À boleia do meu querido fernando tordo demandámos Águeda, eu para lançar mais um livro, ele para promover um concerto intimista que teve um encanto especial. Desde a morte do meu pai que não consigo fazer as pazes com Águeda, aquela que foi sempre a minha terra, a terra de meus avós há mais de 300 anos. Nos anos da minha infância, Águeda era um lugar bonito, que descia em anfiteatro até ao rio, respeitando a harmonia das cores e do marulhar das águas no Cais das Laranjeiras. Um dia surgiu um prédio: o Prédio da Caixa. Um mastodonte cor-de-rosa que, ainda assim, teve a decência de ir nascer para lá das fronteiras históricas da Águeda que ainda não era, à época, apenas um lugar em forma de Águeda. Depois, os hunos invadiram a cidade. Alta-Vila, esse pulmão verde de árvores centenárias foi devastado para que mais blocos de betão se empilhassem desfazendo o desenho harmonioso que animou Adolfo Portela a chama-lhe Águeda-a-Linda. A partir daí valeu tudo! Pouco importa a imponência ou a suavidade de um edifício, estão-se nas tintas para o seu valor histórico e sentimental, o princípio existencial desta gente descerebrada é o lucro, o dinheiro infame pelo qual se prostituem sem um pingo de vergonha. Um destes dias assaltaram o adro e, à força do camartelo, levantaram uma espécie de Quarteira a espreitar macabramente para os cemitério e suas tumbas. Agora, a velha casa dos Cura Mariano parece ter o destino traçado e espera pela terraplanagem para que nesse preciso lugar avance um prédio de seis pisos. Barrico-me. Farei nascer árvores no meu jardim para que não seja obrigado à violência escabrosa destes vacões infames. Declaro a independência da Repúlica de São Bernardo e o enclave terá direito a hino e, sobretudo, terá a liberdade de continuar a existir pelo meio deste Algueirão de pacotilha. E já que o hino nacional anda a ser posto em causa, da minha varanda gritar-se-á “Contra os vacões marchar, marchaar!”.