Este não é um texto sobre Paula Rego. A singularidade da sua obra e a natureza escapista do seu legado será sempre mais bem tratada noutros espaços pelos peritos. Não tenho pretensão de ser connoisseur. Muito menos colecionador de arte. Por isso, limito-me a falar do que sei.
E o que eu sei é que, de tempos a tempos, por razões que a razão desconhece, há sempre quem procure a efemeridade dos holofotes à custa da Casa das Histórias Paula Rego (CHPR). A Instituição sobre a qual, de forma pouco imaginativa, são lançados feitiços que anunciam a perda do espólio, o esvaziamento da instituição e, como fatídico corolário, o encerramento do Museu. Para encontrar uma explicação para este estéril exercício de futurologia fatalista e obsessiva, temos de procurar as motivações no passado destas personalidades do mundo da cultura que, não raras vezes, estão associadas a projetos meritórios, quase sempre avultados, aos quais os portugueses foram incapazes de reconhecer a devida pertinência.
Mas, como eu dizia, este não é um texto sobre Paula Rego. Este é um texto sobre o seu Museu: a nossa Casa das Histórias. A nossa Casa das Histórias que, a partir de Cascais para o mundo, exibe orgulhosamente o génio e a irreverência da mulher portuguesa personificada por Paula Rego.
A pintora deixou-nos há pouco mais de um mês. O seu espaço nunca será ocupado. A sua perda ainda está a ser vivida intensamente pela família. O que torna ainda mais despropositadas, insensíveis e oportunistas as interrogações que alguns começam a plantar nos media sobre o futuro CHPR.
Projeto do consagrado arquiteto Souto Moura, a Casa inaugurou em 2009 e desde logo se assumiu como uma marca indelével na identidade arquitetónica de Cascais – e do país.
Com mais de 500 obras de Paula Rego doadas ao Museu, a CHPR não demorou muito tempo a conquistar o lugar de maior atração turística no nosso concelho. A caminhar para um milhão de visitas acumuladas, que se renovam a todo o tempo para acompanhar as dezenas de exposições que ali foram realizadas, a Casa conta histórias de sucesso.
Administrada conjuntamente pela família de Paula Rego – através do seu filho Nick Willing -, pela Fundação D. Luís I e pela Câmara Municipal de Cascais, numa relação de excecional confiança, consistência e alinhamento, a Casa das Histórias é gerida ao abrigo de um contrato que se estenderá pelo menos até 2029.
Sublinho “pelo menos” porque, nesse ano, a família e a Câmara Municipal, através da Fundação D. Luís I, já têm previsto o prolongamento do contrato por um período de mais dez anos. Essa era, de resto, a vontade de Paula Rego: que a sua “Casa” continuasse a expor os seus “bonecos” durante muitos anos. E em Cascais estamos dispostos a cumprir a sua vontade. Receberemos mais obras e reforçaremos a sua coleção.
Estas informações seriam suficientes para todos constatarem o óbvio: qualquer conversa sobre o fecho ou “esvaziamento” da Casa das Histórias é absurda e mal-intencionada. Todavia, como dizia o sábio Orwell, “ver o óbvio à nossa frente exige um esforço constante”.
Ora, neste nosso tempo cada vez mais rendido à acrítica aceitação de falsidades, nesta idade de ouro da ignorância, é a esse esforço que me dedico nas páginas deste jornal.
Reafirmando, para que não restem dúvidas, que a Casa das Histórias Paula Rego nunca esteve, não está e nunca estará em risco.
Porque o compromisso de Cascais com a família na administração da CHPR é total – e é recíproco.
Porque a Casa das Histórias Paula Rego é uma atração nacional, uma marca do cosmopolitismo e universalismo de Cascais.
Porque Paula Rego faz parte do património e da identidade de Portugal.
Em Cascais, continuaremos a zelar pela sua “Casa”. E eu, como Paula Rego me pediu, continuarei a cuidar dos seus “bonecos”.