Wimbledon. Djokovic venceu a final entre os dois ‘mauzões’ do ténis mundial

Wimbledon. Djokovic venceu a final entre os dois ‘mauzões’ do ténis mundial


Novak Djokovic bateu Nick Kyrgios na final de Wimbledon – conquistou a prova pela 7.ª vez e o 21.º Grand Slam da carreira. Sérvio e australiano tornaram-se amigos improváveis pelo caminho.


“É uma espécie de Deus”. Foi desta forma que Nick Kyrgios se dirigiu a Novak Djokovic, campeão do Wimbledon pela sétima vez. O sérvio conquistou o 21.º título do Grand Slam da carreira este domingo, no All England Club, depois de bater o australiano por 6-4, 6-3, 6-4 e 7-6 (7-3 no tie break). No final, o número três do ranking mundial voltou a cumprir a sua tradição e comeu um pedaço de relva. 

Mas a história entre os dois tenistas vai muito além da final que ontem disputaram e à qual, aliás, o australiano teve acesso de forma mais ‘rápida’ depois da desistência de Rafael Nadal nas meias-finais, após ter sido detetada uma rotura num músculo abdominal. Apesar do tempo-extra de descanso, e desse fator ter sido visto como uma mais-valia para o tenista estreante em finais de Grand Slam em singulares, o rebelde australiano admitiu que o ‘salto’ direto para a final o deixou ansioso e revelou que tinha dormido apenas uma hora na noite antes do encontro com Djoko.

“Lamento não jogar contra o Nadal, só dormi uma hora. Estou nervoso, o que não é normal. Soube ao jantar que o Nadal não iria jogar. A primeira sensação que senti foi uma deceção, toda a minha energia estava em como enfrentar o jogo. Espero vê-lo de volta ao circuito em breve. Terei dormido uma hora. Senti um pouco de ansiedade. Estou muito nervoso”, comentou Nick Kyrgios.

O australiano – mais conhecido pelas suas polémicas do que propriamente pelo seu talento nos courts – aproveitou ainda o momento histórico na sua carreira para relembrar o seu percurso na modalidade. Kyrgios partilhou na sua página oficial do Instagram duas imagens suas, uma em criança e uma atual, com o objetivo de mostrar que é possível cumprir metas e sonhos.

“Olhem para a foto, vejam quem eu era. Era um miúdo guloso e agora estou na final de um Grand Slam. Jogava em Camberra, em alguns campos horríveis. E vejam onde cheguei, à final de Wimbledon. Significa que é possível. Não parem de acreditar nisso, Na foto eu parecia o Manny de ‘Modern Family’. Não acreditava que aos 27 anos conseguiria chegar aqui. Mas agora tenho a minha chance. A minha relação com o ténis? Não sei… Há momentos em que odeio este desporto, outros em que acho que sou uma das pessoas mais competitivas que já vi. Mais do que de ténis, gosto muito de competir, seja na Nintendo ou quando jogo basquetebol. Uma coisa é certa: ficarei feliz se ganhar ou se perder no domingo”. Perdeu a final, isso é certo. Mas ganhou um jantar oferecido pelo mais recente campeão de Wimbledon. 

Com uma relação conturbada até há bem pouco tempos, Kyrgios e Djokovic fizeram questão de mostrar que as desavenças fazem parte do passado, com o machado de guerra a ser enterrado quando o tenista australiano defendeu o sérvio durante a sua detenção por não estar vacinado contra a covid-19. “Agora temos uma espécie de ‘bromance’, é uma coisa um pouco estranha. Toda a gente sabe que não gostávamos um do outro, por assim dizer. Mas acho que fui o único jogador a apoiá-lo quando foi à Austrália. Passámos a respeitar-nos lá. Agora trocamos mensagens no Instagram e coisas assim. No início desta semana, ele disse-me: ‘Espero ver-te na final”, revelou Kyrgios. 

De inimigos públicos ao jantar Até antes da final os dois jogadores não deixaram de trocar algumas picardias. “Demoraste cinco anos a dizer alguma coisa boa sobre mim”, referiu Djokovic. “Mas defendi-te quando tu mais precisavas”, relembrou Kyrgios. “Isso é verdade, fizeste isso e agradeço-te pela atitude”, reconheceu o sérvio. Já nas redes sociais, o jogador australiano recuperou este bate-boca e deixou uma questão: “Agora somos amigos?”. Djoko foi lesto na resposta: “Se me estás a convidar para um copo ou para jantar, aceito. O vencedor [de domingo] paga”. “Está combinado então, vamos para a noite e vamos ficar loucos”, prometeu Nick Kyrgios.

A final mais esperada de Wimbledon (naturalmente entre Djokovic e Rafael Nadal) até pode não ter acontecido, mas fica para a história um encontro entre os dois ‘mauzões’ do ténis mundial. 

Além das várias novelas que protagonizou devido à postura que assumiu em relação à pandemia de covid-19, facto que muito provavelmente irá custar-lhe a participação no próximo US Open, uma vez que continua sem estar vacinado, também a relação do sérvio com o público faz correr muita tinta. 

O último episódio aconteceu precisamente quando venceu Cameron Norrie em quatro partidas, pelos parciais de 2-6, 6-3, 6-2 e 6-4, e apurou-se para a final de Wimbledon. Após o triunfo, o sérvio festejou com beijinhos para as bancadas, onde estavam presentes muitos apoiantes do britânico, que jogava em casa.

E Kyrgios não lhe fica atrás. Muito pelo contrário. O tenista de 27 anos aproveitou esta edição do Wimbledon para anexar novas entradas à longa lista de confusões que tem colecionado ao longo da carreira. Logo na primeira ronda da prova (na qual Kyrgios bateu o britânico Paul Jubb em cinco sets) admitiu ter cuspido na direção de um espectador por se sentir desrespeitado pelo mesmo.

Após o encontro, o tenista reclamou ainda da qualidade da relva, do barulho vindo das bancadas e no fim, na conferência de imprensa, surgiu com um prato de sushi e aproveitou para ‘matar’ a fome enquanto respondia às perguntas dos jornalistas. 

De resto, apresentou-se no seu registo de sempre com as habituais implicações com os árbitros e quebras de protocolo. Kyrgios usou por mais do que uma vez um boné encarnado na prova conhecida pelas vestes brancas integrais. Aliás, o bad boy australiano voltou a colocar o mesmo boné quando foi receber o troféu de vice-campeão pelas mãos de Kate Middleton. Quando questionado na primeira vez sobre o facto de ter usado este acessório, respondeu ao seu jeito: “Faço o que quero”. 

De notar que apesar da vitória em Wimbledon, Djokovic vai cair do terceiro para o sétimo lugar da hierarquia mundial, porque a pontuação do torneio britânico, este ano, não é considerada pelo ATP. A decisão deve-se ao boicote da organização a tenistas russos e bielorrussos, pela ação militar da Rússia na Ucrânia.

Aos 35 anos, Djokovic chega aos 21 Grand Slam na carreira e fica oficialmente a um do recorde de Nadal, de 36 anos. Roger Federer, de 40 anos, mantém-se em terceiro com 20. 

Ainda antes da final, Nick Kyrgios tinha também deixado vários elogios às três principais estrelas da modalidade: “Nunca haverá alguém que toque a bola como Roger, alguém competitivo como Rafa ou alguém que ganhe os jogos como Djokovic. Existem alguns tenistas muito fortes, como Alcaraz e Sinner, que jogam sem medo. Mas acho que ninguém conseguirá repetir os feitos [de Nadal, Djokovic e Federer] e será um dia triste quando eles se retirarem. Federer, Nadal e Djokovic são uma raridade”.