Os anos sucedem-se no carrossel da vida. Em cada viragem do calendário renovam-se os votos de saúde e prosperidade e reacende-se a luz da esperança, o desejo de ver os sonhos concretizados e os obstáculos ultrapassados e de atingir a serenidade convicta, quer na densa vida interior que habita em cada um de nós, quer na complexa ligação ao mundo que nos rodeia.
A relação que tivemos com 2022 marca as expectativas pessoais de cada um para 2023. Uns desejam que seja tão bom como o ano que finda e outros anseiam que seja completamente diferente. O meu sentimento para com 2022 tem incorporado um travo amargo pelo sofrimento que ao longo dele fui vendo ser espalhado pelo mundo. Dediquei muito do meu mandato político a tentar lutar contra essa torrente. Ninguém a conseguirá parar de supetão, mas se todos acreditarmos, podemos começar a virar o mundo do avesso e a mudar o vento, para que possa arejar, respirar e iniciar um ciclo de transformação positiva.
Não há dois anos iguais. A incerteza faz parte da equação do futuro, mas munidos de técnicas ou de saberes específicos ou da nossa intuição natural, podemos vislumbrar tendências e a partir delas traçar objetivos para a nova etapa, iluminados pelos desejos e pelas perceções sobre o futuro possível.
Entramos no novo ano muito perto das margens de um precipício, ameaçados por uma guerra global, por uma crise económica que teima em cavar o fosso das desigualdades, por uma cacofonia de desinformação e manipulação fermentada pela aceleração das tecnologias que a disseminam e por fenómenos climáticos extremos que de tão frequentes já quase só mobilizam os que os sofrem diretamente.
O mundo vai andar à roda em mais um ciclo do tempo, deixando-nos curiosos por saber em que casas se deterá no jogo da sorte e do azar, da guerra ou da paz, da concórdia ou do ódio. Seremos testemunhas de um enredo em que também nos é renovada a oportunidade de partilhar um contributo, pequeno é certo, mas influente, para definir a roda e as rodas do destino. O desafio é ciclópico, mas isso não nos dispensa de usar a oportunidade que temos de fazer acontecer e ajudar a moldar o futuro. Uma ajuda nas atitudes, nos comportamentos, nas escolhas, nas opções e nos exemplos.
Virar o vento, fazendo respirar o diálogo, a tolerância, a paz, a fraternidade e a dignidade, é fundamental para dar cor ao estendal de mudança que poderá colocar em 2023 uma memória de ano bom nos anais dos tempos que estão para vir.
Um estendal que diga não às hegemonias imperialistas qualquer que seja a sua raiz legitimadora e se construa a partir da colaboração entre iguais para enfrentar as maleitas que corroem a humanidade neste arranque de milénio cheio de solavancos, hesitações e labirintos éticos e morais.
Virar o vento não resolve nada por si só e convoca os riscos do desconhecido, mas perante o bafio global que se vai espalhando e embebendo o destino de cada vez mais pessoas e territórios, o arejamento trás consigo as sementes do recomeço, e de uma nova oportunidade para arrepiar caminho e dar mais sentido aos trilhos pelos quais escoamos o dom supremo da vida. Feliz 2023.
Eurodeputado do PS