Neste momento em que escrevo, as diferentes oligarquias partidárias estão a escolher aqueles que serão os deputados da Nação para mais uma legislatura. No Partido Socialista essa escolha foi dividida entre dois dirigentes: Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro, de forma a fornecer a ambos os apoios amigos e dependentes que os sirvam nas suas ambições políticas e a grande família socialista nos seus interesses. Razão por que neste processo ninguém pensa em servir os portugueses, que não escolhem nada e não têm outro remédio senão aceitar os escolhidos pelos partidos como os seus falsos representantes. De facto, não podem escolher e nem mesmo recusar algum deputado conhecido por más razões, ou simplesmente corrupto. Ou algum deputado que conhecem bem demais. Não podem recusar ninguém e a única solução coerente é não votar o que, estou certo, é o que muitos portugueses acabarão, infelizmente, por fazer.
Não surpreende, portanto, que cerca de metade dos eleitores portugueses já não votem, o que é um direito perfeitamente compreensível, dado que o seu voto não serve para que a escolha recaia nos melhores, nos mais devotados na defesa do interesse nacional e nos mais qualificados para fazer as escolhas certas de que o País necessita. Como também não surpreende que exista um certo consenso na sociedade portuguesa de que a qualidade dos deputados portugueses tem vindo a regredir desde o 25 de Abril, ao ponto de termos hoje vergonha daquilo que muitos desses deputados fazem ou dizem. A corrupção é apenas um dos resultados desta entorse democrática, quase única na União Europeia., mas que a União Europeia conhece e critica como acaba de acontecer esta semana.
Dou um outro exemplo: qual a razão por que tantos deputados votaram recentemente o apoio a António Costa para prosseguir a estúpida decisão de construir uma linha ferroviária entre o Porto e Lisboa em bitola ibérica? Apenas para servir Pedro Nuno Santos, que anda há anos a defender os monopólios das empresas CP e Medway, longe da concorrência internacional, tornando Portugal numa ilha ferroviária, além de um país pária na União Europeia e em todo o Ocidente democrático, onde as políticas da concorrência são centrais na filosofia económica dominante. Claro que a ignorância também conta.
Mas não só, o Governo ao desistir da ligação ferroviária à Europa torna a economia portuguesa prisioneira dos interesses das empresas espanholas que são as nossas maiores concorrentes, através da dependência dos centros logísticos que a Espanha construiu ao longo da nossa fronteira para esse efeito. E fazem-no sem terem a vergonha de afirmar, como faz Pedro Nuno Santos, que não optam pela bitola europeia porque os espanhóis não fazem as ligações necessárias. Desde quando Portugal não cumpre as directivas europeias para a ferrovia e prescinde dos apoios de Bruxelas de milhares de milhões de euros para o efeito, porque os espanhóis não deixam? São estas as decisões de um futuro primeiro-ministro que afirma tudo decidir na hora?
Volto à questão da causa de tantos deputados terem votado positivamente o maior e o mais ignorante ataque ao interesse nacional de que há memória. Um ataque semelhante, mas para pior, daquele que permitiu a José Sócrates vetar a aquisição da então PT pela Sonae e com isso defender os interesses de Ricardo Salgado e destruir a maior e melhor empresa do País. Ou os que consumiram milhares de milhões de euros dos contribuintes portugueses para salvar o sistema financeiro e as corruptas parcerias público privadas das autoestradas? As mesmas parcerias público/privadas que o PS pretende agora recuperar para a ferrovia do Porto a Lisboa, para pagar este novo crime da bitola ibérica e prescindir da maioria dos apoios europeus que a Espanha utiliza há trinta anos, na construção do mais moderno sistema ferroviário da Europa. Com a vantagem da Espanha ter hoje empresas exportadoras de comboios de alta velocidade.
Tudo isto é possível porque Portugal não possui uma verdadeira democracia e os portugueses não têm quaisquer poderes de influenciar as decisões políticas por falta de representação na Assembleia da República. As greves são ainda a única forma permitida aos trabalhadores portugueses de protestarem sobre a situação a que chegou o Serviço Nacional de Saúde, o Ensino Público, a desorganização das empresas públicas de transporte altamente deficitárias, ou a inoperância da Justiça.
Foi recentemente publicado um livro dos economistas Luís Valadares Tavares e João César das Neves com o título “Porquê o País do Salário Abaixo de Mil Euros?” onde é explicado com dados objectivos de instituições nacionais e internacionais o atraso crescente de Portugal nos últimos vinte anos relativamente a quase todos os restantes países europeus, bem como o que há a fazer para superar esse atraso. Dados sobre a educação, a saúde, a administração pública, a justiça, a economia e a produtividade, entre outros.
Razões mais do que suficientes para demonstrar que votar no PS no próximo dia 10 de Março representa uma traição à inteligência, aos portugueses e ao interesse nacional.