Na semana que antecede a votação final global da proposta de Orçamento do Estado para 2023, importa questionar, em termos práticos, que novas medidas é que este Governo de maioria socialista está disposto a implementar para travar a inflação, a subida das taxas de juro e a pobreza crescente da população portuguesa.
Se há imposto que concorre diretamente para o primeiro lugar dos impostos mais penosos é o IVA (Imposto de Valor Acrescentado). Acima de nós, só há seis países que praticam uma taxa superior: Croácia, Dinamarca, Finlândia, Grécia, Hungria e Suécia. Igual a nós temos a Irlanda e a Polónia, de resto, todos os outros Estados-membros têm uma taxa de IVA inferior à portuguesa.
Este imposto é aplicado às vendas ou às prestações de serviços em Portugal, pago pelo consumidor, no momento em que é realizada a transação do bem adquirido ou do serviço prestado, ao vendedor ou prestador de serviços. Posteriormente, este valor é entregue ao Estado, designadamente à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). Em Portugal, o IVA representa 25% das receitas fiscais, enquanto que em Espanha, por exemplo, não supera os 18%.
Não é só o IVA que merece atenção no nosso sistema fiscal, mas diria que é um dos mais relevantes para gerar instabilidade social e que mais contribui para um sistema fiscal insustentável e pesado.
Lamentavelmente, para muitos portugueses o IVA é invisível. É daqueles impostos que se pagam nas entrelinhas e que não se questiona na fatura final. O caso muda de figura quando as pequenas e médias empresas ou os trabalhadores independentes são confrontados com os valores trimestrais a devolver ao Estado. O pensamento mais comum é que quem paga muito IVA é porque também recebe muito, mas isso já não é regra, uma vez que as margens são cada vez mais curtas e a economia mais frágil.
Outro dado que é muito revelador da nossa situação precária e periclitante verifica-se no número de micro-negócios (com menos de dez funcionários) que representam 96% do tecido empresarial português: um milhão e duzentos mil registos. Representam 40% do emprego nacional, dando trabalho a cerca de um milhão e oitocentos mil portugueses.
Mesmo as pequenas e médias empresas (PME’s) totalizam cerca de 835 mil, das quais mais de 99% são de pequena dimensão e as restantes de média, com estruturas que empregam até 250 trabalhadores.
Nada melhor do que um caso prático para conhecer uma situação concreta que se replica entre quem arrisca a ter o seu negócio. Imaginemos um português que decida abrir o seu próprio negócio, sem qualquer apoio do Estado e sem recorrer ao crédito bancário. Aplica as suas poupanças (a taxa de poupança em junho deste ano baixou para 8,3%) no investimento inicial para abertura da atividade comercial. Suponhamos que se trata de um ponto de venda de artigos taxados a 23%, que podem ser desde artigos de vestuário a brinquedos, bijuterias, artigos de decoração, etc… Arrenda um espaço para acomodar a atividade, compra o equipamento mobiliário indispensável (prateleiras, móveis, expositores, espelhos, etc…), material de apoio administrativo (caixa registadora, programa de faturação, impressora de talões, material de escritório,…), mensalmente paga a um contabilista para organizar a contabilidade da empresa, estabelece contratos de água e/ou eletricidade e de telecomunicações e abastece-se de bens para revender na sua loja. Nos primeiros trimestres, o IVA de cada venda que faz é abatido no IVA que pagou no seu investimento inicial, todavia esse montante é rapidamente atingido se o investimento for reduzido. Calculemos que este pequeno investidor, prefiro chamar-lhe “arriscador”, desembolsa cerca de 20 mil euros para iniciar a sua atividade, e que, no primeiro meio ano, o que vende é o suficiente para pagar as despesas mensais. No segundo semestre, animado com o facto de ainda não ter sido obrigado a desistir do negócio, vai reinvestindo o pouco que vai sobrando para aumentar o seu stock e diversificar a oferta. Importa realçar que ao final deste tempo, este “arriscador” ainda não conseguiu receber nada para si próprio, porque a fazê-lo a atividade daria prejuízo. Este movimento lento de crescimento vai andando a passo de caracol, à medida que as vendas vão permitindo reinvestir para consolidar o negócio. Ele sabe que o retorno não é imediato e está mentalizado para percorrer este caminho sinuoso e árduo em horas de trabalho. Até ao dia em que chega a comunicação do contabilista a informar que tem que pagar IVA, referente ao último trimestre. Vinte e três por cento do total de vendas que realizou nos últimos três meses tem que ser pago. O negócio está muito longe de ir de vento em popa para começar a destinar mais uma avultada verba para entregar ao Estado, logo agora que acabou de iniciar a sua atividade e padece das “dores de crescimento”, próprias de quem ambiciona fazer crescer o negócio.
A conta é simples: um artigo custa quinze euros ao vendedor, que depois o revende a quarenta euros, dos quais sete euros e meio são IVA que devolve ao Estado. Resumindo: dos quarenta euros, o vendedor retém para as suas contas dezassete euros e meio. Por cada cinco mil euros que fature, este não subsídio-dependente do Estado, tem que pagar novecentos e trinta e cinco euros. Só de IVA… acrescente-se a Segurança Social, o IES, o PEC, e afins que vão aparecendo ao longo do ano fiscal.
No final do ano, depois dos impostos pagos, qualquer investidor que tenha um lucro de cinco ou de vinte mil euros é levado a refletir se valerá a pena correr o risco de empregar pessoas, contrair empréstimos, vender mercadoria e não receber atempadamente…. o que nos leva a concluir que a cada dia que passa a nossa economia depende mais do Estado, pois este em vez de criar medidas para a iniciativa privada se desenvolver, cobra tanto e a tantos que a esmaga.
Um atropelo e travão a qualquer iniciativa privada que queira ser rentável num país em que não existe a cultura de incentivar e animar o investimento privado. Com este orçamento e com o que Fernando Medina apresentou aos portugueses, não se pode esperar que do Estado venha o apoio que a economia precisa para gerar mais receita e emprego. Na verdade, até se pode dizer que a criatividade deste Governo para “castigar” os empresários e os “arriscadores” não tem limites e vem escrita em letras muito miudinhas para que se possam vociferar as maiores barbaridades quando se fala em economia. O que vale ao Governo é que os portugueses sofrem de iliteracia económica e não compreendem “economês”…
Escreve quinzenalmente