Nota prévia: O Czar do século XXI já não tem o controlo absoluto. Os factos do fim de semana mostraram fragilidade, ainda que momentânea. E isso, na Rússia, sempre foi fatal. Ali, poder do ditador é por definição absoluto ou acaba mal. Putin tem perdido combates sucessivos, falhou a aniquilação rápida da Ucrânia, arrastou os russos para uma guerra colonial (e estas nunca se ganham) e está desacreditado interna e externamente. Os acontecimentos envolvendo os assassinos da Wagner estão por explicar e perceber. Exibem um Putin sem a mão de ferro do passado. É bom para as democracias e para a Ucrânia. Os idiotas úteis que a Rússia alimenta no mundo, nomeadamente em Portugal, tentam embalar com a estória de haver o perigo de Putin ter um sucessor ainda mais cruel. Mais sinistro e tão inteligente não há. Pode haver mais fanáticos e mais sanguinários do que Putin, mas são menos hábeis. Se houvesse um mais inteligente e capaz no campo da maldade e do ódio estaria há muito no lugar do Czar. Um general que mais parece soviético, embora estranhamente tenha envergado o uniforme português, arranjou logo uma explicação fabulosa. Diz – já não na CNN mas na RTP, em jeito de transferência milionária de verão – que foi uma jogada genial de Putin para aniquilar de uma assentada Prighozin (um senhor da guerra de trejeitos tribais), que lidera o grupo Wagner, Sergei Shoigu, o ministro da Defesa e o chefe supremo das forças armadas, Valery Gerasimov. Está encontrada a nova narrativa da “heroicização” de Putin. Contou logo ali com a adesão de uma experimentada jornalista da casa. Mais realista foi Zelensky: “o mundo viu hoje que os patrões da Rússia não mandam nada”.
1. Pedro Santana Lopes já ganhou batalhas e perdeu guerras políticas. Mas se há coisa que ele conhece são os meandros e os timings do poder. E não é certamente por acaso que o ex-líder do PSD e malogrado chefe de governo voltou a colocar na agenda uma eventual candidatura a Belém. Santana sabe que no próximo ciclo o potencial de confusão saído do Parlamento é enorme, visto que será muito difícil repetir-se a maioria absoluta socialista ou outra qualquer. Tal significa que, à direita ou à esquerda, as possibilidades governativas serão difíceis de encontrar por causa das franjas mais radicais. E é improvável que haja a repetição de lideranças patrióticas que levem à formação de um bloco central, como o que constituíram Mário Soares e Mota Pinto, no século passado. Significa isto que o papel do próximo Presidente vai ter tanto ou mais peso do que o que tem Marcelo atualmente, porquanto existe, até ver, uma maioria absoluta. Mesmo que as coisas resvalem é mais do que improvável que o próximo ciclo seja menos complexo. Santana Lopes sabe também que há, à direita e à esquerda e no largo segmento dos moderados, muitos potenciais candidatos ou candidatas (não há ainda vislumbre de candidates, o que simplifica a análise). Há potencialmente Marques Mendes (o mais bem colocado), há Durão, há Passos (improvável), há César, há Vitorino, há Ana Gomes, há Ventura, há Centeno e há Catarina. Pode até haver um cómico tipo Araújo Pereira a zombar ao Zelensky, propondo a recuperação de Olivença. Há muita gente boa e também politicamente cínica como Santos Silva. O Santana de hoje é diferente. Está mais velho, mas continua jovem no entusiasmo da vida. Não tem medo das urnas, o que é de louvar. Conta com uma enorme popularidade, independentemente das simpatias políticas. Num certo sentido faz lembrar Marcelo com menos exuberância, embora também seja capaz de dar o corpo às selfies. Há que contar com ele na corrida mais decisiva da política dos próximos anos. Se ganhar, tem experiência para fazer boa figura e ser mais um a cumprir dois mandatos. A corrida da sua vida política seria a que o levaria a Belém. Para já, apenas voltou a sinalizar que é preciso contar com ele no centro direita moderado. É, pois, possível que salte para a arena como o fez inesperadamente Sampaio. Até porque a Figueira é terra de “toiros e toiradas”. É preciso ter consciência de que o sucessor de Marcelo poderá ter uma vida ainda mais complicada do que o atual presidente, face à provável pulverização partidária.
2. Aldrabar é prometer uma coisa e fazer outra. É ludibriar. É enganar. É trapacear. É intrujar. É mentir. É engodar. É enrolar, havendo ainda muitos outros sinónimos. Todos eles são aplicáveis ao que o governo fez com os supostos apoios ao pagamento de rendas. As expectativas levavam à ideia de que estariam disponíveis mil milhões de euros para o efeito. Afinal são 240 milhões. Puseram a correr a justificação de que teria havido um erro. E por isso se tornou necessária uma clarificação que vai cortar dois terços do prometido globalmente. A falácia (ou erro) tem teve a intervenção de pelo menos duas pessoas: o primeiro-ministro e a ministra da Habitação, uma jovem que mal sabe exprimir-se quanto mais fazer contas. Na realidade, a situação é fruto de mais uma manobra de governação de anúncio, como no apoio às vitimas dos fogos, às cheias e à covid que nunca apareceram. Só que desta vez as pessoas foram a correr fazer as contas, até se confrontarem com a aldrabice nas suas contas bancárias. Agora o governo e certos fiscalistas dizem que se não houvesse a retificação interpretativa do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais haveria ricos que seriam beneficiados. Ridículo!
3. Ao contrário da sua colega da Habitação, a ministra Ana Catarina Mendes é competente e sensata. Não se percebe por isso que, tendo a tutela do Comissariado para as Migrações, não tenha já demitido quem permite que a organização russa e putinista de Setúbal, que sacava informação a refugiados da invasão russa (com o beneplácito da câmara), continue classificada como ucraniana. Um escândalo! Só falta condecorar os facínoras com a Ordem da Liberdade.
4)Enquanto o país apodrece e está mergulhado numa total desgovernação, os dois temas políticos principais têm a ver com o que pode acontecer a Montenegro se perder as europeias e o destino europeu de António Costa. É uma estratégia de infantilização mediática. A continuar assim, os milhões de portugueses moderados vão mesmo deixar de votar. Como é evidente, Montenegro só pode ficar se ganhar. Já Costa está danadinho para sair. Não sabe é como nem quando para não deixar o PS de rastos. Por isso está condenado a dizer que fica até 2024.
5. A notícia é, no mínimo, surpreendente. O PSD renovou a frota de carros dos principais dirigentes. Parece que é um leasing! Ou seja, o mesmo sistema de aluguer que o partido tanto criticou quando Ourmières tentou fazer o mesmo na TAP/Air Portugal. O estardalhaço foi gigantesco e a voz dos sociais democratas foi das mais estridentes. Não faltou o argumento de que a empresa é do povo e que o dinheiro é dos contribuintes. Além disso, havia a questão dos cortes nos salários. Convém lembrar que no PSD grande parte da receita também vem do Estado através da lei dos partidos que rendeu este ano mais 8%, tirados do bolso dos contribuintes. Já os ordenados dos patriotas que lá trabalham só subiram cerca de 5%, o que não é nada face à inflação. Sobretudo depois da estagnação de uma década. Olívia Patroa, Olívia costureira, é o que é!
6. Manuela Ferreira Leite foi distinguida com o título de Economista Emérita, pela respetiva Ordem. Presentes dezenas de personalidades, além de familiares e amigos. A principal intervenção de homenagem e reconhecimento à ex-ministra das de Estado e das Finanças, da Educação e ex-líder do PSD (retirou a maioria absoluta a Sócrates) veio de Paulo Rangel. Saudou a circunstância de, não sendo feminista, ter sido, porém, a primeira mulher a ocupar essas três funções, a que acrescentou a honra de ser a única, até agora, a receber o título de economista Emérita. Lembrou a sua seriedade, a sua competência, o seu papel de mãe e avó de grande proximidade e um insuspeito sentido de humor. Para explicar porque não chegou a primeira-ministra, Rangel citou Agustina sobre uma sua personagem, assegurando que tinha as qualidades, mas faltavam-lhe os defeitos. O eurodeputado terminou a sua densa intervenção com uma nota sobre o caráter e as convicções profundas da homenageada, lembrando que é mais fácil morrer por uma religião do que vivê-la em plenitude.