A Guerra e a Paz – a meio do caminho


O estudo e a análise da geopolítica configura com muita clareza, a coerência das razões da ambição da paz e as vicissitudes e as predisposições várias para a guerra.


A atual década tem muita probabilidade de ficar famosa na história moderna das relações internacionais. E não por boas razões. Ainda a década não vai a meio. Duas guerras de grandes proporções (na Ucrânia e na Faixa de Gaza), com muitas baixas entre militares e a população civil. Com muita destruição e um elevado impacto na política internacional. No entanto, nenhum destes conflitos acresce em boa verdade, qualquer elemento de novidade no espaço e na ação do sistema internacional. Ambos os conflitos muito previsíveis na sua trajetória geopolítica. E de igual forma transformados pelo espaço mediático dos dias de hoje, num singular “teatro de operações globalizado”.

O estudo e a análise da geopolítica configura com muita clareza, a coerência das razões da ambição da paz e as vicissitudes e as predisposições várias para a guerra. Dos povos e dos seus líderes, dos interesses dos Estados e dos seus objetivos estratégicos e da ambiguidade existente na ordem internacional. Quando a guerra é admitida como a “solução das soluções” e se justifica por uma narrativa histórica, determinista, identitária, nacionalista ou outra, a paz é por norma um meio caminho.

“Nas fronteiras, a Rússia raramente mostrou um sentido dos limites… Na maior parte da sua história, a Rússia tem sido uma causa à procura de uma oportunidade” dizia Henry Kissinger. Face ao seu permanente sentimento de insegurança, oscila entre os dois modos: “ou retirar-se para um ressentimento amuado”; ou como presenciamos desde 24 fevereiro de 2022, no modelo autocrático de Vladimir Putin, a opção pelo modo de expansionismo militar, desta vez na Ucrânia.

Perpassa por agora um ar de menor entusiasmo na Europa. É notório. Nas lideranças e nos liderados. E de maior hesitação nos EUA, percebendo-se a complexidade dos estigmas e interesses políticos internos em curso. Parece ressurgir o conceito de alguma resignação face ao poderio militar da Rússia em relação à Ucrânia, e às soluções geoestratégicas a adotar nesta fase do conflito. A guerra é como sempre uma realidade dramática, e a obtenção da paz um objetivo virtuoso.

O problema surge, contudo, quando enfrentamos a dura realidade geopolítica. A paz (a do meio caminho) significará neste momento a assunção clara da vitória do modelo de agressão militar utilizado por um Estado sobre o outro. Também aqui nada de novo e que o sistema internacional não conheça! E a dita paz justa ou mesmo a paz possível, é na maioria das vezes, a paz dos vencedores.

A menor determinação e vontade da Europa (também por ausência de poder efetivo e influência no sistema internacional), com algumas divisões internas à mistura, e uma nova estratégia política dos EUA, a confirmarem-se, poderão determinar a prazo o fim deste conflito. Deixando a Ucrânia isolada e com as perdas de guerra. Ou seja, os territórios ucranianos já conquistados pela Rússia. A compensação (a existir) para a Ucrânia poderá vir em modo de integração no espaço da União Europeia e eventualmente um compromisso futuro com NATO. Para o Ocidente fica o êxito da expansão da NATO, até junto das fronteiras da Rússia via países nórdicos. A continuação da guerra em lume brando, ou de uma paz algo consentida, mas não declarada, seriam também um meio caminho. Que não se sabe como e a quem beneficiariam.

No caso do conflito do Médio Oriente, a perspetiva de análise do mesmo pode sempre ter várias narrativas. Longas e datadas historicamente. Mas fixemo-nos apenas em Gaza, no trágico dia de 07 de outubro e na consequente guerra agora em curso. A paz, como bem sabemos, nesta conturbada Faixa vem por norma no intervalo das guerras. Que já são muitas e demasiadas.

Na perspetiva de Israel e em termos de análise estratégica, percebe-se que Israel só tem uma solução político-militar nesta guerra: a eliminação da estrutura político-militar do Hamas. E claro a libertação dos reféns. Qualquer outra situação será sempre percebida, interna e externamente, como uma derrota. O Hamas, por seu lado, tem desde sempre como grande objetivo programático a destruição do Estado de Israel. Mas começa agora a dar sinais de fraqueza e isolamento político-militar no tereno, não só pela intensa campanha militar efetuada pelas Forças de Defesa de Israel, mas também pela pressão que alguns Estados Árabes da região estarão a exercer sobre ele.

A questão humanitária e as elevadíssimas baixas entre a população de Gaza é um drama que tem agitado a comunidade internacional e as Organizações Internacionais. E neste campo também Israel está reconhecidamente sob forte pressão da comunidade internacional. O renovado apelo ao cessar fogo (imediato ou mesmo sustentável), a tréguas humanitárias ou outro modelo semelhante, será importante para refazer o apoio humanitário imediato às populações. Mas também para possibilitar a libertação dos reféns.

As soluções político-diplomáticas encontradas no seio da Conselho de Segurança das NU para o atual momento do conflito, ou as negociações através do Catar e Egito ou outros Estados envolvidos, não deixarão de ser relevantes no atual contexto, mas não resolvem a guerra, e estarão ainda longe de trazer uma paz duradoura que garanta a segurança na região. Será como tem sido e de novo, uma paz a meio do caminho.

Coronel e especialista em geopolítica 

 

A Guerra e a Paz – a meio do caminho


O estudo e a análise da geopolítica configura com muita clareza, a coerência das razões da ambição da paz e as vicissitudes e as predisposições várias para a guerra.


A atual década tem muita probabilidade de ficar famosa na história moderna das relações internacionais. E não por boas razões. Ainda a década não vai a meio. Duas guerras de grandes proporções (na Ucrânia e na Faixa de Gaza), com muitas baixas entre militares e a população civil. Com muita destruição e um elevado impacto na política internacional. No entanto, nenhum destes conflitos acresce em boa verdade, qualquer elemento de novidade no espaço e na ação do sistema internacional. Ambos os conflitos muito previsíveis na sua trajetória geopolítica. E de igual forma transformados pelo espaço mediático dos dias de hoje, num singular “teatro de operações globalizado”.

O estudo e a análise da geopolítica configura com muita clareza, a coerência das razões da ambição da paz e as vicissitudes e as predisposições várias para a guerra. Dos povos e dos seus líderes, dos interesses dos Estados e dos seus objetivos estratégicos e da ambiguidade existente na ordem internacional. Quando a guerra é admitida como a “solução das soluções” e se justifica por uma narrativa histórica, determinista, identitária, nacionalista ou outra, a paz é por norma um meio caminho.

“Nas fronteiras, a Rússia raramente mostrou um sentido dos limites… Na maior parte da sua história, a Rússia tem sido uma causa à procura de uma oportunidade” dizia Henry Kissinger. Face ao seu permanente sentimento de insegurança, oscila entre os dois modos: “ou retirar-se para um ressentimento amuado”; ou como presenciamos desde 24 fevereiro de 2022, no modelo autocrático de Vladimir Putin, a opção pelo modo de expansionismo militar, desta vez na Ucrânia.

Perpassa por agora um ar de menor entusiasmo na Europa. É notório. Nas lideranças e nos liderados. E de maior hesitação nos EUA, percebendo-se a complexidade dos estigmas e interesses políticos internos em curso. Parece ressurgir o conceito de alguma resignação face ao poderio militar da Rússia em relação à Ucrânia, e às soluções geoestratégicas a adotar nesta fase do conflito. A guerra é como sempre uma realidade dramática, e a obtenção da paz um objetivo virtuoso.

O problema surge, contudo, quando enfrentamos a dura realidade geopolítica. A paz (a do meio caminho) significará neste momento a assunção clara da vitória do modelo de agressão militar utilizado por um Estado sobre o outro. Também aqui nada de novo e que o sistema internacional não conheça! E a dita paz justa ou mesmo a paz possível, é na maioria das vezes, a paz dos vencedores.

A menor determinação e vontade da Europa (também por ausência de poder efetivo e influência no sistema internacional), com algumas divisões internas à mistura, e uma nova estratégia política dos EUA, a confirmarem-se, poderão determinar a prazo o fim deste conflito. Deixando a Ucrânia isolada e com as perdas de guerra. Ou seja, os territórios ucranianos já conquistados pela Rússia. A compensação (a existir) para a Ucrânia poderá vir em modo de integração no espaço da União Europeia e eventualmente um compromisso futuro com NATO. Para o Ocidente fica o êxito da expansão da NATO, até junto das fronteiras da Rússia via países nórdicos. A continuação da guerra em lume brando, ou de uma paz algo consentida, mas não declarada, seriam também um meio caminho. Que não se sabe como e a quem beneficiariam.

No caso do conflito do Médio Oriente, a perspetiva de análise do mesmo pode sempre ter várias narrativas. Longas e datadas historicamente. Mas fixemo-nos apenas em Gaza, no trágico dia de 07 de outubro e na consequente guerra agora em curso. A paz, como bem sabemos, nesta conturbada Faixa vem por norma no intervalo das guerras. Que já são muitas e demasiadas.

Na perspetiva de Israel e em termos de análise estratégica, percebe-se que Israel só tem uma solução político-militar nesta guerra: a eliminação da estrutura político-militar do Hamas. E claro a libertação dos reféns. Qualquer outra situação será sempre percebida, interna e externamente, como uma derrota. O Hamas, por seu lado, tem desde sempre como grande objetivo programático a destruição do Estado de Israel. Mas começa agora a dar sinais de fraqueza e isolamento político-militar no tereno, não só pela intensa campanha militar efetuada pelas Forças de Defesa de Israel, mas também pela pressão que alguns Estados Árabes da região estarão a exercer sobre ele.

A questão humanitária e as elevadíssimas baixas entre a população de Gaza é um drama que tem agitado a comunidade internacional e as Organizações Internacionais. E neste campo também Israel está reconhecidamente sob forte pressão da comunidade internacional. O renovado apelo ao cessar fogo (imediato ou mesmo sustentável), a tréguas humanitárias ou outro modelo semelhante, será importante para refazer o apoio humanitário imediato às populações. Mas também para possibilitar a libertação dos reféns.

As soluções político-diplomáticas encontradas no seio da Conselho de Segurança das NU para o atual momento do conflito, ou as negociações através do Catar e Egito ou outros Estados envolvidos, não deixarão de ser relevantes no atual contexto, mas não resolvem a guerra, e estarão ainda longe de trazer uma paz duradoura que garanta a segurança na região. Será como tem sido e de novo, uma paz a meio do caminho.

Coronel e especialista em geopolítica