As alterações climáticas existem. O que tem sido concretizado para as combater é insuficiente para alterar o seu rumo, sobretudo porque as grandes potências e os maiores poluidores mundiais não fazem o que devem ou ajustam o seu nível de compromisso em função dos interesses particulares e das conjunturas. Dito isto, é inaceitável o que um ajuntamento de seres radicalizados para a construção imediata e futura de uma realidade sem sustentação têm andado a fazer nos nossos quotidianos de comunidade com direitos, deveres e compromissos de vida em comum.
Não é possível admitir que as esferas de liberdade individuais desses seres, por mais ou menos aditivadas que estejam pelas utopias, possam colidir de forma frontal com as esferas de liberdade de terceiros, perante a passividade de quem tem a obrigação de zelar pela normalidade do funcionamento do Estado de Direito Democrático. Digo-o com a legitimidade de quem para defender uma ideia nunca teve de atropelar as esferas de liberdade de terceiros. Por exemplo, pela autodeterminação do Povo de Timor, acorrentámo-nos junto à Embaixada da Holanda (agora Países Baixos), entregámos barris de madeira na Embaixada da Austrália, por serem coniventes com a exploração do petróleo do mar de Timor pela ocupante Indonésia, e ocupámos pacificamente, com camisolas amarelas, a praça junto ao Pavilhão da Indonésia na EXPO 92, em Sevilha, sem atropelar leis e direitos de terceiros.
Em democracia, as liberdades não se exercitam violentado as esferas de terceiros, seja na forma de expressão tantas vezes confundida com o insulto gratuito, seja na perturbação dos ritmos de vida normais de quem luta no quotidiano pela obtenção de recursos para as vivências e as sobrevivências. O Estado democrático tem a obrigação de não desvalorizar nenhum tipo de abuso no exercício das liberdades, por mais meritórias que possam ser as motivações, sob pena de sinalizar um inconcebível laxismo com a desordem que abre a porta a expressões populares do exercício da autoridade ou de salvaguarda dos interesses.
Sendo Portugal e a União Europeia dos territórios no mundo, onde mais se toldou as opções de gestão ao combate às alterações climáticas, não havendo alternativas de sustentação dos modelos de funcionamento propostos e existindo muita gente com enormes dificuldades para superar os desafios básicos dos quotidianos, na alimentação, na habitação, no acesso a mínimos de conforto e na manutenção de vivências saudáveis, o que os radicalizados propõem é a implosão nacional e isolada das soluções. Acabar já com os combustíveis fósseis. Acabar já com os transportes que os utilizam. Acabar já com o consumo. Acabar já com o capitalismo. Acabar já, propondo um modelo e uma pseudo-realidade que não existe em lado nenhum ou existe em modo de aproximação com deploráveis condições de vida para as pessoas noutras latitudes de miséria. Como seria interessante saber como esta gente se alimenta, desloca, comunica, trabalha e desfruta dos tempos livres, certamente com pegada ecológica e consumismo zero.
Não é possível permitir que se sinalize qualquer tipo de conivência com a bandalheira social travestida de causa ambiental ou de qualquer outro pretexto para ser notícia pelo choque porque, sendo a preocupação relevante, a consistência das propostas é zero. Já nos bastam outros deslaços sociais, as gritantes injustiças, as ameaças à segurança e as guerras noutras latitudes para estabelecerem um quadro psicológico geral de sobressalto cívico e alguma angústia nos quotidianos das pessoas e no funcionamento da sociedade. É que a segurança é um pressuposto fundamental das dinâmicas das sociedades, sendo essencial para a normal fluidez da vida das pessoas, das empresas, das instituições e de tudo que conta com o respeito mínimo pelo contrato social e pelos compromissos da vida em comunidade. Um país que tem o turismo como pilar fundamental da economia e do crescimento económico, como acontece com Portugal, também alavancado no consumo, não se pode dar ao luxo de ser permissivo com as incivilidades, a criminalidade ou os radicalismos de matriz ideológica, religiosa ou terrorista, sempre à margem da lei. Um incidente grave de segurança e vai-se a galinha dos ovos de ouro.
Já temos um enorme grau de incertezas nas nossas vidas para que possa haver alguma condescendência com histéricos inconsequentes das alterações climáticas, que têm como alvo quem está a fazer alguma coisa e querem a implosão de tudo, por via de um pulsar anticapitalista travestido de causa ambiental. É tolerância zero para quem fala em máximos para não cumprir mínimos de respeito pelo outro e pela sociedade em que vive. Haverá certamente muitos territórios abandonados no interior do país a precisarem de quem faça diferente e concretize alternativas disruptivas de desenvolvimento sustentado. Haverá seguramente outras latitudes políticas no mundo, mais próximas da quadratura do círculo enunciada, que poderão acolher a afirmação das teses propaladas. Até lá, é cumprir a lei e respeitar as esferas de liberdade dos outros.
NOTAS FINAIS
ELEITORADO, ENTRE OS AFAGADOS, OS ALHEADOS E OS ABANDONADOS. O mercado cívico dos eleitores está cada vez mais compartimentado. Os alheados que integram a abstenção, sem ânimo ou fator de mobilização para abandonar a categoria. Os afagados destinatários preferenciais das opções políticas de redistribuição por serem garantia de mobilização para o voto, dos pensionistas à função pública, passando pelos sobreviventes do privado. Os abandonados que vegetam na ausência de alternativas às opções do poder vigente, entregando-se ao voto de protesto inconsequente ou à resignação perante as circunstâncias.
O DISPARATE DA EXTINÇÃO DO SEF. A teimosia enfunada pela anterior solução governativa e por um punhado de casos concretos inaceitável vai a consumação nos próximos dias no pior dos contextos. Extinguir o SEF no atual contexto de ameaça terrorista lembra as alterações do modelo de organização e das lideranças da proteção civil em vésperas dos fatídicos incêndios de 2017. Face às inconsistências da concretização das mudanças, que a realidade não venha a dar razão aos riscos que se correm.
DA INCAPACIDADE PARA FAZER. Segundo a ministra da Presidência, os Ministérios que gerem o PRR eram para estarem concentrados nas instalações da CGD desde o final de 2022. Um ano depois nada. E o Pai Natal quase a chegar, em 2023.