Quatro mil e dez mil votos, foi o que salvou a CDU e o BE, respetivamente, na noite das eleições europeias, segundo o método de Hontd. Foi, pois, natural que os dois partidos tivessem retardado o canto da ‘vitória’, nas suas palavras, quando já muitos esperavam uma derrota total. O PS elegeu o seu primeiro deputado com 158 mil votos e o BE alcançou esse número já a noite eleitoral ia longa, tendo ficado nos 168 mil votos. Já a CDU conseguiu eleger João Oliveira por ter atingido 162.731, os tais quatro mil votos a mais do que o primeiro deputado do PS. Continuando no mesmo campeonato, o Livre ficou a dez mil votos de levar para Bruxelas Francisco Paupério.
Falemos então do vencedor. O PS ganhou, pois ficou em primeiro lugar, tirando a ‘la paliçada’, conseguindo mais de cento e cinquenta mil votos em relação a 2019, mas perdeu um deputado. Se quisermos comparar com as legislativas, então constatamos que os socialistas de Marta Temido viram fugir mais de 500 mil votos. Já a AD de Sebastião Bugalho, que ficou em 2.º, conseguiu mais de 300 mil votos em relação a 2019, e perdeu mais de 600 mil no que diz respeito à comparação com as últimas legislativas. Nestas equações é necessário olhar para a abstenção: em 2024 votaram mais 600 mil pessoas do que em 2019.
Uma derrota é o contrário de uma vitória, como diria Lili Caneças, mas com a subida/aparecimento do Chega nas europeias e da Iniciativa Liberal, a AD tinha muito para sofrer em relação a 2019. O Chega, que só se pode comparar com as legislativas, viu fugir mais de 780 mil votos – curiosamente nas últimas eleições para o Parlamento nacional houve mais 750 mil eleitores a votar do que em relação a 2022… O candidato escolhido foi um desastre em toda a linha. Já a Iniciativa Liberal, com Cotrim Figueiredo, ganhou mais de 300 mil votos em relação a 2019, e, se compararmos com as legislativas, conseguiu mais de 37 mil votos – e convém não esquecer que houve menos de dois milhões e quinhentos mil votantes, o que reforça a ideia de que a IL ganha muito com Cotrim Figueiredo, o galã da política portuguesa, com o seu ar de ator de Hollywood de filmes dos anos 60. Foi o único partido que ganhou em toda a linha, se compararmos com o passado. E aqui é ainda preciso reforçar que o suposto voto útil nas eleições legislativas desapareceu nas europeias, com a Iniciativa Liberal a ‘roubar’ muitos dos votos da AD das legislativas. Muito se fala do efeito Cotrim Figueiredo, mas os números não mentem. Se a AD perdeu 600 mil votos e a Iniciativa Liberal conseguiu aumentar a sua votação em relação a março do corrente ano, as contas são fáceis de fazer…
O grande derrotado das europeias
O Chega, que se apresentou com um candidato que fazia lembrar o tio ‘divertido’ das festas de Natal, que diz uns disparates que todos perdoam, mas ninguém leva a sério, perdeu em toda a linha. Muito se fala que o partido é de um homem só, e o mesmo ficou confirmado na eleição de 9 de junho. Vejamos os números: nas legislativas de 10 de março, a abstenção desceu drasticamente, tendo ir votar mais de 750 mil eleitores em relação às de 2022, quando o chumbo do Orçamento por parte do BE e do PCP levou Marcelo Rebelo de Sousa a convocar eleições antecipadas, apesar do PS ter uma maioria absoluta confortável. A 10 de março, o partido de André Ventura convenceu 1.169.469 de eleitores a colocarem a cruz no espaço reservado ao Chega, passando de 12 deputados para 50. Comparando com as europeias, o Chega viu fugir mais de 780 mil votos. Para se ter uma ideia, em Lisboa, o Chega perdeu em 90 dias – de 10 de março a 9 de junho – mais de 138 mil votos. De 224 mil passou para 85 mil… Já no Porto, as contas não são muito diferentes, dos quase 171 mil votos passou para 52 mil. Mas onde as contas são mais reveladoras, e não estamos a falar de números absolutos, é no Algarve. Se nas legislativas de 2024 o Chega tinha ficado em primeiro lugar em seis concelhos, nas europeias passou para terceiro e mesmo para quarto, em todo o distrito. Há quem diga que o Chega terá uma morte rápida, mas parece manifestamente prematuro anunciar o fim do partido de um homem chamado André Ventura. Os abstencionistas podem sempre acordar de novo. Ah! No Algarve, há um dado curioso: em Aljezur e Vila do Bispo houve mais pessoas a votar nas europeias do que nas legislativas.
O afundanço da esquerda
O BE, à semelhança do PCP, como já foi dito no início do texto, conseguiu eleger um deputado por uma unha negra, percebendo-se a euforia de ambos. Mas olhando para os números vê-se que o partido de Catarina Martins perdeu mais de 157 mil votos comparando com 2019. Em relação às legislativas, foram menos 114 mil. O PCP que também não pára de descer, perdeu 60 mil votos quando comparado com 2019, e 42 mil no que diz respeito às legislativas.
O PAN perdeu mais de 120 mil votos quando comparado com 2019 e 78 mil em relação às legislativas. Fenómeno curioso é do candidato do Livre, que concorreu contra a vontade de Rui Tavares, mas que teve mais de 87 mil votos do que fundador do partido quando foi o cabeça de lista em 2019. Em relação às legislativas conseguiu menos 56 mil votos.
Estes são os resultados cristalinos como a água, já as leituras, algumas, entram no campo do delírio. João Oliveira e Catarina Martins falarem em vitória faz tanto sentido como o major-general Agostinho Costa dizer, em fevereiro de 2022, que a Rússia iria conquistar a Ucrânia em meia dúzia de dias.