A miséria continua, se é que não aumentou


A miséria continua, se é que não aumentou; e sobretudo, há cinquenta anos, esperava-se uma vida melhor para as novas gerações na maioria das famílias.  Hoje, os filhos têm a expectativa de uma vida mais difícil e pior do que a dos pais.  Os salários mínimos e médios são dos mais baixos da Europa.


Eu não tive muitas expectativas em relação ao 25 de Abril.  Para mim foi essencialmente um movimento corporativo, ditado, em parte, pelo cansaço, no Corpo de Oficiais, em relação à guerra. Um movimento com o qual o governo de Marcelo Caetano não soube lidar, ora concedendo, ora reprimindo, de forma indecisa, contraditória e pouco eficaz.

Para mim e para os que, nos anos sessenta, acreditávamos num projecto de nação plurirracial e pluricontinental, pela qual tinham combatido e morrido alguns dos nossos amigos, para os que éramos e somos, antes do mais, nacionalistas, o 25 de Abril foi o fim desse ideal, desse projecto, do que agora nos aparece como uma utopia.  Por isso não tínhamos muitas expectativas.

Mas o geral dos portugueses, que acreditaram na letra das promessas de Abril, esperavam, com o fim do regime autoritário e a chegada da democracia política, uma sociedade mais justa, uma vida melhor, para eles e para os seus filhos.  Cinquenta anos passados, não creio que devam estar muito contentes.

A miséria continua, se é que não aumentou; e sobretudo, há cinquenta anos, esperava-se uma vida melhor para as novas gerações na maioria das famílias.  Hoje, os filhos têm a expectativa de uma vida mais difícil e pior do que a dos pais.  Os salários mínimos e médios são dos mais baixos da Europa e os serviços públicos entraram em crise, mesmo o Serviço Nacional de Saúde, que chegou a ser das poucas excelências do país e do regime.

Não temos censura prévia, mas poucas vezes se viu uma tão grande uniformidade de opiniões em tudo o que tem alguma importância, em política externa ou interna.  E a dissidência, que dantes era interdita, continua a sê-lo, embora por processos mais sofisticados e sob a aparência de pluralidade.

Mas como, para o mal e para o bem, acabamos sempre por sofrer a influência da Europa, a nova vaga nacionalista, mais conservadora ou mais popular, já aí está e pode vir a trazer algum equilíbrio.

Quanto às novas gerações, não tenho idade nem procuração para falar por elas.  Mas, a julgar pelas indicações da sociologia eleitoral, creio que as novas gerações são mais livres da propaganda do regime e da sua influência, que é muito televisiva.  Vejo isso também pelo contacto que vou tendo, em termos pessoais.  Apesar dos dispositivos orwellianos que, com o aproximar do meio século do golpe militar, se concentram em pintar os horrores do regime e o PREC como um período revolucionário, heroico e generoso, vejo que muitos dos mais novos – pelo menos os que têm alguma independência – não se deixam enganar e são críticos.

Isso deixa-nos a nós, mais velhos, uma certa esperança, sobretudo aos que sempre procurámos preservar um juízo objectivo da História e das realidades das coisas e nunca nos importámos muito de ser uma minoria marginalizada.

 

Politólogo

A miséria continua, se é que não aumentou


A miséria continua, se é que não aumentou; e sobretudo, há cinquenta anos, esperava-se uma vida melhor para as novas gerações na maioria das famílias.  Hoje, os filhos têm a expectativa de uma vida mais difícil e pior do que a dos pais.  Os salários mínimos e médios são dos mais baixos da Europa.


Eu não tive muitas expectativas em relação ao 25 de Abril.  Para mim foi essencialmente um movimento corporativo, ditado, em parte, pelo cansaço, no Corpo de Oficiais, em relação à guerra. Um movimento com o qual o governo de Marcelo Caetano não soube lidar, ora concedendo, ora reprimindo, de forma indecisa, contraditória e pouco eficaz.

Para mim e para os que, nos anos sessenta, acreditávamos num projecto de nação plurirracial e pluricontinental, pela qual tinham combatido e morrido alguns dos nossos amigos, para os que éramos e somos, antes do mais, nacionalistas, o 25 de Abril foi o fim desse ideal, desse projecto, do que agora nos aparece como uma utopia.  Por isso não tínhamos muitas expectativas.

Mas o geral dos portugueses, que acreditaram na letra das promessas de Abril, esperavam, com o fim do regime autoritário e a chegada da democracia política, uma sociedade mais justa, uma vida melhor, para eles e para os seus filhos.  Cinquenta anos passados, não creio que devam estar muito contentes.

A miséria continua, se é que não aumentou; e sobretudo, há cinquenta anos, esperava-se uma vida melhor para as novas gerações na maioria das famílias.  Hoje, os filhos têm a expectativa de uma vida mais difícil e pior do que a dos pais.  Os salários mínimos e médios são dos mais baixos da Europa e os serviços públicos entraram em crise, mesmo o Serviço Nacional de Saúde, que chegou a ser das poucas excelências do país e do regime.

Não temos censura prévia, mas poucas vezes se viu uma tão grande uniformidade de opiniões em tudo o que tem alguma importância, em política externa ou interna.  E a dissidência, que dantes era interdita, continua a sê-lo, embora por processos mais sofisticados e sob a aparência de pluralidade.

Mas como, para o mal e para o bem, acabamos sempre por sofrer a influência da Europa, a nova vaga nacionalista, mais conservadora ou mais popular, já aí está e pode vir a trazer algum equilíbrio.

Quanto às novas gerações, não tenho idade nem procuração para falar por elas.  Mas, a julgar pelas indicações da sociologia eleitoral, creio que as novas gerações são mais livres da propaganda do regime e da sua influência, que é muito televisiva.  Vejo isso também pelo contacto que vou tendo, em termos pessoais.  Apesar dos dispositivos orwellianos que, com o aproximar do meio século do golpe militar, se concentram em pintar os horrores do regime e o PREC como um período revolucionário, heroico e generoso, vejo que muitos dos mais novos – pelo menos os que têm alguma independência – não se deixam enganar e são críticos.

Isso deixa-nos a nós, mais velhos, uma certa esperança, sobretudo aos que sempre procurámos preservar um juízo objectivo da História e das realidades das coisas e nunca nos importámos muito de ser uma minoria marginalizada.

 

Politólogo