Nota prévia: Das eleições espanholas saíram duas vitórias de Pirro, tanto para o PP como para o PSOE. É alta a probabilidade de haver nova chamada às urnas lá para o inverno. O país está dividido em dois grandes blocos esquerda/direita, mas não voltou a bipartidarismo. O PP é formalmente o mais votado e tem mais deputados. O PSOE aguentou muito melhor do que as sondagens proclamavam. As grandes surpresas foram o afundar do Vox (que pouco tem a ver com o nosso Chega) e o Sumar que não se pode comparar a uma esquerda tipo bloquista Mortágua. É mais um partido eurocomunista ou um Livre português. Há que esperar para ver se é Feijóo ou Sanches (ou um terceiro de um dos partidos) a formar uma coligação governamental. A de Pedro Sanches foi a primeira de Espanha. Juntava quadrantes radicais e por isso deu origem ao chamado governo Frankenstein, podendo repetir-se à esquerda ou à direita. Uma coisa ressalta do escrutínio: os espanhóis concentraram os seus votos nos dois grandes partidos moderados. É só nisso que são parecidos connosco. A Espanha é quarta economia da Europa. Fala menos e faz mais obra. Basta dizer que tem, hoje, a maior rede de TGV da Europa e um fabuloso aeroporto em Madrid, que é um Hub mundial. Nós temos conversa, projetos, controvérsias e uma total incapacidade de concretizar, independentemente de quem governa. É assim desde 1995, quando chegou Guterres.
1. O Conselho de Estado passou a ser feito a prestações. A sessão de sexta-feira prossegue em setembro, desde logo com a intervenção de António Costa e provavelmente do próprio presidente Marcelo. Numa manobra inatacável, mas provocatória, Costa saiu mais cedo para viajar até à Nova Zelândia, a fim de apoiar a primeira participação de uma seleção feminina num mundial de futebol. Como se não houvesse outra figura para representar o Estado português. Pelo que se soube, na desvalorizada reunião do Conselho ninguém defendeu a dissolução do Parlamento, a demissão do Governo ou a convocação de eleições. Antes pelo contrário. A bolha político-mediática está limitada aos jornais e aos analistas. António Costa pode estar descansado. As sondagens mais recentes mostram que os portugueses querem estabilidade e que as posições relativas dos partidos não indiciam mudanças claras de maioria, se houvesse eleições. Em teoria, o mês de agosto seria o momento ideal para o primeiro-ministro remodelar a sua equipa, a exemplo do que há anos fez Cavaco Silva. É duvidoso, porém, que Costa siga o mesmo plano, já que, por mais que haja ministros e secretários de Estado periclitantes, está provado, precisamente pelas sondagens, que não é a desastrosa governação que leva os portugueses a mudar de opinião. É a falta de uma alternativa consistente. É certo que o PS está longe de repetir a maioria absoluta. Mas é um facto que aguenta face ao PSD que, quando muito, ganharia por pouco. Não há, portanto, um inequívoco caminho de mudança a desenhar-se. Há apenas a hipótese de PSD e Liberais se aproximarem de uma maioria absoluta (provavelmente, só numa coligação com o CDS e outros moderados), uma vez que o Chega não tem lugar em coligações. A resiliência de Costa face à pressão presidencial para demitir Galamba deu, entretanto, frutos óbvios. A criatura pode ficar enquanto o primeiro-ministro entender, apesar do caos no seu e noutros setores governativos. Como às vezes no xadrez, o jogo está bloqueado. Mas há muitas variantes que podem ocorrer. O facto é que Costa não está fragilizado e domina o tabuleiro, com jogadas inesperadas e trombetas e fanfarras.
2. Rui Rio e António Costa protagonizaram dois saborosos momentos justificativos nos últimos dias. Rio disse que levou três horas a abrir a porta à PJ porque usa tampões nos ouvidos para dormir (pelos vistos acorda tarde). António Costa enfatizou, sem se rir, que os casos que levaram a demissões dos membros do Executivo não tiveram a ver com atos praticados nessas funções. Duas respostas brilhantes! A prolongada soneca de Rui Rio deu tempo a que os órgãos de informação que não sabiam da operação tivessem tempo para chegar à casa do ex-líder social-democrata. E assim apanharam o glorioso e hilariante momento da varanda, o passeio no velho Simca e as respetivas declarações. Agora, há que esperar a evolução do caso dos assessores fantasma. Está comprovado que não é só no PSD que existem. E há que ver se a misturada entre o que é do parlamento e dos partidos se limita a salários e pessoas, ou se é estendida a outras áreas como a aquisição e utilização de certos bens, uma vez que os números de contribuinte são comuns. O Ministério Público está obrigado a alargar a investigação a todo o universo parlamentar e partidário, o que vai prolongar algo que começou com uma notícia da Sábado, em 2018.
3. O mais triste de situações como as expostas acima (a finta de Costa a Marcelo no Conselho de Estado, o comício de Rio à varanda, o caso dos partidos se confundirem com o parlamento, a gestão caótica de uma empresa como a TAP, para citar só coisas recentes) é a sensação de termos uma classe política que atua como um grupo de adolescentes inconscientes. É exatamente por isso que sempre que quando uma pessoa do calibre de Cavaco Silva fala, o país agita-se e para. Falta alguém com essa influência à esquerda, desde a morte dos Presidentes Sampaio e Soares. Ao nível parlamentar, o debate da Nação mostrou uma completa pobreza no verbo em todas as bancadas. Nem Ventura, desta vez, conseguiu uma tirada de jeito. Costa esteve mais do que à vontade. Esteve mesmo à vontadinha. A ilusão de que o país está melhor e os portugueses começam a estar também é uma ficção que se vai gerindo, empurrando com a barriga. Em 2026, ou antes se Costa sair, virá a fatura acrescida de juros.
4. O fulgor confiscatório da dupla Carlos Alexandre e Rosário Teixeira é já proverbial. Agora foi a vez de Armando Pereira, o supermilionário do grupo Altice, e o seu parceiro Hernâni Antunes verem apreendidos os seus automóveis topo de gama no valor de muitos milhões de euros. É uma medida cautelar para assegurar futuras indemnizações e tem sentido. Isto desde que não se venha a verificar desajustada, como aconteceu no processo BPN. Na altura Ricardo Oliveira, entretanto falecido, viu a sua coleção de carros arrestada e foi obrigado a prestar uma caução de cinco milhões de euros. Depois, foi lhe rigorosamente tudo devolvido. Um tiro de pólvora seca e uma humilhação desnecessária, que se espera não ver repetida. O caso Altice é complexo e está a afetar a imagem da própria companhia no plano internacional. É ainda uma consequência indireta da miserável sucessão de golpadas que destruíram a Portugal Telecom, uma companhia que chegou a orgulhar qualquer português e que era ostentada como um emblema nacional. Afinal, rebentaram com ela num instante e os seus sucedâneos não se apresentam reluzentes.
5. Ao nível da Efacec, moita carrasco. Parece que se negoceia. Parece que há uns problemas com os obrigacionistas. Parece que é verão e parece que a malta vai a banhos. Lá para setembro/outubro dirão qualquer coisa tipo: as coisas estão a andar e as negociações já (o já é sempre essencial) entraram numa fase decisiva, esperando-se uma resolução positiva até ao fim do ano. Vai uma aposta?
6. Há trabalhos jornalísticos que dispensam comentários. Um deles estava no Público de domingo. Revelava que houve nove juízes do Tribunal de Contas a receberem compensações por férias não gozadas. Isto apesar das férias judiciais durarem dois meses. As indemnizações chegaram a superar 30 mil euros. Até no Tribunal de Contas há contas estranhas.