Por João Sena
Agosto é o mês em que a Fórmula 1 faz uma pausa por vontade da FIA. A federação estabeleceu uma regra que impede as equipas de trabalharem por um período de 14 dias. São elas que escolhem o período de descanso e, durante esse tempo, as fábricas devem estar vazias, sem técnicos, engenheiros, pilotos ou assessoria de imprensa, e os contactos online deverão ter a resposta automática ‘Ausente’.
A maioria dos pilotos aproveitou as férias para se desligar das corridas, mas há exceções. O campeão do mundo passou uns dias a fazer drift com a sua equipa e Fernando Alonso e Nico Hulkenberg estiveram a andar de karting para manterem a adrenalina no máximo. Lando Norris gastou um fim de semana a assistir ao MotoGP em Silverstone, ele que é um declarado fã de Valentino Rossi e amigo de Fabio Quartararo. Na altura, disse que gostaria de competir em MotoGP, mas como piloto da McLaren não tem sequer autorização para se sentar numa moto de competição.
Outros pilotos aproveitaram os dias de descanso para estar com a família e amigos. Max Verstappen juntou-se a Norris para assistir a um espetáculo do DJ Martin Garrix, depois passou alguns dias num iate no Mediterrâneo, Pierre Gasly foi jogar golfe para o Algarve, Charles Leclerc dedicou-se ao windsurf, Daniel Ricciardo e George Russel encontraram-se em Ibiza, Carlos Sainz esteve de férias num iate na Sardenha, Valteri Bottas foi apanhado a fazer provas de vinhos e a andar de bicicleta e Yuki Tsunoda andou a visitar galerias de arte.
Sem surpresas
Todos os anos as equipas trabalham para apresentar um carro capaz de ganhar de corridas, mas parece que só a Red Bull faz bem os trabalhos de casa. Na verdade, o Red Bull RB 19 – uma verdadeira ‘besta’ de corrida – continua a dominar, tal como fez o RB 18 em 2022 e o RB 16B há dois anos. Nos testes de pré-época, já tinha ficado bem evidente o poderio dos campeões do mundo, depois, as corridas confirmaram aquilo que os experts tinham visto em pista. Em fevereiro, havia quem dissesse que a equipa austríaca poderia vencer todas as corridas neste ano. Uma coisa é certa, os pilotos da Red Bul venceram 12 Grandes Prémios e três corridas Sprint, conquistaram 10 pole position, 19 pódios, oito melhores voltas em corrida e lideraram 694 voltas. A equipa fez uma média de 42 pontos por fim de semana. A Mercedes, segunda melhor classificada, conquistou em média 21 pontos. Feitas as contas, a Red Bull foi para férias com 503 pontos (314 para Verstappen, 189 para Pérez), contra 247 da Mercedes.
O grande responsável por estes números é o bicampeão do mundo, Max Verstappen, já que Sergio Pérez é, cada vez mais, o segundo piloto da equipa, e muitos questionam se é o piloto certo para aquele carro. O neerlandês conseguiu 10 vitórias e sete pole position em 12 corridas e lidera destacado o mundial de pilotos.
Para vencer uma corrida é necessário ser rápido e ter uma boa estratégia, a Red Bull domina como ninguém esses aspetos graças a Max Verstappen e a Hannah Schmitz, a engenheira-chefe responsável por elaborar planos de corrida infalíveis. Há muito tempo que a equipa não perde uma corrida por mérito próprio e o campeão do mundo não é derrotado desde o GP do Azerbaijão, em abril.
Para a história fica o registo de ser a primeira equipa a vencer 12 corridas consecutivas numa época, batendo o anterior recorde da McLaren, obtido em 1988, com a extraordinária dupla de pilotos Ayrton Senna e Alain Prost.
A Red Bull não domina apenas em pista, é também mais rápida nas boxes. Os seus mecânicos realizaram 58% das trocas dos quatro pneus em menos de 2,5 segundos. A eficácia chegou ao extremo quando mudaram os pneus do carro de Sergio Pérez em 1,98 segundos! A segunda equipa mais rápida nas boxes é a Ferrari, o que mostra que eliminaram um dos pontos fracos do ano passado. Das 35 mudanças de pneus, 40% foram feitas na casa dos 2,5 segundos.
Não é teoria da conspiração contra os homens da Red Bull, mas Danica Patrick, antiga piloto da Indycar e NASCAR, observou que Lewis Hamilton e Fernando Alonso também ganhariam corridas com o monolugar de Verstappen: «Ambos são bastante agressivos, seria divertido vê-los em pista». Não temos qualquer dúvida disso, pois são os pilotos com mais vitórias e títulos na atual Fórmula 1.
Neste quadro não se pode falar de oposição, já que a Ferrari e a Mercedes voltaram a falhar na conceção dos carros e nas estratégias de corrida, e apenas a Aston Martin conseguiu incomodar com Alonso, um piloto da velha guarda que ainda consegue fazer a diferença no braço. O desempenho da Ferrari surpreende pela negativa, pois é muito inferior ao da época passada – nessa altura já tinha ganho três grandes prémios com Charles Leclerc. A travessia do deserto da Scuderia motivou um comentário azedo do ex-presidente da Ferrari, Luca di Montezemolo. «Sabem o que acho lamentável? É que estejam a festejar um terceiro lugar, como aconteceu em Spa. A Ferrari não é assim, o velho Enzo nunca teria aceitado isso», afirmou quem esteve ligado às grandes vitórias da equipa italiana. Como as coisas estão, o objetivo mais realista da Ferrari e da Mercedes é lutar pelos lugares secundários do pódio. E, até nisso, podem ser apanhadas pela surpreendente McLaren, que tem uma dupla de jovens e aguerridos pilotos que pode causar surpresa na segunda metade da época.
Apesar de o espetáculo não ser tão emotivo como em anos anteriores, a verdade é que os amantes dos desportos motorizados não largam a Fórmula 1. Os circuitos continuam cheios de espetadores – a próxima corrida em ‘casa’ de Max Verstappen vai ser uma autêntica loucura – e as audiências televisivas continuam em alta, um fenómeno explicado pela excelente série Drive to Survive, apresentada pela Netflix. Sem exagero, pode dizer-se que esta plataforma deu ‘asas’ à Fórmula 1.
Aliás, o próprio diretor da Ferrari, Frédéric Vasseur, admite à revista italiana Autosprint que «Vestappen não está a prejudicar a Fórmula 1. Simplesmente está a realizar um trabalho fantástico e isso deve ser um estímulo para melhorarmos» – têm a segunda metade da época para o fazer.
O final da época pode ser mais complicado para a Red Bull, uma vez que está limitada no número de horas em que pode utilizar o túnel de vento para desenvolver o carro, uma penalização imposta pela FIA por ter ultrapassado o orçamento em 2021.
Mudanças em vista
O verão é, por tradição, a época da ‘silly season’, só que este ano as coisas estão muitos calmas. Red Bull, Ferrari, McLaren, Aston Martin e Alpine têm os pilotos definidos para 2024, mas há outras cinco equipas com casos pendentes. A principal dúvida está na Mercedes, pois o heptacampeão do mundo Lewis Hamilton ainda não renovou, enquanto a Alpha Tauri, Alfa Romeo, Haas e Williams podem ter um lugar em aberto. Um dos assuntos mais falados é o regresso de Mick Schumacher como piloto da Williams para o lugar do estreante Logan Sargeant. O filho de Michael Schumacher tem a seu cargo o desenvolvimento do carro no simulador da Mercedes, um trabalho que tem sido bastante elogiado pelos pilotos da equipa.
Há também movimentações entre as equipas. A parceira entre a Alfa Romeo e a Sauber termina este ano, para dar lugar à Audi, que anunciou a entrada na Fórmula 1 em 2026. Para permanecer em pista, a equipa italiana fez uma nova parceria como fornecedora de motores à americana Haas. O anúncio oficial deverá acontecer no GP d0e Itália, no início de setembro.