A Europa não tem sido, ao longo dos anos, uma mão amiga que embale o berço da cidade que viu nascer Portugal. Esta época, o Vitória de Guimarães comemorou o seu 100º jogo para as provas da UEFA mas voltou a ser infeliz e a ficar pelo caminho, desta vez na Taça Conferência (a bem dizer uma espécie de terceira divisão, muito terceira divisão mesmo), eliminado pelo Hajduk Split.
Foi ainda mais a leste que tudo começou, na época de 1969-70. Ou, melhor dizendo: tudo começou em Guimarães, porque na primeira mão da primeira eliminatória da que ainda se chamava Taça das Cidades com Feira, a estreia dos vimaranenses foi em casa e só depois viajaram para lá da então Cortina de Ferro e, em Ostrava, na antiga Checoslováquia, defrontaram o Banik.
Dia 10 de setembro de 1969. Havia uma saudável inquietação na cidade, no peito dos adeptos. Algo de novo. Algo de absolutamente novo. Às 17h45, hora apontada para que o árbitro espanhol, Adolfo Bueno apitasse para o início do encontro (os fiscais de linha eram ambos portugueses, sinal dos tempos…), o velho Municipal de Guimarães estava cheio de gente particularmente entusiasmada. As autoridades apelaram para que o comércio encerrasse portas a partir das 17h de forma a que os seus funcionários também pudessem não perder pitada do histórico acontecimento.
A paixão podia ser forte mas resistiu pouco. Terceiro classificado da época anterior, atrás do campeão Benfica e do vice-campeão FC Porto, à frente de Vitória de V. Setúbal e de Sporting, por esta ordem, jogou assim para o malzote e sabemos todos como o público de Guimarães é exigente. Achou que a sua rapaziada estava a atuar muito abaixo do que a era obrigada. De repente ouviu-se o primeiro assobio. Depois mais um e, logo, logo outro. Às tantas já era muitos, em uníssono. É preciso acrescentar que os adeptos portugueses eram, na altura, muito ignorantes em relação ao futebol internacional. “Banik de Ostrava? Devem ser um passarinhos”. Eis o que terá passado pela cabeça do povo. Atenção: estávamos a falar de um clube que fizera a sua história fronteiras fora através da Mitrocopa Cup (que envolvia os campeões dos países da Europa Central) e de um dos candidatos ao título de campeão de um campeonato que não era propriamente a brincar.
A alegria! A mais conseguida das presenças do Vitória na Europa foi em 1986/87 quando resistiu até aos quartos-de-final, sendo eliminado pelo Borussia M’Gladbach. A estreia, que é o que aqui nos traz, acabou alegremente. Vitória em casa sobre o Banik. Golo de Carlos Manuel, aos 10 minutos, com um remate já dentro da área, antes de o guarda-redes Roldão assumir o protagonismo e se tornar na grande figura do jogo.
No dia 2 de outubro, Fernando Caiado assumiu, já em Ostrava: “Não estamos aqui para defender o golo que trazemos de vantagem. Iremos atacar e iremos, certamente, fazer golos”. Exibindo uma serenidade admirável, ainda por cima em comparação com o jogo em casa, o Vitória foi esplêndido. Aguentou a fúria ofensiva dos checos, manteve-se coeso, dominou os movimentos coletivos no meio do terreno. Com tanto equilíbrio, tudo foi resolvido no último quarto-de-hora. A festa dos adeptos do Banik rebentou aos 74 minutos através do golo de Busnik. Sem perder a compostura, o Guimarães respondeu com um golo de Artur, seis minutos mais tarde – nessa altura ainda (ou já) valiam os golos fora. Assunto arrumado. Só que esta foi a alegria definitiva que levava os portugueses para a eliminatória seguinte. Ora, para quem estava a começar, não podia exigir-se muito mais. Logo a seguir, o problema foi muito mais bicudo: calhou por sorteio os ingleses do Southampton. 3-3 em Guimarães; 1-5 fora. Naturalmente “out”…