A importância do direito europeu na pratica judicial e nos modelos jurídico-judiciários nacionais


Cada vez mais decisões do Tribunal de Justiça da EU põem em causa a verificação dos pressupostos reais que levaram à adoção de algumas das soluções vertidas na legislação europeia e em alguns modelos judiciários nacionais.


A Integração Europeia, no âmbito da EU e mesmo fora dela, independentemente da ideia que desse processo se fizer, vai acontecendo paulatina, mas efetivamente.

Ela resulta tanto da vontade política dos governantes dos diferentes países como, a outro nível, da globalização económica, da revolução comunicacional e digital a que constantemente assistimos e, ainda, da diminuição das distâncias espaciais e temporais que os modernos meios de transporte permitem.

Tal processo ocorre, todavia, em muitos casos, à margem de um verdadeiro conhecimento das suas implicações, por parte dos cidadãos dos países que compõem a UE.

 Algumas vezes, esse processo desenvolve-se sem que as autoridades, instituições nacionais e governantes de cada país tomem real consciência das implicações que alguns dos passos dados com a sua aprovação irão ter a nível interno dos próprios Estados.

Impulsionadas, frequentemente, por funcionários superiores das diferentes Direções Gerais da UE, vão sendo acertadas certas iniciativas e aprovadas certas decisões – umas mais relevantes, outras menos – de cujo autêntico alcance poucos se dão conta.

Em certas situações, mesmo os referidos funcionários europeus não conseguem aperceber-se, previamente, das implicações, no plano nacional, das decisões que promovem como boas e acertadas.

Elas só se revelam, em toda a sua grandeza e consequências, quando é necessário, depois, torná-las efetivas.

Essa tarefa já não é, todavia, da competência e responsabilidade dos que as inspiraram e aprovaram.

É, em certa medida, o que vem acontecendo, com alguma frequência, na área da Justiça.

Por essa razão, cada vez mais decisões do Tribunal de Justiça da UE põem, agora, em causa a verificação dos pressupostos reais que levaram à adoção de algumas das soluções vertidas na legislação europeia.

Refiro-me, designadamente, às que se referem à cooperação judicial e aos seus instrumentos de reconhecimento mútuo.

É que muitas de tais soluções foram aprovadas fundando-se, apenas, em presunções políticas sobre a congruência dos sistemas jurídicos e judiciais nacionais dos diferentes países, com os pressupostos e princípios que enformam o Direito e a legislação europeia.

Desvelada, porém, mais recentemente, a realidade concreta dos sistemas de alguns dos novos Estados-membro, rapidamente se alcança, também, que os modelos de Justiça de outros, mais antigos e até pioneiros na construção da UE, padecem dos mesmos vícios que o TJUE critica.

É o caso do estatuto do Ministério Público alemão.

Em todo o caso, neste plano de verificação concreta, os exames realizados situam-se, em geral, ao nível da concordância com os princípios fundamentais, o que torna, ainda assim, mais fácil a análise de compatibilidade dos sistemas nacionais com as normas essenciais do Direito europeu.

Acontece, porém, que, fruto do complexo sistema legislativo da UE e do modelo de preparação de tais decisões – pouco participado a nível interno de cada país –, muitas são as medidas que produzem, mesmo que involuntariamente, verdadeiras subversões nos sistemas nacionais de Justiça.

Por outro lado, fruto da necessidade de acordos e consensos, não é raro, com efeito, que algumas Diretivas e Regulamentos da UE contenham considerandos, cujas afirmações não estão, depois, realmente, plasmadas nos respetivos articulados.

Propõe-se num lado o que não se concretiza no outro e, assim, todos saem agradados.

Tais considerandos não deixam, todavia, de ter implicações na interpretação das normas aprovadas.

Eles orientam, portanto, a execução prática de normas europeias em direções que os Estados-membro que as aprovaram, verdadeiramente, não previram ou desejavam.

Acresce que, à revelia dos desejos dos decisores e dos aplicadores nacionais de tais diplomas, se avança, depois e ainda, a nível europeu, com normas de funcionamento e execução internas que, gerindo aparentemente apenas a atividade de algumas das instituições europeias, na prática, contendem diretamente com as competências e funções internas de algumas das autoridades judiciais e judiciárias dos Estados-membro.

A culpa disso reside, com alguma frequência, no pouco cuidado e preparação com que, a nível nacional, se dá o assentimento para a aprovação de tais medidas.

Mas não se encontra só aí o problema. 

O critério da oportunidade política na tomada de algumas decisões, aliado à importância e necessária rapidez na concretização das agendas das diferentes presidências, contribuem, também e decisivamente, para tais resultados indesejados e imprevidentes.

Na verdade, só uma leitura atenta, integrada e coerente de muitos desses considerandos e normas de Direito europeu pode alertar as autoridades nacionais, que participam no processo legislativo, para as consequências exorbitantes que resultam, a nível nacional, de alguns dos diplomas da UE.

Hoje, perante as inconsistências com os princípios fundamentais do Direito europeu que, de acordo com a jurisprudência o TJUE, alguns modelos jurídico-judiciais nacionais vêm, afinal, demonstrando manter, emergem, evidentes, as dificuldades na conservação da própria coerência global interna dos sistemas de Justiça de cada país.

Algumas das mais recentes decisões do TJUE não só põem em crise a verificação dos pressupostos em que assentam alguns instrumentos jurídico europeus, como, necessariamente, questionam, também, a arquitetura dos modelos judiciais nacionais.

Importaria, talvez por isso, ampliar o nível de participação dos aplicadores de Direito do Estados-membro, na análise prévia de alguns desses instrumentos legislativos europeus e dos normativos que deles derivam depois.

É que, passando por eles a aplicação de muitas dessas reformas, estarão os mesmos em melhor condição do que os funcionários europeus, para, de imediato, se aperceberem das consequências práticas no seu país da aprovação de muitas das medidas propostas.

Se assim não acontecer, corremos o risco, mesmo contra os desejos dos participantes no processo legislativo, de serem por estes aprovadas medidas supostamente inofensivas que, todavia, contendem com o desenho dos modelos nacionais, dificultando, mais ainda, a harmonização dos sistemas jurídico-judiciário dos diferentes Estados-membro.

Por essa mesma razão, importa não desconsiderar, também, o caráter plurinacional de alguns organismos europeus existentes como, por exemplo, a Eurojust.

Em tal característica tem residido, afinal, o êxito do seu funcionamento e o útil contributo que aqueles dão para o processo legislativo europeu.

A sua participação será tão mais útil quanto as discussões e análises, informadas e integradas, que nesses organismos plurinacionais em geral se realizam, consigam exprimir, genuinamente, as diferentes e específicas realidades que, de facto, coexistem a nível europeu.

Só a partir de tais diferenças – e não necessariamente contra elas -, é possível, pois, ir construindo paulatinamente e com uma progressiva e acrescida confiança mútua, uma cultura jurídico-judiciária comum que integre, na prática judiciária de todos, os princípios humanistas e democráticos, exigíveis em Estados de Direito.

A importância do direito europeu na pratica judicial e nos modelos jurídico-judiciários nacionais


Cada vez mais decisões do Tribunal de Justiça da EU põem em causa a verificação dos pressupostos reais que levaram à adoção de algumas das soluções vertidas na legislação europeia e em alguns modelos judiciários nacionais.


A Integração Europeia, no âmbito da EU e mesmo fora dela, independentemente da ideia que desse processo se fizer, vai acontecendo paulatina, mas efetivamente.

Ela resulta tanto da vontade política dos governantes dos diferentes países como, a outro nível, da globalização económica, da revolução comunicacional e digital a que constantemente assistimos e, ainda, da diminuição das distâncias espaciais e temporais que os modernos meios de transporte permitem.

Tal processo ocorre, todavia, em muitos casos, à margem de um verdadeiro conhecimento das suas implicações, por parte dos cidadãos dos países que compõem a UE.

 Algumas vezes, esse processo desenvolve-se sem que as autoridades, instituições nacionais e governantes de cada país tomem real consciência das implicações que alguns dos passos dados com a sua aprovação irão ter a nível interno dos próprios Estados.

Impulsionadas, frequentemente, por funcionários superiores das diferentes Direções Gerais da UE, vão sendo acertadas certas iniciativas e aprovadas certas decisões – umas mais relevantes, outras menos – de cujo autêntico alcance poucos se dão conta.

Em certas situações, mesmo os referidos funcionários europeus não conseguem aperceber-se, previamente, das implicações, no plano nacional, das decisões que promovem como boas e acertadas.

Elas só se revelam, em toda a sua grandeza e consequências, quando é necessário, depois, torná-las efetivas.

Essa tarefa já não é, todavia, da competência e responsabilidade dos que as inspiraram e aprovaram.

É, em certa medida, o que vem acontecendo, com alguma frequência, na área da Justiça.

Por essa razão, cada vez mais decisões do Tribunal de Justiça da UE põem, agora, em causa a verificação dos pressupostos reais que levaram à adoção de algumas das soluções vertidas na legislação europeia.

Refiro-me, designadamente, às que se referem à cooperação judicial e aos seus instrumentos de reconhecimento mútuo.

É que muitas de tais soluções foram aprovadas fundando-se, apenas, em presunções políticas sobre a congruência dos sistemas jurídicos e judiciais nacionais dos diferentes países, com os pressupostos e princípios que enformam o Direito e a legislação europeia.

Desvelada, porém, mais recentemente, a realidade concreta dos sistemas de alguns dos novos Estados-membro, rapidamente se alcança, também, que os modelos de Justiça de outros, mais antigos e até pioneiros na construção da UE, padecem dos mesmos vícios que o TJUE critica.

É o caso do estatuto do Ministério Público alemão.

Em todo o caso, neste plano de verificação concreta, os exames realizados situam-se, em geral, ao nível da concordância com os princípios fundamentais, o que torna, ainda assim, mais fácil a análise de compatibilidade dos sistemas nacionais com as normas essenciais do Direito europeu.

Acontece, porém, que, fruto do complexo sistema legislativo da UE e do modelo de preparação de tais decisões – pouco participado a nível interno de cada país –, muitas são as medidas que produzem, mesmo que involuntariamente, verdadeiras subversões nos sistemas nacionais de Justiça.

Por outro lado, fruto da necessidade de acordos e consensos, não é raro, com efeito, que algumas Diretivas e Regulamentos da UE contenham considerandos, cujas afirmações não estão, depois, realmente, plasmadas nos respetivos articulados.

Propõe-se num lado o que não se concretiza no outro e, assim, todos saem agradados.

Tais considerandos não deixam, todavia, de ter implicações na interpretação das normas aprovadas.

Eles orientam, portanto, a execução prática de normas europeias em direções que os Estados-membro que as aprovaram, verdadeiramente, não previram ou desejavam.

Acresce que, à revelia dos desejos dos decisores e dos aplicadores nacionais de tais diplomas, se avança, depois e ainda, a nível europeu, com normas de funcionamento e execução internas que, gerindo aparentemente apenas a atividade de algumas das instituições europeias, na prática, contendem diretamente com as competências e funções internas de algumas das autoridades judiciais e judiciárias dos Estados-membro.

A culpa disso reside, com alguma frequência, no pouco cuidado e preparação com que, a nível nacional, se dá o assentimento para a aprovação de tais medidas.

Mas não se encontra só aí o problema. 

O critério da oportunidade política na tomada de algumas decisões, aliado à importância e necessária rapidez na concretização das agendas das diferentes presidências, contribuem, também e decisivamente, para tais resultados indesejados e imprevidentes.

Na verdade, só uma leitura atenta, integrada e coerente de muitos desses considerandos e normas de Direito europeu pode alertar as autoridades nacionais, que participam no processo legislativo, para as consequências exorbitantes que resultam, a nível nacional, de alguns dos diplomas da UE.

Hoje, perante as inconsistências com os princípios fundamentais do Direito europeu que, de acordo com a jurisprudência o TJUE, alguns modelos jurídico-judiciais nacionais vêm, afinal, demonstrando manter, emergem, evidentes, as dificuldades na conservação da própria coerência global interna dos sistemas de Justiça de cada país.

Algumas das mais recentes decisões do TJUE não só põem em crise a verificação dos pressupostos em que assentam alguns instrumentos jurídico europeus, como, necessariamente, questionam, também, a arquitetura dos modelos judiciais nacionais.

Importaria, talvez por isso, ampliar o nível de participação dos aplicadores de Direito do Estados-membro, na análise prévia de alguns desses instrumentos legislativos europeus e dos normativos que deles derivam depois.

É que, passando por eles a aplicação de muitas dessas reformas, estarão os mesmos em melhor condição do que os funcionários europeus, para, de imediato, se aperceberem das consequências práticas no seu país da aprovação de muitas das medidas propostas.

Se assim não acontecer, corremos o risco, mesmo contra os desejos dos participantes no processo legislativo, de serem por estes aprovadas medidas supostamente inofensivas que, todavia, contendem com o desenho dos modelos nacionais, dificultando, mais ainda, a harmonização dos sistemas jurídico-judiciário dos diferentes Estados-membro.

Por essa mesma razão, importa não desconsiderar, também, o caráter plurinacional de alguns organismos europeus existentes como, por exemplo, a Eurojust.

Em tal característica tem residido, afinal, o êxito do seu funcionamento e o útil contributo que aqueles dão para o processo legislativo europeu.

A sua participação será tão mais útil quanto as discussões e análises, informadas e integradas, que nesses organismos plurinacionais em geral se realizam, consigam exprimir, genuinamente, as diferentes e específicas realidades que, de facto, coexistem a nível europeu.

Só a partir de tais diferenças – e não necessariamente contra elas -, é possível, pois, ir construindo paulatinamente e com uma progressiva e acrescida confiança mútua, uma cultura jurídico-judiciária comum que integre, na prática judiciária de todos, os princípios humanistas e democráticos, exigíveis em Estados de Direito.