Há quem diga que a crónica é literatura dos pobres mas, enfim, diz-se tanta coisa. Provavelmente quem o afirma é por achar que as crónicas são assim para o curtinho e cabem numa qualquer coluna de jornal como esta. Enfim, também não acredito que um sujeito acorde pela manhã, fresquinho, homericamente bem disposto, e diga para com os seus botões: “Vou já aqui rabiscar uma Odisseia que até lhes ponho a cabeça a andar à roda!” A mim nunca tal aconteceu e escrevo às grosas, ou melhor, aos almudes, como os meus amigos bem sabem. Ia agora mesmo fazer uma citação a propósito, como por exemplo: “Se tivesse tido tempo escrevia esta crónica mais curta, desculpem lá”, mas o problema dessa citação é haver umas poucas de pessoas a quem atribuí-la, desde Blaise Pascal a Mark Twain, de Descartes a T.S. Eliott, de Voltaire a Fernando Pessoa. Mauro F. Rebelo, jornalista brasileiro – que não é de forma nenhuma suspeito de ter escrito o calembur – resolveu fazer uma pesquisa na internet utilizando as combinações desculpe+longa+carta+tempo+escrever e arrependeu-se desde logo de ter entrado por tamanho labirinto. Perdeu horas na busca e, no final, o assunto só deu para uma crónica, pequenina, pouco maior do que esta, se o for. Não sei se dá para tirar grandes conclusões sobre a matéria em causa se não aceitar o facto de que o google se prepara para ser, se já não é, o maior amigo do cronista. O nosso Luís de Camões, que não tinha internet (nem um olho, já agora), também não precisou dela para escrever a maior crónica de todos os tempos e, ainda por cima, em dez cantos de mil cento e duas estrofes em oitavas decassilábicas. Alguém que lhe fosse dizer que aquilo não era literatura. Razão tinha Cavaleiro de Oliveira para quem os Lusíadas só tinham dois defeitos: eram grandes demais para se saberem de cor e pequenos demais para serem infinitos. Como certas crónicas…