Embora a OMS tenha decretado o fim da pandemia de covid-19 há apenas um mês e meio, o confinamento e as restrições impostas por esta doença parecem-nos uma realidade já longínqua. E ainda bem.
Agora, com a lucidez que nos é dada pela perspetiva do tempo, percebemos que houve exageros, abusos e até absurdos. Fazia algum sentido ter de usar máscara, em pleno verão, no convés de um barco ao ar livre? Fazia algum sentido os clientes terem de esperar ao frio à porta de um restaurante para levarem a comida para casa quando havia uma sala vazia? Fazia sentido exigir-se o distanciamento social, mas depois pais e crianças ficarem aglomerados à entrada das escolas porque a porta só abria durante cinco minutos e depois voltava a fechar-se?
Ao mesmo tempo, ficaram algumas coisas por explicar. Quando a doença apareceu e vimos Itália a ser atingida daquela maneira, ao ponto de os médicos terem de escolher quem tratavam e quem deixavam morrer, temeu-se o pior. Se era assim num país desenvolvido, como seria em países sem condições, sem hospitais, onde a população vive em situação muito precária? Como seria, por exemplo, na Índia ou no Bangladeche, com todos os seus milhões de pobres e falta de saneamento? Como seria em África?
Estranhamente, a doença parecia fazer mais estragos em países prósperos, como os EUA, como se escolhesse as suas vítimas a dedo.
E depois houve aqueles países, como os nórdicos, que conscientemente não adotaram medidas para conter a pandemia. Muitos previram uma mortandade descontrolada. Nada disso: saíram-se tão bem, ou melhor do que os países que impuseram medidas muito apertadas.
Três anos depois dos acontecimentos ainda não vi uma explicação convincente para isso.
Depois vieram as vacinas. Houve dúvidas quanto à eficácia e aos efeitos secundários, mas mesmo assim quase não foi dada liberdade de escolha. E, quando todos pensávamos que tinham vindo para ficar, que seria como a vacina da gripe, os peritos da OMS deixaram de recomendar os reforços. Haverá alguma coisa que devêssemos saber?
Persistem muitas questões sem resposta. E houve certamente erros, exageros e precipitações na forma como os governos lidaram com a covid. Com uma doença desconhecida, que ainda por cima se suspeitava vir dos morcegos (com todas as conotações sinistras que lhe estão associadas), é natural que ninguém quisesse correr riscos. Mas com isso acabámos por incorrer noutros perigos. Só para dar dois exemplos, os alunos, especialmente do ensino público, foram duramente prejudicados, e a tecnologia aproveitou para consolidar o seu controlo sobre as vidas e as mentes das pessoas. Creio que em qualquer dos casos o preço a pagar será elevado. Por muito que se tente fingir o contrário, não ficou tudo bem.