Terminada a carreira de árbitro, Pedro Proença foi eleito presidente da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), organismo que organiza as competições profissionais de futebol, em julho de 2015, foi reeleito em junho de 2019 e reconduzido para terceiro mandato em junho do ano passado. A sua ambição estendeu-se além-fronteiras e, em novembro de 2023, foi eleito presidente da European Leagues, que reúne as 40 principais ligas europeias. Em qualquer dos cenários, Pedro Proença nunca descura a sua imagem – vários colaboradores disseram-nos que é obsessivo com tudo o tem a ver com a sua apresentação – e o seu discurso é sempre de um quase profissional relações-públicas.
Quando chegou à presidência da Liga, Pedro Proença encontrou um organismo quase falido; e passados mais de oito anos a LPFP está numa situação financeira bastante sólida, que lhe permite avançar com o megalómano projeto imobiliário chamado Arena Liga Portugal, no Porto, um investimento de 18 milhões de euros suportado quase na totalidade pela Liga. A inauguração está marcada para este ano e, segundo Pedro Proença, será “um edifício vanguardista, ecológico e equipado com tecnologia de ponta”.
A nova sede da instituição vai ter sete andares e fica em Ramalde, num terreno com cerca de 7.000 metros quadrados (foi uma permuta com a Câmara Municipal do Porto, que fica com o edifício da atual sede da Liga), e vai receber as 150 pessoas que fazem parte dos seus quadros, quase três vezes mais do que os funcionários existentes há quatro anos, e que representa um custo superior a 4,1 milhões de euros no exercício 2022-23. O edifício vai ter um museu do futebol profissional, restaurante, auditório com capacidade para 300 pessoas e espaços para formação. A Arena Liga Portugal inclui também uma zona comercial para venda de produtos da Liga e das sociedades desportivas e uma zona high-tech para atividades ligadas à performance e desempenho de jovens jogadores. “O edifício assume-se como baluarte para o futuro em perfeita harmonia com a envolvência paisagística da cidade e com a comunidade local”, lê-se num comunicado da Liga. No mesmo documento pode ler-se: “Será ponto de encontro e desenvolvimento de negócios tanto a nível nacional como internacional, e um espaço equipado com a mais avançada tecnologia para aprendizagem e coworking, com destaque para a incubadora de empresas ligadas ao futebol”.
Olhar para a FPF
Enquanto prossegue a construção da nova sede, Pedro Proença prepara o caminho para chegar à presidência da Federação Portuguesa de Futebol (FPF). Disse recentemente à CNN Portugal: “Neste momento estou no lugar que sempre pensei estar. Estou a meio de um percurso e é minha convicção que irei terminá-lo” – uma declaração cautelosa, que não fecha a porta à FPF. Aliás, nos corredores da Liga Portugal todos sabem que o seu objetivo maior é ser presidente da Federação, cujas eleições se realizam em 2024, e dentro da própria FPF existe a perceção de que Proença está a preparar a sua candidatura. O colégio eleitoral é composto por 84 delegados, que vão eleger, em Assembleia Geral Eleitoral, o futuro presidente, a Direção e a Mesa da Assembleia Geral. Esses delegados representam as associações distritais, os clubes e sociedades desportivas e as associações de classe, sendo certo que, para vencer as eleições, é fundamental ter o apoio das associações.
No papel de presidente da Liga Portugal, Pedro Proença tem dado especial atenção às ditas associações através da Fundação do Futebol, que lançou o projeto “Liga-nos o Talento” e tem distribuído 20 bolas e um apoio financeiro de 2.000 euros pelas associações a nível nacional. Além disso, organizou uma cerimónia de distribuição de prémios a jogadores, treinadores e presidentes de clubes, e naturalmente que tudo isso ajuda a angariar votos para o seu ambicionado objetivo. É um candidato forte, mas, possivelmente, não vai ser o único. Luís Figo disse há pouco tempo que pondera apresentar a sua candidatura à presidência da FPF. Resta saber se haverá algum movimento de fundo dentro da FPF para apresentar um candidato que continue o trabalho desenvolvido pela equipa de Fernando Gomes e, nesse casso, José Couceiro poderá ser uma hipótese.
Outro objetivo da Liga Portugal é a centralização dos direitos televisivos e multimédia dos jogos da primeira Liga, prevista para entrar em vigor a partir de 2028/29, um assunto que tem provocado algum ruído e que Pedro Proença não tem sabido controlar. A concretização da venda desses direitos vai permitir repartir as verbas de forma equilibrada e equitativa por todos os clubes, reduzindo as assimetrias orçamentais entre equipas da primeira Liga. Neste momento, o rácio entre as receitas da comercialização dos direitos televisivos do clube que mais recebe para o que menos recebe é cerca de 15 vezes. Essa mais-valia pode dar maior capacidade competitiva às equipas de menor dimensão e aumentar a atratividade da competição. Um campeonato mais competitivo significa maior valorização do produto futebol e a entrada de mais de dinheiro, ou seja, o futebol sai do círculo vicioso e entra no círculo virtuoso. De notar que, nas dez ligas mais importantes da Europa, o campeonato português é o único que não tem um modelo de negociação centralizado dos direitos televisivos. Até final da próxima época, a Liga Portugal tem de apresentar ao Governo uma proposta de projeto de lei com as condições da centralização, o seu objetivo, a forma de serem vendidos os direitos e o modelo de repartição financeira. Cabe depois ao Executivo e à Autoridade da Concorrência aprovar o modelo.
Fora de contexto
A venda dos direitos de transmissão da Liga portuguesa promete dar muito que falar e o otimismo inicial está a esfumar-se devido à conjuntura económica e ao reduzido interesse da competição. O estudo encomendado pelo organismo presidido por Pedro Proença avança com um valor entre 275 e 350 milhões de euros de receitas, o que é, para muitos, irrealista, bastando ver o exemplo neerlandês, onde os direitos de transmissão da liga foram vendidos por 90 milhões de euros – e estamos a falar de um país que está à frente de Portugal no ranking da UEFA. Se olharmos pela vertente desportiva, a diferença entre os dois países também não justifica essa disparidade; na Liga dos Campeões, Portugal e os Países Baixos têm um clube (FC Porto e PSV), na Liga Europa temos três equipas no playoff de acesso aos oitavos de final (Benfica, Sporting e Braga) e os neerlandeses têm uma (Feyenoord), e na Liga Conferência os Países Baixos têm um representante no playoff (Ajax) e Portugal está fora. Além disso, vários países deixaram este ano de transmitir os jogos do campeonato português, caso da Inglaterra, França e Brasil, porque o produto não é apetecível, o que é um péssimo sinal para quem o pretende vender. Depois, em que outro país da Europa se viu um treinador a recusar-se sair do campo depois de ter sido expulso? Em que outro país um capitão de equipa, que também é um dos capitães da seleção nacional, tira a camisola e exibe-a provocando os adeptos do clube adversário depois de ter visto o cartão vermelho? Em que outro país se vê um árbitro a falar ao telefone com o VAR para tomar uma decisão sobre um lance capital de um jogo porque houve uma falha no sistema do vídeoarbitragem? Tudo isto aconteceu em Portugal, em apenas quatro meses, e é este produto que Pedro Proença quer vender por centenas de milhões de euros.
Por outro lado, nem todos partilham do mesmo entusiasmo quanto ao processo de centralização dos direitos audiovisuais. Entre os chamados clubes grandes, há a perceção de que a negociação dos direitos televisivos pode contribuir para que os principais clubes portugueses percam competitividade face aos outros grandes europeus e isso paga-se nas provas da UEFA. O Benfica fatura 40 milhões de euros por época com os direitos de televisão e o presidente Rui Costa já fez saber que o clube não irá cumprir a lei se for prejudicado. Aguardam-se as cenas dos próximos capítulos.