O Ex-Presidente da República Aníbal Cavaco Silva veio recentemente, através da publicação de um artigo no jornal Público, exortar o Governo a apresentar uma estratégia reformista de longo prazo para, nas suas palavras, fazer “face à trajetória de empobrecimento do País”.
Não é fácil classificar o artigo do Professor Aníbal Cavaco Silva como boa moeda, quando nos recordamos que foi o próprio que deu total cobertura e até incentivou a trajetória de empobrecimento acelerado do País durante o consulado dos Governos Passos /Portas, em nome de uma narrativa cujo objetivo era ir “além da Troika” num programa de cortes, privatizações, congelamento de carreiras, redução de salários e outras malfeitorias que ainda perduram na nossa memória coletiva.
O Programa de Governo e as opções plasmadas no desenho do Quadro de Financiamento Plurianual “Portugal 2030” e no Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) contêm em si mesmas os alicerces de uma estratégia reformista de longo prazo, ambiciosa, focada na coesão e na convergência, ou seja, num crescimento sustentável da produtividade em todos os setores, para permitir assegurar mais competitividade e uma redistribuição justa.
A transversalidade setorial e territorial das opções estratégicas não dispensa, no entanto, por uma questão de comunicação, mobilização, focalização de esforços, otimização de recursos e de competências e capacidade de execução, a definição de algumas bandeiras estratégicas que sirvam de referência à caminhada e permitam uma fácil avaliação das dinâmicas no terreno. Em complemento, e embora saiba que isso depende mais da “boa vontade” da máquina europeia do que da vontade já expressa do Governo português, é precisa uma nova cultura de aprovação, acompanhamento e financiamento de projetos, adaptada aos tempos de volatilidade e turbulência em que vivemos, que permita conjugar flexibilidade e transparência.
Sobre estas questões maiores, o artigo do Ex-Presidente fica-se nas covas. Prefere lançar-se em homotetias semânticas sobre alguns episódios da governação, em linha com aquilo a que o então Ministro da Economia António Pires de Lima qualificou de “casos e casinhos”.
Não nos deixemos iludir. Temos uma absoluta necessidade de fazer investimentos transformadores nas infraestruturas, na educação e qualificação, no acesso aos fatores produtivos e na capacidade de levar os serviços públicos junto dos cidadãos. Temos recursos financeiros e linhas de financiamento aprovadas para os concretizar. Temos também graves fatores de incerteza na economia e na sociedade e carência de capacidade de concretização de “obra” em muitos setores.
Face a este cenário, a boa moeda de que precisamos não é a moeda do ressabiamento e da fratura, mas sim daquela que forra o tesouro da confiança económica e social. Confiança para concordar ou discordar, escrutinar, debater, sugerir, melhorar, corrigir, mas sempre para fazer acontecer, de forma construtiva, com determinação, aquilo que tem que ser feito para ultrapassarmos os momentos difíceis que vivemos e ficarmos mais fortes e preparados para os desafios da nova ordem global.
Eurodeputado do PS