A Humanidade em busca do futuro perdido: O futuro dos sem futuro


Nada, nem ninguém, contudo, pode, de boa mente, justificar esta guerra de um ponto de vista das diferentes ideias, valores e projetos de sociedade sustentados pelos blocos em confronto.


Uma das questões que mais aflige, hoje, a maneira como a sociedade portuguesa e muitas outras olham para o futuro – o seu futuro – é, precisamente, o facto de ele não lhes ser facilmente percetível e, menos ainda, previsível.

Na melhor das hipóteses, tenta-se justificar o presente como se de um interregno entre o passado e o futuro se tratasse, procurando, com isso, acalmar os sofrimentos, o medo e o desespero crescentes.

Há muito que a humanidade se foi esquecendo dos futuros brilhantes que lhe propuseram e que, temos de convir, eram, ainda assim, bem mais luminosos do que aqueles com que hoje lhe acenam.

O futuro mais plausível que, hoje, lhe permitem antever é o de uma guerra geral, duradoura e dita definitiva para a sobrevivência da democracia e, mesmo, da humanidade.

Nada, nem ninguém, contudo, pode, de boa mente, justificar esta guerra de um ponto de vista das diferentes ideias, valores e projetos de sociedade sustentados pelos blocos em confronto.

Não se pode, pois, dizer seriamente que, de um dos lados – o nosso – estão apenas os que defendem a democracia, respeitam o Estado de Direito, combatem o racismo e a xenofobia: não é bem assim e todos sabemos que não é.

A própria União Europeia, consciente desse problema, tem vários processos em curso contra alguns dos seus Estados Membros, por, entre outras questões, não respeitarem a divisão dos poderes e a independência do poder judicial.

Além de que, se, verdadeiramente, se tomasse em consideração a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e a do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, muitos dos Estados – mesmo os mais antigos e politicamente mais bem estruturados – que compõem o bloco em que nos inserimos, teriam muito que mudar nos seus sistemas judiciais.

O mesmo se diga – como se vai constatando dos noticiários que ainda subsistem com alguma objetividade – das democracias, sistemas judiciais e eleitorais de outras partes do mundo.

Basta visionar «Oppenheimer», um filme ainda em exibição nos nossos cinemas.

Não se pode, assim, com total sinceridade, afirmar que, de um dos lados, há presentemente toda a liberdade política para constituir e pertencer a partidos políticos e associações cívicas e sindicais e que só do outro lado isso não acontece.

Também no lado em que o nosso país se integra e defende, existem Estados com restrições políticas, proibições e repressões sérias a militantes sindicais e de partidos políticos da oposição, que violam a noção que, no chamado Ocidente, temos da liberdade de reunião, de associação e de expressão; e tais limitações não nasceram já depois da guerra, ou por causa dela.

Não se pode dizer, tão pouco, que num dos lados se protege a economia de mercado e que no outro estão instalados apenas regimes economicamente centralistas e estatizantes.

Com mais ou menos controlo, protecionismo e planeamento estatal – e eles têm lugar em todos os Estados modernos – todos os Estados se inserem, hoje, num sistema económico global baseado nas leis da economia de mercado.

Não se pode dizer ainda que, do nosso lado, a corrupção é sistemática e efetivamente combatida com sucesso; não, não é.

A corrupção, hoje, navega globalmente pelo mundo, com poucas restrições e, mesmo no cenário de guerra, não conhece fronteiras ou qualquer barreira política ou ideológica: a corrupção existente em um dos lados alimenta-se, necessariamente, na do outro e vice-versa.

 Para melhor compreendermos como ela se propaga, basta atentar na origem e constituição duvidosa do capital de muitos dos investimentos que engrandecem as maiores economias mundiais.

A divisão e afrontamento de blocos, condiciona, porém, hoje, muito a cooperação policial e judicial e isso só favorece a corrupção instalada.

Por estas e outras razões, não se desenha nos horizontes oferecidos por um e pelo outro lado um futuro libertador que justifique, de alguma maneira, os danos e a dor intensa que os cidadãos dos países mais diretamente envolvidos na guerra sofrem: uma guerra que, a qualquer momento, pode, aliás, descambar para uma orgia de destruição nuclear, sem remédio nem salvação para ninguém.

Além de que, se as coisas se complicarem e a guerra se alargar – como alguns parecem pretender -, ela não afetará só os povos dos Estados situados na linha da frente, mas atingirá, também, irremediavelmente, todos os outros povos, mesmo que se julgam neutros ou distantes do conflito principal.

O mais que podemos almejar por ora é, por conseguinte, que o bom senso dos dirigentes dos diversos lados evite ir além dos horrores já acontecidos, sendo que a situação atual é já totalmente injustificável e demencial.

Nenhum antagonismo – verdadeiro ou meramente propagandístico – dos que servem para justificar, hoje, a invasão de um país por outro, a pode, assim, legitimar.

Há instrumentos internacionais capazes de dirimir as razões concretas oficialmente invocadas para justificar esta guerra, mesmo quando, por trás delas – todos sabemos – se escondem as mais fundas e verdadeiras rivalidades e ambições, que são as que respeitam à liderança económica do mundo.

Nesse aspeto fundamental, e não apenas no das trincheiras visitadas pelo Presidente Marcelo, este conflito assemelha-se muito ao da primeira Grande Guerra.

É precisamente disso – dos verdadeiros e atuais antagonismos – e não dos velhos espantalhos ideológicos com que, em ambos os lados, se pretende justificar a guerra atual e o seu prolongamento impiedoso, que o Papa tem falado, sem que ninguém o ouça, mesmo os que se dizem católicos e têm responsabilidades nos destinos do mundo.

E, todavia, as consequências globais do conflito estão à vista de todos e são sentidos, em todos os continentes, pelos mais fracos dos fracos.

A realidade menos severa com que os cidadãos de algumas partes do mundo passaram, entretanto, a contar é – quando acontece – a da política das subvenções e ajudas estatais para os que trabalham com salários miseráveis e incapazes de fazer frente às suas necessidades individuais e familiares.

Este cenário de vida, eternamente provisório, não assegura, porém, um futuro digno a ninguém, mesmo quando alivia as piores dores atuais dos cidadãos dos países mais afortunados; e estes não são assim tantos.

E, sem futuro, sem esperança, a humanidade pode – em qualquer dos lados – ser tentada a seguir pelo pior dos caminhos.

Foi isso que, em tempos, mesmo os mais empedernidos dirigentes do período da guerra-fria perceberam a tempo.

Infelizmente, não parece que se tenham explicado bem.

 

 

 

 

 

 

A Humanidade em busca do futuro perdido: O futuro dos sem futuro


Nada, nem ninguém, contudo, pode, de boa mente, justificar esta guerra de um ponto de vista das diferentes ideias, valores e projetos de sociedade sustentados pelos blocos em confronto.


Uma das questões que mais aflige, hoje, a maneira como a sociedade portuguesa e muitas outras olham para o futuro – o seu futuro – é, precisamente, o facto de ele não lhes ser facilmente percetível e, menos ainda, previsível.

Na melhor das hipóteses, tenta-se justificar o presente como se de um interregno entre o passado e o futuro se tratasse, procurando, com isso, acalmar os sofrimentos, o medo e o desespero crescentes.

Há muito que a humanidade se foi esquecendo dos futuros brilhantes que lhe propuseram e que, temos de convir, eram, ainda assim, bem mais luminosos do que aqueles com que hoje lhe acenam.

O futuro mais plausível que, hoje, lhe permitem antever é o de uma guerra geral, duradoura e dita definitiva para a sobrevivência da democracia e, mesmo, da humanidade.

Nada, nem ninguém, contudo, pode, de boa mente, justificar esta guerra de um ponto de vista das diferentes ideias, valores e projetos de sociedade sustentados pelos blocos em confronto.

Não se pode, pois, dizer seriamente que, de um dos lados – o nosso – estão apenas os que defendem a democracia, respeitam o Estado de Direito, combatem o racismo e a xenofobia: não é bem assim e todos sabemos que não é.

A própria União Europeia, consciente desse problema, tem vários processos em curso contra alguns dos seus Estados Membros, por, entre outras questões, não respeitarem a divisão dos poderes e a independência do poder judicial.

Além de que, se, verdadeiramente, se tomasse em consideração a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e a do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, muitos dos Estados – mesmo os mais antigos e politicamente mais bem estruturados – que compõem o bloco em que nos inserimos, teriam muito que mudar nos seus sistemas judiciais.

O mesmo se diga – como se vai constatando dos noticiários que ainda subsistem com alguma objetividade – das democracias, sistemas judiciais e eleitorais de outras partes do mundo.

Basta visionar «Oppenheimer», um filme ainda em exibição nos nossos cinemas.

Não se pode, assim, com total sinceridade, afirmar que, de um dos lados, há presentemente toda a liberdade política para constituir e pertencer a partidos políticos e associações cívicas e sindicais e que só do outro lado isso não acontece.

Também no lado em que o nosso país se integra e defende, existem Estados com restrições políticas, proibições e repressões sérias a militantes sindicais e de partidos políticos da oposição, que violam a noção que, no chamado Ocidente, temos da liberdade de reunião, de associação e de expressão; e tais limitações não nasceram já depois da guerra, ou por causa dela.

Não se pode dizer, tão pouco, que num dos lados se protege a economia de mercado e que no outro estão instalados apenas regimes economicamente centralistas e estatizantes.

Com mais ou menos controlo, protecionismo e planeamento estatal – e eles têm lugar em todos os Estados modernos – todos os Estados se inserem, hoje, num sistema económico global baseado nas leis da economia de mercado.

Não se pode dizer ainda que, do nosso lado, a corrupção é sistemática e efetivamente combatida com sucesso; não, não é.

A corrupção, hoje, navega globalmente pelo mundo, com poucas restrições e, mesmo no cenário de guerra, não conhece fronteiras ou qualquer barreira política ou ideológica: a corrupção existente em um dos lados alimenta-se, necessariamente, na do outro e vice-versa.

 Para melhor compreendermos como ela se propaga, basta atentar na origem e constituição duvidosa do capital de muitos dos investimentos que engrandecem as maiores economias mundiais.

A divisão e afrontamento de blocos, condiciona, porém, hoje, muito a cooperação policial e judicial e isso só favorece a corrupção instalada.

Por estas e outras razões, não se desenha nos horizontes oferecidos por um e pelo outro lado um futuro libertador que justifique, de alguma maneira, os danos e a dor intensa que os cidadãos dos países mais diretamente envolvidos na guerra sofrem: uma guerra que, a qualquer momento, pode, aliás, descambar para uma orgia de destruição nuclear, sem remédio nem salvação para ninguém.

Além de que, se as coisas se complicarem e a guerra se alargar – como alguns parecem pretender -, ela não afetará só os povos dos Estados situados na linha da frente, mas atingirá, também, irremediavelmente, todos os outros povos, mesmo que se julgam neutros ou distantes do conflito principal.

O mais que podemos almejar por ora é, por conseguinte, que o bom senso dos dirigentes dos diversos lados evite ir além dos horrores já acontecidos, sendo que a situação atual é já totalmente injustificável e demencial.

Nenhum antagonismo – verdadeiro ou meramente propagandístico – dos que servem para justificar, hoje, a invasão de um país por outro, a pode, assim, legitimar.

Há instrumentos internacionais capazes de dirimir as razões concretas oficialmente invocadas para justificar esta guerra, mesmo quando, por trás delas – todos sabemos – se escondem as mais fundas e verdadeiras rivalidades e ambições, que são as que respeitam à liderança económica do mundo.

Nesse aspeto fundamental, e não apenas no das trincheiras visitadas pelo Presidente Marcelo, este conflito assemelha-se muito ao da primeira Grande Guerra.

É precisamente disso – dos verdadeiros e atuais antagonismos – e não dos velhos espantalhos ideológicos com que, em ambos os lados, se pretende justificar a guerra atual e o seu prolongamento impiedoso, que o Papa tem falado, sem que ninguém o ouça, mesmo os que se dizem católicos e têm responsabilidades nos destinos do mundo.

E, todavia, as consequências globais do conflito estão à vista de todos e são sentidos, em todos os continentes, pelos mais fracos dos fracos.

A realidade menos severa com que os cidadãos de algumas partes do mundo passaram, entretanto, a contar é – quando acontece – a da política das subvenções e ajudas estatais para os que trabalham com salários miseráveis e incapazes de fazer frente às suas necessidades individuais e familiares.

Este cenário de vida, eternamente provisório, não assegura, porém, um futuro digno a ninguém, mesmo quando alivia as piores dores atuais dos cidadãos dos países mais afortunados; e estes não são assim tantos.

E, sem futuro, sem esperança, a humanidade pode – em qualquer dos lados – ser tentada a seguir pelo pior dos caminhos.

Foi isso que, em tempos, mesmo os mais empedernidos dirigentes do período da guerra-fria perceberam a tempo.

Infelizmente, não parece que se tenham explicado bem.