Por Joana Dias, Investigadora do Centro para a Inovação em Território, Urbanismo e Arquitetura do Instituto Superior Técnico (CiTUA-IST)
A inovação social é um termo apelativo e cativante que, à semelhança de outros conceitos que também ficam no ouvido, como a sustentabilidade e a resiliência, tem vindo a ganhar destaque no mundo académico e na sociedade. A designação de algo como sendo socialmente inovador parece ser uma característica usada com alguma versatilidade, como se a utilização do rótulo “inovação social” fosse garantia de algo novo que, por si só e de forma quase imediata, traz consigo a resolução das questões sociais mais complexas e difíceis de solucionar.
Embora não se trate de um oásis de ideal social nem de uma promessa de um mundo sem desigualdades, a inovação social pode ser, sim, uma forma de contribuir para a solução de problemas sociais tão complexos como a exclusão social, o desemprego, a falta de acesso a alimentação, o envelhecimento inativo ou tantos outros com que nos deparamos frequentemente no nosso dia-a-dia.
Ser socialmente inovador é criar algo novo que promova a inclusão através de uma resposta a necessidades e desafios sociais do nosso bairro, da nossa cidade, do nosso País ou do nosso Mundo. Com o intuito de transformar os sistemas onde ocorrem, as inovações sociais podem adquirir várias formas, envolver diferentes tipos de atores e desenvolver-se em diferentes escalas territoriais.
Portugal tem vindo a descobrir a inovação social em iniciativas que ocorrem no nosso País há muito tempo (como o ColorADD que transformou a vida das pessoas com daltonismo através da sua linguagem inclusiva) ou em ideias novas que começam agora a ser implementadas (caso da Agrofloresta da Bela Flor onde a segurança alimentar e o sentido de comunidade são a prioridade).
É também possível encontrar inovação social em territórios com diferentes densidades populacionais e necessidades sociais. Por exemplo, A Avó veio trabalhar (onde as avós com os seus saberes tradicionais são pessoas ativas e criadoras de produtos únicos e de novas experiências culturais) foi inicialmente implementada em meio urbano, em Lisboa, estando agora também replicada nos Açores. Já o projeto das Aldeias Pedagógicas é um excelente exemplo implementado em meio rural, no Vimioso, em Bragança, onde as várias gerações, juntas, promovem a revitalização das aldeias transmontanas.
Há ainda incubadoras que apoiam ideias e projetos de escala municipal (Cozinha com Alma, em Cascais, que garante refeições e capacitação para famílias com dificuldades financeiras), regional (projeto Rádio Miúdos, a primeira rádio onde as crianças podem ter voz e que está implementada em várias regiões do País) ou nacional (EKUI, uma metodologia que tem transformado a forma de aprender o alfabeto em sala de aula, para crianças com e sem necessidades especiais).
Apesar da lista de exemplos de iniciativas socialmente inovadoras ser bastante extensa e poder incluir casos nacionais bem como internacionais, não há uma receita de como fazer inovação social que possa ser replicada e que, como que num estalar de dedos, nos dê uma solução. A investigação que temos vindo a realizar no âmbito do projeto TRUST mostra que ser inovador e ter a capacidade de transformar comunidades vulneráveis que enfrentam problemas sociais complexos é um processo que demora tempo e que necessita não apenas de investimento (humano e financeiro) mas principalmente da vontade das pessoas quererem mudar e do seu envolvimento na construção de algo novo, desconhecido, transformador e perene.
Os resultados do projeto, coordenado pelo Instituto Superior Técnico e em parceria com as Universidades de Aveiro e de Évora, têm mostrado que investimento e dedicação de promotores, voluntários e outros participantes envolvidos neste tipo de iniciativas são dois pontos chave apontados como uma das principais forças motrizes que permitem que as ideias passem de um terreno idílico para algo concreto e implementável, e que garantem, ao mesmo tempo, a continuidade das iniciativas.
Já o investimento financeiro é muitas vezes assegurado por candidaturas a financiamentos públicos (por exemplo, do Portugal Inovação Social) ou privados (como do Grupo Fidelidade). No entanto, este tipo de financiamento parece carecer de sistemas de monitorização e capacitação que assegurem, à posteriori, a continuidade das ações de inovação social de forma independente. Sem autonomia financeira e sem apropriação por parte das comunidades que implementam estas inovações, este tipo de iniciativas cria uma elevada dependência de agentes externos e encontra-se sempre em risco de não sobreviver após o término do financiamento. Assim, todo o potencial de serem socialmente inovadoras fica por isso mesmo, no potencial, sem a possibilidade de atingir toda a magnitude e impacto que as caracteriza.
Também crucial para que este tipo de iniciativas consiga alcançar o seu objetivo é a vontade das pessoas quererem mudar e de quererem participar na construção de algo diferente. Para aqueles que pretendem ser inovadores sociais, não desistam: a persistência e a criação de uma rede de confiança entre todos os atores envolvidos demorará algum tempo mas garantirá frutos no fim. A capacitação individual e coletiva de todos os envolvidos nas iniciativas é também uma ótima estratégia para criar comunidades mais empoderadas, responsáveis e capazes de se transformar.
Por fim, a inovação social é das pessoas e para as pessoas e todos nós podemos fazer parte dela, destacando-se a importância do Técnico estar envolvido nestas temáticas, promovendo a relação entre a ciência e a prática.
Referências:
Para mais informações sobre as iniciativas referenciadas no texto:
ColorADD: https://www.coloradd.net/pt/
Agrofloresta da Bela Flor: https://belaflorrespira.wixsite.com/agrofloresta
A Avó veio trabalhar: https://www.fermenta.org/pt/
Projeto Aldeias Pedagógicas: https://www.aldeiaspedagogicas.pt/
Cozinha com Alma: http://www.cozinhacomalma.pt/
Rádio Miúdos: https://www.radiomiudos.pt/
EKUI: https://ekui.pt/
Portugal Inovação Social: https://inovacaosocial.portugal2020.pt/
Grupo Fidelidade: https://premio.fidelidadecomunidade.pt/
TRUST: https://trustsensu.wixsite.com/trust