Faz de conta que ainda é cedo


Vejo-te passar ao longe, pela vidraça, como um sonho antigo que não voltarei a sonhar. O ritmo dos teus passos, o chão que pisas, as dunas da Biarritz já quase todas atropeladas pelo betão dos prédios que teimam em surgir amontoados uns nos outros


Sem fazer barulho, o céu caiu-nos em cima da cabeça. Por mais que esforce a vista na distância não distingo a silhueta do Caramulo. Parece que os tuberculosos que lá eram internados costumavam dizer: “É preciso uma saúde de ferro para aguentar este clima!” É preciso uma disposição de ferro para combater a manemolência que este nevoeiro baixo, pegajoso, nos provoca. Não é fácil levantar o olhar porque, de tão baço, o céu quase que cega.

O farol mudo, sem a ronca de outros tempos, as esplanadas vazias, um fila teimosa de carros em direção à Costa Nova onde me sento a almoçar com o Paulo Sousa e a sua filha, pondo em dia conversas antigas, sabendo que o Manel nos trata sempre com o carinho do costume. Conheço o Paulo há tantos anos que é fácil perder-lhes a conta. Era um menino, no Benfica, e chamavam-lhe Nuno Ferrari, de brincadeira, porque tal como o Nuno deixava cair os fundilhos das calças. A ria está plácida na sua cor de cimento, os barcos atracados ao cais do Clube de Vela, uma conversa lenta de quem tem tempo para gastar, embora o tempo não se gaste e apenas se renove. Não é momento de andarmos contra o vento, embora eu e ele sejamos daqueles que teimam em caminhar contra o vento, ou pelo menos de encontro ao vento do destino que nos querem impor. Mesmo que, por vezes, o destino não seja, sequer, tão importante como o caminho que a ele leva.

Vejo-te passar ao longe, pela vidraça, como um sonho antigo que não voltarei a sonhar. O ritmo dos teus passos, o chão que pisas, as dunas da Biarritz já quase todas atropeladas pelo betão dos prédios que teimam em surgir amontoados uns nos outros. Para onde vais? Certamente para o lado contrário ao meu. Não tem sido assim ao longo da nossa vida? A música renasce do fim dos tempos: “Eu preciso respirar/O mesmo ar que te rodeia/E na pele quero ter/O mesmo sol que te bronzeia…” Faz apenas de conta que ainda é cedo.

Faz de conta que ainda é cedo


Vejo-te passar ao longe, pela vidraça, como um sonho antigo que não voltarei a sonhar. O ritmo dos teus passos, o chão que pisas, as dunas da Biarritz já quase todas atropeladas pelo betão dos prédios que teimam em surgir amontoados uns nos outros


Sem fazer barulho, o céu caiu-nos em cima da cabeça. Por mais que esforce a vista na distância não distingo a silhueta do Caramulo. Parece que os tuberculosos que lá eram internados costumavam dizer: “É preciso uma saúde de ferro para aguentar este clima!” É preciso uma disposição de ferro para combater a manemolência que este nevoeiro baixo, pegajoso, nos provoca. Não é fácil levantar o olhar porque, de tão baço, o céu quase que cega.

O farol mudo, sem a ronca de outros tempos, as esplanadas vazias, um fila teimosa de carros em direção à Costa Nova onde me sento a almoçar com o Paulo Sousa e a sua filha, pondo em dia conversas antigas, sabendo que o Manel nos trata sempre com o carinho do costume. Conheço o Paulo há tantos anos que é fácil perder-lhes a conta. Era um menino, no Benfica, e chamavam-lhe Nuno Ferrari, de brincadeira, porque tal como o Nuno deixava cair os fundilhos das calças. A ria está plácida na sua cor de cimento, os barcos atracados ao cais do Clube de Vela, uma conversa lenta de quem tem tempo para gastar, embora o tempo não se gaste e apenas se renove. Não é momento de andarmos contra o vento, embora eu e ele sejamos daqueles que teimam em caminhar contra o vento, ou pelo menos de encontro ao vento do destino que nos querem impor. Mesmo que, por vezes, o destino não seja, sequer, tão importante como o caminho que a ele leva.

Vejo-te passar ao longe, pela vidraça, como um sonho antigo que não voltarei a sonhar. O ritmo dos teus passos, o chão que pisas, as dunas da Biarritz já quase todas atropeladas pelo betão dos prédios que teimam em surgir amontoados uns nos outros. Para onde vais? Certamente para o lado contrário ao meu. Não tem sido assim ao longo da nossa vida? A música renasce do fim dos tempos: “Eu preciso respirar/O mesmo ar que te rodeia/E na pele quero ter/O mesmo sol que te bronzeia…” Faz apenas de conta que ainda é cedo.