15 de novembro de 1965. Volta ao mundo com uma perna às costas? Não. Foi mesmo sem ela

15 de novembro de 1965. Volta ao mundo com uma perna às costas? Não. Foi mesmo sem ela


Georges Paillot, alfaiate em Paris, foi um dos maiores caminhantes de sempre. Aos seis anos, atropelado por um elétrico, foi obrigado a amputar a perna direita. Cedo recuperou e lançou-se na aventura de andar pelo planeta. “Não sou nenhum inválido! Gosto de andar e tiro gozo na visita a muitos países. Caminharei até morrer!”


Georges Paillot, alfaiate em Paris, com 62 anos, decidiu que iria continuar a dar a volta ao mundo a pé. Neste caso “a pé” é mesmo literal já que só tinha um. Pé no singular e não no plural. Georges perdeu a perna direita com apenas seis anos ao ser atropelado por um elétrico. Teve de crescer com a deficiência e habituou-se a menorizá-la. Mais tarde colocaram-lhe uma prótese e tornou-se um caminhante compulsivo. Andava por toda a parte com uma perna às costas, como costuma dizer o povinho de Santa Marta de Penaguião a Chão de Meninos, mas neste caso era mesmo sem ela de todo. Quando decidiu que estava pronto para dar a volta ao mundo limitado a uma perna sã e a pouco mais do que um pau para equilibrar do outro lado, tornou-se uma figura conhecida. Não apenas em França. Por todo o lado, a imprensa entretinha-se a revelar o seu descaramento divino.

Há que dizer que Georges Paillot não saiu uma manhã ensolarada de Paris para regressar quando todo o planeta tivesse sido calcorreado. A coisa foi feita aos poucos. E começou logo em 1925 quando tinha apenas 22 anos. Atravessou a França, de cidade em cidade, a Itália, a Suíça, a Bélgica e a Alemanha, antes de se ver obrigado a regressar a casa. Faltava-lhe capacidade económica para ir mais longe. Nessa altura não havia patrocinadores dispostos a gastar dinheiro no aventureiro perneta. Mas a teimosia fazia parte do feito de Georges. Quando enfiava uma coisa na cabeça não a deixava sair. 

Passaram os anos. Em outubro de 1958 pôs-se novamente a caminho. Espanha, Portugal, Argélia, Dinamarca, Luxemburgo, Suécia, Noruega, Áustria, Jugoslávia e Grécia entraram nas contas de Paillot. E ele dizia: “Gozei, e muito, a minha viagem por todos esses países. Adoro andar a pé e não me considero um inválido. Nunca! Posso percorrer longas distâncias e aqui estou para provar isso mesmo”. Depois de mais um recolhimento em Paris, no dia 15 de novembro de 1965 estava em Istambul. O objectivo era seguir até Teerão, na então Pérsia, e daí caminhar até à Índia, atravessando o Afeganistão. Da Índia prosseguiria para a China e tentaria atingir o Extremo Oriente. Tipo duro, esse Paillot. “Em agosto de 1960 já tinha percorrido mais de 60 mil quilómetros a pé. Como veem estou mais do que preparado. Espero chegar ao Japão e depois ir de barco para os Estados Unidos que irei atravessar também a pé. Caminharei até morrer!” O alfaiate de Paris não tropeçava nas palavras.