Inconstitucional: proibição tem cada vez mais vozes críticas

Inconstitucional: proibição tem cada vez mais vozes críticas


O presidente da AR já veio alertar para o facto de a proposta bloquista colocar em causa os princípios constitucionais da igualdade e do direito de propriedade, mas o BE não desiste de avançar com medidas para o mercado imobiliário. 


Depois do constitucionalista Paulo Otero ter afirmado ao Nascer do SOL que o projeto de lei do BE que defende a proibição de venda de casa a não residentes no país é inconstitucional, há cada vez mais vozes a manifestarem a sua frontal oposição a medidas que violam direitos fundamentais consagrados na Constituição.

O que, aliás, já fez soar alarmes no Parlamento. O presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, veio alertar os deputados para os riscos das normas em causa. «Permito-me chamar a atenção para as dúvidas suscitadas na nota de admissibilidade, as quais deverão ser consideradas no decurso do processo legislativo», refere Santos Silva no seu despacho, clarificando tratarem-se de problemas de conformidade com a Lei Fundamental.

O Bloco de Esquerda avançou com a proposta de proibir a venda de imóveis a cidadãos ou empresas com sede ou residência permanente no estrangeiro, como resposta ao aumento de preços no mercado imobiliário nacional. 

A ideia bloquista é seguir o exemplo dado pelo Canadá, onde, no início do ano de 2022, entrou em vigor uma nova lei que proíbe estrangeiros de comprar casas como investimento por dois anos. Recorde-se que, neste caso, a decisão teve como base o forte aumento dos preços das casas em 2020 e 2021, apesar de ter sido revertido no ano passado, antes desta lei entrar em vigor. Segundo os dados da Canadian Real Estate Association (CREA), os preços médios das casas no Canadá superaram os 800 mil dólares canadianos (quase 550 mil euros) em fevereiro passado, mas desde essa altura baixaram cerca de 13%.

No articulado deste diploma, o BE assinala, no entanto, que esta proibição não se aplicaria a «cidadãos portugueses com residência própria e permanente fora de Portugal», nem a requerentes de asilo ou imigrantes com autorização de residência permanente.

Ficariam igualmente de fora as «transações de imóveis em territórios de baixa densidade», assim como os «cidadãos estrangeiros que adquiram um imóvel, em copropriedade, com seu cônjuge ou com pessoa unida de facto». E o partido argumenta: «Em Portugal, o direito fundamental a uma casa está por cumprir».

Um argumento que não convence o presidente da Associação Nacional de Proprietários (ANP). Para António Frias Marques, a solução para baixar os preços dos imóveis passa por uma aposta na construção. E lamenta que nos últimos sete anos o Governo não tenha feito nada para responder a estas necessidades. «O problema é que em sete anos deste Governo não foi construída uma casa então que as construam e que sejam atribuídas a quem delas realmente precisa. Ainda esta semana fiquei parvo com uma declaração de António Costa a dizer que vai sair mais legislação na habitação. Por dever de ofício tenho legislação da habitação e são caixas e caixas de leis, decretos de leis e portarias, etc. Ainda vai sair mais legislação? Mas a legislação não dá casa a ninguém. É um absurdo», refere. 

‘Obrigados’ a pôr as casas a arrendar?
Mas depois de ter sugerido que o país devia proibir a venda de casas a estrangeiros, o Bloco de Esquerda foi mais longe, com Mariana Mortágua a defender que os proprietários deveriam ser «obrigados» a colocar as casas a arrendar. «É preciso dar maior estabilidade e duração aos contratos de arrendamento e controlar e condicionar o aumento desmesurado das rendas», disse a deputada bloquista em entrevista ao Eco, acrescentando que «a medida de controlo de rendas é uma boa medida. Tem de ser bem estudada e calibrada».

Para Mariana Mortágua, «o que está em causa não é um regresso ao congelamento das rendas que veio desde Salazar», – que considera de «má política». – e explica: «Mais de metade dos países da União Europeia e da OCDE têm qualquer tipo de controlo de rendas e Portugal não tem nenhum. O desastre que temos na habitação é o desastre do liberalismo no mercado. E agora temos de regular uma parte do mercado».

Os problemas da habitação têm sido, aliás, uma preocupação do partido de esquerda e Mariana Mortágua foi perentória: o Estado e os privados têm que se unir para resolver o problema de habitação. «O que é preciso fazer é disponibilizar casas no mercado a preços que as pessoas possam pagar», defendeu.

Só que, alertam os críticos da proposta bloquista, não vale tudo para se atingir esse fim e, nomeadamente, não se pode violar princípios e direitos constitucionalmente garantidos.