A primeira tentação de Montenegro


Na altura ninguém imaginava o escândalo de suspeita de corrupção que derrubaria o Governo. Jamais o líder do PSD sonhara que o momento de cumprir as suas promessas ia chegar tão cedo.


Luís Montenegro tinha ascendido à liderança do PSD há pouco tempo quando, numa das suas primeiras intervenções, criticou o Governo socialista pelo valor do complemento solidário para idosos. Achei o reparo pouco oportuno, porque o executivo de António Costa se notabilizava precisamente por distribuir subsídios, ajudas e apoios, e pareceu-me que o PSD devia procurar outro caminho. Um complemento mais alto significava literalmente mais do mesmo. Na realidade, os papéis pareciam até inverter-se:_o PS, que tem fama de despesista e irresponsável, mostrava-se cauteloso; o PSD, que tem fama de insensível, mostrava-se reivindicativo e solidário. De certo modo compreende-se, Montenegro precisava de descolar-se dos tempos da troika e de Passos Coelho.

Sucede que na altura ninguém imaginava o escândalo de suspeita de corrupção que derrubaria o Governo. Jamais o líder do PSD sonhara que o momento de cumprir as suas promessas ia chegar tão cedo.

Mas o complemento solidário é apenas uma das muitas rubricas na longa lista de encargos do novo Governo. Há, evidentemente, as remunerações das polícias (GNR e PSP) para atualizar de imediato. Há os professores, que exigem recuperar o tempo de serviço. Os médicos, que é preciso fidelizar ao SNS. Os enfermeiros. As Forças Armadas, que não querem ficar para trás (o chefe do Estado-Maior-general já avisou que “a atualização das remunerações dos militares” é uma das “medidas urgentes”). E ainda os empresários e os particulares, que contam com a redução de impostos. Mesmo com as contas sólidas deixadas pela dupla Costa-Fernando Medina, onde se vai arranjar dinheiro para satisfazer toda a gente?

Por isso alguns economistas da área da direita, como Bagão Félix, vieram esclarecer que o excedente orçamental não é sinónimo de “cofres cheios”.

Com a vitória tangencial que deixa o Governo permanentemente na corda bamba, Montenegro tenderá a apostar tudo nestes primeiros meses, para ver se conquista os portugueses e obtém crédito para numas futuras eleições vencer por uma margem mais confortável. Mas não será difícil perceber que jamais conseguirá fazer o pleno. Por isso vai ter de resistir à tentação de agradar a todos. Vai ter de fazer escolhas. Sem dúvida hipotecar a sua credibilidade seria mais fatal do que deixar este ou aquele setor descontente.

A primeira tentação de Montenegro


Na altura ninguém imaginava o escândalo de suspeita de corrupção que derrubaria o Governo. Jamais o líder do PSD sonhara que o momento de cumprir as suas promessas ia chegar tão cedo.


Luís Montenegro tinha ascendido à liderança do PSD há pouco tempo quando, numa das suas primeiras intervenções, criticou o Governo socialista pelo valor do complemento solidário para idosos. Achei o reparo pouco oportuno, porque o executivo de António Costa se notabilizava precisamente por distribuir subsídios, ajudas e apoios, e pareceu-me que o PSD devia procurar outro caminho. Um complemento mais alto significava literalmente mais do mesmo. Na realidade, os papéis pareciam até inverter-se:_o PS, que tem fama de despesista e irresponsável, mostrava-se cauteloso; o PSD, que tem fama de insensível, mostrava-se reivindicativo e solidário. De certo modo compreende-se, Montenegro precisava de descolar-se dos tempos da troika e de Passos Coelho.

Sucede que na altura ninguém imaginava o escândalo de suspeita de corrupção que derrubaria o Governo. Jamais o líder do PSD sonhara que o momento de cumprir as suas promessas ia chegar tão cedo.

Mas o complemento solidário é apenas uma das muitas rubricas na longa lista de encargos do novo Governo. Há, evidentemente, as remunerações das polícias (GNR e PSP) para atualizar de imediato. Há os professores, que exigem recuperar o tempo de serviço. Os médicos, que é preciso fidelizar ao SNS. Os enfermeiros. As Forças Armadas, que não querem ficar para trás (o chefe do Estado-Maior-general já avisou que “a atualização das remunerações dos militares” é uma das “medidas urgentes”). E ainda os empresários e os particulares, que contam com a redução de impostos. Mesmo com as contas sólidas deixadas pela dupla Costa-Fernando Medina, onde se vai arranjar dinheiro para satisfazer toda a gente?

Por isso alguns economistas da área da direita, como Bagão Félix, vieram esclarecer que o excedente orçamental não é sinónimo de “cofres cheios”.

Com a vitória tangencial que deixa o Governo permanentemente na corda bamba, Montenegro tenderá a apostar tudo nestes primeiros meses, para ver se conquista os portugueses e obtém crédito para numas futuras eleições vencer por uma margem mais confortável. Mas não será difícil perceber que jamais conseguirá fazer o pleno. Por isso vai ter de resistir à tentação de agradar a todos. Vai ter de fazer escolhas. Sem dúvida hipotecar a sua credibilidade seria mais fatal do que deixar este ou aquele setor descontente.