Nota prévia: Entramos hoje na contagem que leva aos 50 anos do 25 de Abril. Até 2025 recordaremos acontecimentos prévios e imediatos à data do golpe militar que virou revolução. Mais do que nunca, muitos responderão à célebre pergunta de Baptista-Bastos: “onde é que estavas no 25 de Abril?”. Parece impossível para os mais velhos, mas, hoje, estamos mais longe do termo da ditadura do que estávamos em 1974 do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Vamos entrar num tempo de balanços de toda a ordem. Recordaremos bons e maus momentos, grandezas e misérias da nossa Democracia, da Descolonização e do Desenvolvimento. Será certamente no que ao D de Desenvolvimento que todos teremos de reconhecer que, com as ajudas e os apoios de que beneficiámos tantas vezes, tínhamos a obrigação de estarmos melhor económica e socialmente. Falhámos mais oportunidades do que as que concretizámos e não podemos assacar as culpas a terceiros. Elas são nossas. Individual e coletivamente. Mesmo!
1. Parte dos portugueses tem boas razões para agradecer a Luís Paixão Martins (LPM). O estratego do Governo, que António Costa contratou recentemente, desenhou e acionou um plano de recuperação da imagem de Costa (PRIC). Num ápice, o ex-jornalista pressionou Costa a atuar depressa, aplicando medidas concretas que toquem à população em geral, sobretudo depois de uma desgraça chamada programa de habitação em que ninguém, e muito menos o governo, acreditou. Vai daí, numa altura em que as sondagens estavam a castigar o Governo e o PS, LPM convenceu Costa a avançar com uma semana de supostas benesses, aproveitando uma antevisão de contas nacionais menos dramáticas do que previa o titubeante Medina. A estratégia incidiu sobre os pensionistas e reformados que levam um aumento intercalar em julho e que, em termos globais, terão, no fim do ano, o cumprimento do que lhes era devido pela lei em vigor. Fez-se um foguetório tremendo por pagar uma dívida. O outro grupo é mais genérico. Envolve as pessoas que vão frequentemente aos supermercados e mercados, reduzindo o IVA para zero em meia centena de produtos essenciais. Todavia, as contas apresentadas por várias entidades mostram que as descidas de preços andam mais pelo 3% do que pelos 6%. Como se temia, aproveitou-se a semana anterior para, malevolamente, inflacionar os produtos. Pode-se discutir um ou outro aspeto das medidas, mas não o seu sentido global e a sua eficácia mediática e psicológica imediata, como é também o caso do apoio de 90 euros a pagar, trimestralmente, às famílias mais carenciadas. Toda esta operação foi concertada com dois eventos políticos e históricos fundamentais: a fundação do PS celebrada com um faustoso jantar só para a elite convidada e não pagante, fugindo à tradição, enquanto os militantes comuns continuam basicamente a servir para colar cartazes. Simultaneamente entrou-se nas comemorações que vão levar aos 50 anos do 25 de Abril. Na política, há um tempo certo para jogar os trunfos e, depois de um ano desastroso, António Costa parece ter recuperado a mão e tem aparecido com mais humildade democrática. Desta vez, reconheça-se, não foram medidas abstratas que foram atiradas para o ar e as campanhas mediáticas já têm algum substrato. Porém, nada do que foi anunciado tira a Portugal um único dos seus gigantescos problemas, causados por uma governação incapaz de assegurar um crescimento comparável ao dos países que mais recentemente aderiram à União Europeia. António Costa precisaria, para isso, de ter no Governo pessoas tão preclaras como o seu consultor de oportunidades políticas, que estudou profundamente os segmentos da sociedade que se estavam a distanciar do PS fundado por Mário Soares, o maior símbolo da nossa democracia. É de notar que há agora uma linha soarista que se tem demarcado do costismo. É gente menos fechada ideologicamente, mais virada para a social-democracia europeia, conhecedora dos meandros da economia e com uma abertura política ao centro bem maior. Evitam o crescimento de radicalismos, contando com a maioria moderada dos portugueses. Numa carta que dirigiu a Costa e que o Tal&Qual publicou, o histórico António Campos recorda a liderança de Soares “onde a divergência era salutar e muito enriquecedora politicamente”, sublinhando que “é com profunda deceção que, com a benevolência do PS, assisto à acelerada degradação das instituições democráticas, que tanto custaram a conquistar”. O recado sobre o receio do que futuramente pode acontecer ao PS, um dos poucos da Europa que se mantém charneira, não podia ser mais claro. Resta agora ver se Costa é capaz de retificar comportamentos no partido e no governo, pelo menos no campo ético, como parece ser sugerido na missiva. O deplorável caso do parecer sobre o despedimento da CEO da TAP é paradigmático. Afinal não existe. Há quando muito uns bitaites. Vários ministros disseram uma coisa e o seu contrário. Nenhum contou a verdade se é que a conhecia. Nunca se mentiu tanto. Apesar dessa vergonha, as medidas no terreno podem compensar a falta de ética. É possível que as mais recentes decisões do Governo contrariam as sondagens que, como se viu ontem pala do DN, mostram a descida do PS e de Costa, a gradual consolidação do PSD e a contínua afirmação do Chega, que contribui de forma decisiva para tornar a esquerda minoritária. Ventura afirma-se em todo lado menos no Porto, onde a tradição tem peso e é a Iniciativa Liberal que é a terceira força. Para inverter a situação, Costa e o seu guru perceberam que tinham de atuar sobre as pensões, devolvendo uma esperança de estabilidade a cerca de 2,5 milhões de reformados. É gente que, na sua grande maioria, não é particularmente exigente. Contenta-se com muito menos do que aquilo a que teria direito se o país não fosse vítima de tantas trapalhadas, trapalhices, entropias, endogamias, incompetência, além de tanta despesa inútil e tanto desperdício que se têm vindo a agravar com uma governação destruidora de áreas essenciais como a Saúde, a Justiça, a Educação, a Segurança Social e as Forças Armadas.
2. Vale a pena olhar para a figura desgraçada que anda a fazer Mário Centeno ao sugerir que os aumentos dos pensionistas deveriam ser provisórios. Um sujeito que ganha um balúrdio pornográfico, que nem consegue com o poder da palavra e dos atos controlar e fiscalizar a banca, que governou a cativar, deixando apodrecer e à míngua os serviços essenciais até para a saúde dos seus compatriotas, deveria ter decoro e estar calado. Mas não. Anda em campanha a falar a crianças.
3. Marcelo Rebelo de Sousa não esconde que a credibilização de Luís Montenegro passa também por chamar a si figuras de referência da sociedade que tragam uma vitamina política à alternativa. Isto sem implicar a constituição de governos sombra que não estão na nossa tradição. A ideia é um pouco replicar Sá Carneiro que juntou na Aliança Democrática até mesmo figuras de esquerda como Medeiros Ferreira, Magalhães Mota e António Barreto, na altura juntos no Movimento Reformador. Luís Montenegro tem crescido politicamente, mas ainda lhe falta respaldo público de figuras de referência de fora do PSD. Acontece até que, por vezes, quem representa o partido em debates não consegue fazer valer pontos de vista, ficando aquém dos mínimos. Aconteceu isso no É ou Não é da RTP fez ontem oito dias. Ascenso Simões, um socialista batido, esmagou Hugo Carneiro. Um verdadeiro Waterloo mediático. Desde ouvir hirto até acenos de concordância com a cabeça foi a panóplia toda de erros crassos por parte do social-democrata. Fez lembrar a máxima, aplicada à política, de que quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacaré.
4. Realizar as eleições europeias a 9 de junho, entre o feriado de Corpo de Deus e o dia de Camões, seguindo-se uma ponte em véspera do dia de Santo António, seria inaceitável. Escolher essa data seria um grave atropelo à democracia que pressupõe a maior participação possível. Além do mais, seria favorecer, de antemão, os partidos com maior grau de militância. Há que trabalhar para escolher outra data, porque os mecanismos de voto antecipado que porventura possam ser aplicados não são um método, mas um paliativo.
5. Desde 2021 que o Governo de Portugal não indica o seu representante no Tribunal de Contas Europeu. Trata-se de um lugar de extrema importância no órgão fiscalizador das contas dos 27 países membros da União Europeia, que já chegou a ser presidido por um português. Será que o lugar está cativo para alguém ou é só desleixo? E porque razão as oposições não suscitam a questão?