Em oito meses apenas de um Governo de maioria absoluta (!), com a demissão do Ministro Pedro Nuno Santos, nesta madrugada, são agora onze as demissões no Governo liderado pelo Primeiro-ministro António Costa.
Os nomes que acompanham o número 11: Sara Abrantes Guerreiro, Marta Temido, António Lacerda Sales, Maria de Fátima Fonseca, Miguel Alves, João Neves, Rita Marques, Alexandra Reis, Hugo Santos Mendes, Marina Gonçalves e Pedro Nuno Santos.
São 11 demissões neste Governo do PS desde a tomada de posse a 30 de março de 2022. Representa 20% do total de 55 governantes, 17 ministros e 38 secretários de Estado.
Salientar que todos eles tomaram posse sob o “manto protetor” de uma maioria absoluta parlamentar de 120 deputados do PS.
Os últimos quatro casos surgem em véspera de passagem-de-ano, saíram o “poderoso” Pedro Nuno Santos (ministro das Infraestruturas e da Habitação), Hugo Santos Mendes (secretário de Estado das Infraestruturas), Alexandra Reis (secretária de Estado do Tesouro) e Marina Gonçalves (Secretária de Estado da Habitação).
Haverá várias discussões possíveis sobre estes números e demissões.
A primeira, clara, sobre a estabilidade do Governo liderado por António Costa e pelo PS.
Será que António Costa tem hoje força política, e estabilidade, com este Governo empossado há apenas oito meses que tem mais demissões que meses de funções?
Esta questão não se restringe a demissões em si, porque há demissões em vários Governos do Mundo todo por motivos de saúde e questões pessoais.
São situações normais, os políticos são humanos e não são máquinas. Têm vida e famílias, embora muitas vezes sejam destratados como se fossem desprovidos de sentimentos, de pais e de filhos. É um dos motivos que faz cada vez mais os melhores se afastarem deste mundo “ingrato” que é a causa pública.
A questão pessoal não deve interferir, também, na parte política que existe nestes 11 casos de demissão. Tenho dito e, permitam-me, praticado.
A questão da força política de António Costa e do Governo mede-se, isso sim, pelos sucessivos casos e casinhos políticos em torno de cada demissão e que dizem respeito às políticas públicas (como na Saúde) ou aos portugueses (como nos recentes casos de estouro de erário público).
Seja pela ausência de capacidade de resposta política e estrutural como foi o caso da ex-ministra da saúde que antecedeu Manuel Pizarro e não conseguiu, em quase 4 anos, reverter o declínio e disfuncionalidade estrutural do SNS.
Ou seja pela questão dos 300 mil euros fantasma da Câmara Municipal de Caminha, os 500 mil euros de indeminização pela TAP, o choque frontal entre Ministro e Secretários de Estado por visão política sobre o IRC… é escolher o pior.
A segunda possível temática de debate é sobre o “Maior Congresso da História do PS”.
Sim, o maior Congresso do PS porque a sucessão de António Costa começou com a demissão de Pedro Nuno Santos e não sabemos quantos anos vai durar. Vão ser (sabendo que 2023 traz já um Congresso Nacional do PS) uns possíveis quatro anos de cacique, aparelho e acordos para ver se Pedro Nuno Santos chega a líder do PS e candidato a Primeiro-ministro pelo seu partido.
Na teoria é fácil para o “Jovem Turco”:
Passo 1: Pedro Nuno Santos, um dos quadros mais políticos do PS de sempre (basta ver o percurso, as declarações e a capacidade oratória aliada à frontalidade sem medos de discórdia ideológica – algo raro nos dias de hoje de políticos talhados para “áreas de conforto”- que o faz incontornável na política interna e nacional), irá assentar enquanto Deputado na Assembleia da República (eleito por Aveiro) o tempo suficiente para o corredor parlamentar político assimilar o roteiro de campanha, as necessidades de acordos com as Federações Distritais do PS e blindar apoios.
Passo 2: Pedro Nuno Santos sairá daqui a alguns meses de Deputado para se “dedicar à vida empresarial” e aos negócios da sua família. Vai ganhar tempo no “período de nojo” da opinião pública. E o silêncio, o caminho discreto fora da opinião pública e da opinião publicada já demonstrou ter sucesso, como fez, no PSD, Luís Montenegro. Quando bem feito, não falha.
Passo 3: Pedro Nuno Santos irá distanciar-se gradualmente das medidas do Governo do seu PS, comedido, em comentários esporádicos que bem faz, propondo alternativas mais ideologicamente à esquerda para agradar aos desalinhados do seu PS e recuperar os ideológicos de extrema-esquerda, que tanto o admiraram desde a sua passagem por Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares aquando dificilmente negociou com sucesso vários Orçamentos de Estado do PS, em minoria, com cabal apoio do BE e PCP.
Passo 4: Meses após recuperar a presença mediática pública, Pedro Nuno Santos rompe, com um claro rótulo de “Político-Sério que se demitiu por culpa de outros” (fazendo esquecer a trapalhada do novo Aeroporto), em definitivo com o seu ex-líder de Governo António Costa e traça o rumo para um novo Governo do PS com políticas mais de Esquerda e “sem necessidade de apoios da Direita política nunca mais” (como o próprio chegou a dizer) para rejeitar totalmente discursos de bloco central e encostar a extrema-direita ao PSD enquanto abraça a extrema-esquerda.
Passo 5: A tendência de desgaste do Governo PS com uma década (nessa altura) desgastará os possíveis adversários internos como Fernando Medina (à cabeça) ou Ana Catarina Mendes. Pedro Nuno Santos, nessa altura, estará “fresco que nem uma alface” perante os seus camaradas e perante o país. Vai parecer novo um dos governantes com mais tempo destes dois Governos do PS.
Passo 6: Pedro Nuno Santos, voltará a repetir a fórmula mágica que já fez em Congresso Nacional do PS passado, onde foi ovacionado de pé e a maior figura desses três dias. Registem: No palco do congresso, perante os seus camaradas socialistas voltará a rejeitar ter medo de “rótulos”, invocará os “trabalhadores” e o “povo” e voltará a citar Marx. Passará a imagem de carisma que falta na política nacional.
Terá o Partido nas mãos numa altura em que só algo novo poderá conduzir o PS a uma terceira formação de Governo (vitórias podem ser duas, porque o primeiro veio de derrota contra Pedro Passos Coelho e contra o PSD).
A última questão de debate público possível com este Governo de tanta demissão é: E a oposição? Isto é só PS?
Não é só PS.
O PSD está diferente, sente-se internamente no trabalho de formiguinha que a Comissão Política Nacional tem feito junto das bases, na seriedade das visitas oficiais a cada distrito do novo Presidente Luís Montenegro ou na pluralidade de vozes sonantes com as intervenções cirúrgicas de figuras como os Vice-presidentes Paulo Rangel e Miguel Pinto Luz ou o Secretário-Geral e ex-líder parlamentar Hugo Soares que dão força e visibilidade fora de portas aos portugueses a validarem que o PSD está “maior”.
O PSD não está atabalhoado nem perdido.
Está, isso sim, em processo de crescimento e reconhecimento interno. Sabe o Presidente, experiente político Luís Montenegro, que o tempo joga a seu favor. Cada semana que passa é mais líder de oposição e melhor líder do PSD.
O PSD ainda não rejubila com sondagens ou estudos de opinião, ainda está longe do objetivo, mas a máquina interna está a começar a olear e crescer dia após dia enquanto o PS está estagnado e em desgaste interno (e crispação que qualquer demissão, e apoios de quem se demite perturba).
O PS vai para o ciclo de governo mais longo da história democrática e todos recordamos o que isso causou até ao poderoso Cavaco Silva e ao PSD que, então, ganhava também em todos os distritos.
A história repete-se sempre.
Em suma: Vêm tempos políticos de espera tão grandes como os que são infelizmente vividos nos Hospitais do SNS.
Vejamos: António Costa precisa de tempo para reorganizar um Governo desgastado em poucos meses, os apoiantes do líder socialista precisam de tempo para ganhar apoios enquanto diariamente são governantes com espaço mediático, Pedro Nuno Santos precisa de tempo para limpar imagem e criar a sua agenda política de campanha enquanto o PSD ainda precisa de tempo para estar em condições de Governar (que vai ter).
Os outros: As moções de censura de partidos novos no espetro político, perante um Governo de Maioria absoluta, representam as tradicionais e antigas dores de crescimento com as quais, por vezes, projetos bem-intencionados quebram por não saber lidar com a realidade. É a tentativa de ganhar “espaço de antena”, o desespero por minutos de noticiários e páginas de jornal.
Isto é o que acontece quando se vive numa “bolha política” e as ruas são transformadas em Feed de Facebook ou em caracteres no Twitter. Não dá para representar os portugueses numa política baseada nos “likes” e nos “RT” do Twitter.
Pessoalmente, estão muito longe da resposta aos problemas dos portugueses que continuam a ser debatidos apenas pelo PSD e pelo PS. São novos em tempo, velhos em ação concreta como estes anúncios de “moção de censura” vaticinam.
Voltando ao “Tempo de espera político”, precisamente entre o Natal e a passagem de ano, recuperámos a tradição de António Costa destes 8 meses: Umas Demissões. 11.
E, como é quase passagem de ano para 2023, talvez apareça mais um ou uma governante a se demitir para dar uma demissão por cada passa, 12. Como o número de passas que comemos às 24:00 horas de 31 de dezembro para 1 de janeiro.
Veremos o que aí vem.
Nota: Sendo este o último artigo de opinião de 2022, faço sinceros votos a todos os leitores do iOnline de um bom e feliz 2023, cheio de saúde, sucessos profissionais e muita felicidade familiar.
Reencontro-vos em 2023! Obrigado por partilharem comigo estes momentos.
Carlos Gouveia Martins