Por Maria Antónia Almeida Santos, Deputada do PS
Nunca foi tão premente olhar para o direito à saúde como direito universal. Hoje, faz mais sentido falar de saúde global. Não há países sozinhos tudo está interligado. As transformações que o mundo atravessa, os avisos da Agência Europeia do Ambiente alertam já para os efeitos das alterações climáticas na saúde pública, por exemplo. Há mais mortes relacionadas com fenómenos extremos e alterações na distribuição de algumas doenças. O impacto da pandemia e a forma como vamos conseguir sair dela.
A democracia, constituída por pessoas e orientada para as mesmas, não assume também ela um certo cariz orgânico? Tal como o corpo humano, é algo que tem de ser cuidado e mantido. O mesmo se passa com o SNS. No entanto, tendo por referência uma cobertura universal, há, de facto, uma questão que se impõe: que equilíbrio possível entre o número de cidadãos alcançados, o investimento e os recursos existentes? À nossa democracia e ao SNS, devemos a síntese entre qualidade e sustentabilidade que permite manter e alargar a prestação efetiva de cuidados de saúde que queremos.
As respostas dependerão da capacidade de refletirmos em conjunto a nível de conceitos, políticas e práticas. Do ponto de vista das políticas de saúde, a discussão dicotómica entre custo ou um investimento vai paulatinamente perdendo o seu espaço, reduzindo-se a um mero confronto retórico.
Os mais diversos agentes do setor e não só, aceitam hoje de forma quase unânime que o investimento em saúde se traduz em múltiplas dimensões sociais, culturais, laborais e com isso igualmente económicas e financeiras. São já vários os estudos que comprovam que o investimento no SNS possibilita o retorno de milhões para a economia, pelo impacto dos cuidados de saúde no absentismo e na produtividade. É evidente que o investimento no SNS delineado com base científica e responsável traz sustentabilidade ao sistema.
A própria otimização de métodos de diagnóstico e terapêuticas tem retorno, tal como a promoção da literacia em saúde, com medidas profiláticas e de prevenção criadoras de hábitos de vida saudáveis. Se nos debruçarmos então no impacto que um sistema de saúde como o português, assente no SNS universal, geral e tendencialmente gratuito no momento do consumo, representa para a esmagadora maioria dos setores da nossa sociedade, e nos outcomes que gera para os diferentes segmentos da nossa economia, facilmente concluímos pelo seu tremendo custo-efetividade.
Ao longo de 43 anos, o Serviço nacional de saúde foi evoluindo com a realidade do País, procurando acompanhar as suas mudanças demográficas, económicas sociais e culturais, mas os últimos dois anos foram mais um desafio à capacidade de adaptação do SNS, que fez jus à confiança que nele depositámos.
O SNS não fechou portas na pandemia; os seus profissionais estiveram na linha da frente; foi o SNS que possibilitou a vacinação da população e agora é o SNS que está a trabalhar para recuperar da atividade assistencial que ficou por realizar. Mas o SNS defronta-se com problemas muito complexos (crescentes necessidades assistenciais a custos crescentes, criação de atratividade de profissionais de saúde para o SNS).
O Novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde constitui um plano para concretizar as respostas que permitam responder melhor aos problemas que todos sentimos. Mais organização, mais autonomia das entidades que prestam cuidados de saúde, nos Cuidados Primários e Cuidados Hospitalares, em suma melhor acesso a cuidados que todos precisamos ou vamos precisar, mais motivação dos profissionais de saúde e ainda na concretização das reformas e investimentos previstos no PRR. Uma certeza já temos: em saúde, o investimento que definitivamente não tem retorno, é o que se fizer no debate estéril e populista.