dos serviços secretos, que, na maioria dos casos, andará pelos 1026 euros.
Prometendo lutas sem fim se o novo Executivo não se aproximasse dos 1026 euros, alguns dos sindicatos da Plataforma foram mudando de posição, assim que se perceberam que é praticamente impossível o Governo chegar a tal verba, diga-se que há muitos agentes que duplicariam o ordenado, e estamos a falar de duas instituições que acolhem mais de 40 mil homens. E é aqui que a Plataforma se divide mais do que o Muro de Berlim separava as duas Alemanhas: a ASPP, o principal sindicato da PSP, e o SNOP, o dos oficiais com pedigree, leia-se formados na antiga Escola Superior de Polícia, e no atual Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna – os da carreira de base que chegaram a oficiais não podem inscrever-se neste sindicato -, o SIAP e o SNCC, dos chefes – bem como as associações socioprofissionais da GNR, com a exceção da dos oficias que não integra a Plataforma – estão sensíveis aos argumentos do Governo, Banco de Portugal e de Bruxelas, de que não há dinheiro para cobrir a proposta dos 1026 euros. Exigem, por isso, 400 euros para todos, até 2026. Acontece que o Governo tem avançado com 300, 200 já este ano e 50 no próximo e mais 50 em 2026. Como é que as duas propostas se vão encontrar? Ao que o i apurou de fonte ligada ao processo, a ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, quando se voltar a reunir com a Plataforma, terá vários trunfos para apresentar – benefícios sociais, acesso a habitação, progressão mais rápida nas carreiras, etc. – sendo que o principal argumento deverá passar pela diminuição dos impostos, o que irá aproximar as ‘regalias’ com os 400 euros pretendidos por estes sindicatos ainda unidos na Plataforma. Isto é: os polícias vão perceber no recibo de vencimento que foi depositado mais dinheiro… E escrevemos “ainda unidos” porque tudo muda na luta sindical da PSP de um momento para o outro… “Para quem ganha 900 e pouco euros, um aumento de 200 já no imediato é muito considerável. Além de que os futuros agentes poderão concorrer à sua zona de residência, o que lhes diminuirá em muito as despesas de habitação”, explica outro sindicalista.
Já para Paulo Santos, líder da ASPP, a história é simples: é preciso fazer uma nova reunião suplementar com a ministra onde o seu sindicato irá ser claro: “Vamos apresentarmo-nos na reunião com a senhora ministra com os 400 euros de proposta. Na nossa opinião, tem de ser por via dos aumentos salariais, ou deduções fiscais, algo que seja mesmo concretizável. Se tiver alguma proposta que não passe pelo aumento do suplemento de missão, mas passe por aumentos salariais e por complementos remuneratórios, nós estamos disponíveis para assinar. Fora disso não estamos”.
Os três do contra Fazendo parte da Plataforma, mas totalmente contra que se aceite um subsídio ou suplemento inferior a 1026 euros, estão os seguintes sindicatos: SPP, SINAPOL e ASAPOL, que, juntos, não deverão chegar aos quatro mil associados – só a ASPP representa cerca de oito mil. Para os três sindicatos mais contestatários, o Governo tem de atribuir um suplemento de missão que seja 20% do salário do diretor nacional da PSP, daí os 1026 euros – na PJ é 15% do diretor nacional, que andará pelos seis mil e poucos euros, isto sem o subsídio…
O SPP há uma semana chegou mesmo a fazer um comunicado onde justificava a sua intransigência em relação aos 1026 euros de aumento: “Só assim é possível garantir a justiça que todos os polícias recebam um valor igual de suplemento de missão, independentemente da antiguidade ou categoria hierárquica, pois a vida, risco, penosidade e insalubridade e respetivos ónus agregados à profissão, não se medem pela antiguidade ou categoria hierárquica”.
Se o Governo conseguir que a ASPP, o SNOP, o SIAP, o SNCC e as associações socioprofissionais da GNR assinem o acordo, os outros três sindicatos da PSP ficarão um pouco isolados. Mas aí poderão entrar os movimentos inorgânicos, com o apoio, declarado ou não, do SPP, SINAPOL e ASAPOL que poderão transformar as ruas de Lisboa e do Porto palco de grandes manifestações de polícias contra polícias, havendo até quem acredite numa reedição dos secos e molhados, como aconteceu há 35 anos na Praça do Comércio.
Certo é que se o Governo não conseguir o apoio dos principais sindicatos, então estarão todos, de novo, unidos nos protestos, embora agora as divisões entre eles sejam mais evidentes do que no ano passado.
“É óbvio que o Governo sabe que estamos em tempo de férias e as mobilizações contestatárias são sempre mais difíceis de acontecer”, explica ao i outro sindicalista.
A falta de polícias Voltemos então ao início do texto e às prioridades máximas da PSP: reforçar a segurança nos aeroportos, e tudo o que tenha a ver com a Unidade de Estrangeiros e Fronteiras. “Neste momento, o que interessa é proteger os aeroportos. Faltam polícias em Bragança? Paciência, é preciso fazer mais um esforço”, é desta forma irónica que fonte policial explica a opção pela Unidade de Estrangeiros e Fronteiras.
Em 4 de dezembro de 2023 começaram o curso de formação de agentes 537 homens e mulheres, isto depois de muitos terem sido chumbados nas provas de acesso, além daqueles que desistiram antes do início do curso. A 2 de julho do corrente ano estes candidatos estarão prontos para tratar da segurança das cidades, mas dos 537 só restam 400 ou 480, os números diferem segundo as fontes contactadas. Mas poderá haver uma explicação para esse desencontro: “Muitos candidatos optam, no final, por não desistir pois teriam que indemnizar o Estado, escolhendo antes chumbar, até porque devem ter outro emprego mais atrativo à sua espera”, explica um oficial da PSP.
Segundo o site oficial da Escola Prática de Polícia, para o novo curso, que deverá arrancar em setembro, se houver dinheiro para isso, estão apurados 1900 candidatos, sendo que outros 900 não foram admitidos ou desistiram. Por incrível que pareça, entre os ‘eliminados’ há objetores de consciência. “É um sinal dos tempos. Muitos nem devem saber o que quer dizer objeção de consciência. Em tempos tivemos candidatos Testemunhas de Jeová que queriam andar desarmados. Tivemos que lhes explicar que dessa forma podiam colocar em causa a vida do seu colega de patrulha ou mesmo da população em geral”, acrescenta outro oficial. Ah! A Escola Prática de Polícia em cada curso só pode receber mil candidatos, mas é previsível que dos 1900 admitidos a concurso muitos deles optem por outras paragens antes de setembro, pois muitos deles concorrem a várias instituições ao mesmo tempo, desde a GNR, à PJ e mesmo à segurança privada.
Com Maria Moreira Rato