PSD. Montenegro só abre livro no Congresso

PSD. Montenegro só abre livro no Congresso


Tirando a escolha de Joaquim Miranda Sarmento para a bancada parlamentar, o novo líder guardou tudo a sete chaves até à reunião dos sociais-democratas no Porto.


Arrancou ontem o 40.º Congresso do PSD, no Porto, com a última intervenção de Rui Rio. Quatro anos e quatro meses depois de ter sido eleito pelos militantes, abandonou a presidência social-democrata depois de ouvir o discurso de abertura de Luís Montenegro.

O novo líder social-democrata chegou à reunião magna do partido em condições promissoras: de um lado, o Governo socialista a lamber as feridas da mais recente crise entre António Costa e Pedro Nuno Santos centrada no futuro aeroporto, do outro uma oposição interna que não levantou muitas ondas.

Luís Montenegro subiu ao palanque do Pavilhão Rosa Mota perante uma plateia animada com a crise política no Governo que foi servida de bandeja na véspera do Congresso ao novo líder do principal partido da oposição. É de esperar que a polémica entre o primeiro-ministro e o ministro das Infraestruturas contamine os discursos durante os três dias, até porque Pedro Nuno Santos referiu-se a Luís Montenegro várias vezes por ter acusado o Governo de «incompetência» na questão do futuro aeroporto.

Internamente, o discurso mais aguardado é o de domingo, que deverá ser o tiro de partida para ditar o estilo de oposição que Montenegro fará à maioria absoluta socialista, depois de António Costa ter ordenado a revogação do despacho do ministro sobre a solução Montijo/Alcochete, alegando ter de negociar com o PSD a solução para o novo aeroporto de Lisboa. O primeiro-ministro aceita esperar pelos timings de Montenegro, se este quiser negociar. A estratégia é pressionar o novo  líder da oposição e pôr o ónus do lado do PSD para a decisão.

Agora, os sociais-democratas aguardam para ver qual será a posição de Montenegro, que optou por ficar em silêncio e não ter intervenções públicas até esta sexta-feira. Se alinhar num consenso, os seus críticos internos não hesitarão em colá-lo à imagem de ‘colaboracionista’ do Governo que Rio conquistou depois de ter dado a mão ao PS em várias ocasiões. Em sentido contrário, poderá instrumentalizar esta crise no Governo para atirar farpas a Costa e demarcar-se, desde já no discurso de encerramento, da estratégia seguida pelo seu antecessor e marcar um novo estilo de oposição no PSD.

Acresce ainda outra vantagem: nenhum dos críticos mais acérrimos organizou listas ao Conselho Nacional do PSD, órgão máximo do partido entre Congressos. E não é por acaso. A estratégia é não dar razões ao antigo líder parlamentar de Passos Coelho para se vitimizar e refugiar-se no argumento que conduziu às três vitórias internas de Rui Rio – o de que o partido nunca o deixou verdadeiramente liderar. 

Mesmo o seu adversário nas diretas de 27 de maio, Jorge Moreira da Silva, em nome da unidade interna, não integra qualquer lista ao Conselho Nacional, tal como o seu diretor de campanha, Carlos Eduardo Reis. Ainda havia a hipótese de o autarca lisboeta, Carlos Moedas, que fez dos discursos mais ovacionados do último Congresso, em dezembro, ir a este jogo. Mas também ele se mostrou indisponível para funções executivas e, portanto, não apresentou qualquer lista alternativa.

Miguel Pinto Luz, que na última reunião magna fez um discurso contracorrente e conseguiu ter a segunda lista mais votada, superando a equipa apresentada por Luís Montenegro e capitaneada pelo madeirense Pedro Calado, presidente da Câmara Municipal do Funchal, desta vez decidiu também não ir a jogo.

De resto, o presidente da JSD distrital de Aveiro apresentou uma lista alternativa ao Conselho Nacional. Sob o mote ‘Ligados ao PPD/PSD’,  a lista encabeçada por Pedro Veiga, é composta por militantes «que não aceitam nem se conformam com a inércia dos tempos» e que pretendem «preconizar e dar espaço a uma linha de pensamento que devolve o PSD às suas bases, com foco nas causas de futuro», lê-se numa nota enviada ao Nascer do SOL.

Já o ex-secretário-geral do PSD, José Matos Rosa, vai encabeçar uma lista ao Conselho Nacional, mas rejeita qualquer ideia de oposição interna ao novo líder. Além de Matos Rosa, o ex-deputado André Pardal, que foi apoiante de  Moreira da Silva, irá liderar outra lista, mas integrando elementos que estiveram com o ex-ministro do Ambiente e também com Montenegro.

 

Bancada arrumada

Como é normal, a primeira intervenção do novo presidente social-democrata foi dedicada à apresentação da sua proposta de estratégia global, que será votada este sábado. A moção, intitulada ‘Acreditar’, contém compromissos como o lançamento do Movimento Acreditar,  uma espécie de plataforma de discussão política aberta à militância com vista à elaboração de um programa eleitoral até 2024, e define o posicionamento do PSD como o partido líder de todo o espaço não-socialista.

O 19.º presidente eleito do PSD tem estado praticamente em silêncio desde as diretas, guardando segredo sobre quem vai levar para os órgãos nacionais que serão eleitos no domingo. De forma discreta, foi sondando eventuais disponibilidades, deixando os convites formais para as vésperas do encontro no Palácio de Cristal, no Porto.

Até agora, a única aposta segura era Hugo Soares, braço direito de Montenegro nas diretas, que é apontado para suceder a José Silvano e assumir funções como secretário-geral do partido, tal como já tinha avançado o Nascer do SOL no início deste mês. O bracarense sucedeu a Montenegro na liderança da bancada parlamentar social-democrata, até ser corrido por Rui Rio, num processo que deixou feridas abertas entre o rioísmo e o montenegrismo. Também tem sido ele a tratar de perto o processo da transição com José Silvano.

Nas hostes ‘laranjas’, a dúvida é se Montenegro fará uma direção apenas com o núcleo duro dos seus principais apoiantes — entre os quais se contam Miguel Albuquerque, Pedro Duarte, Pedro Alves, Paulo Cunha, Margarida Balseiro Lopes, Carlos Coelho, António Leitão Amaro ou Pedro Reis — ou se irá repescar nomes de outras alas do partido.

Depois de ter apregoado à unidade interna durante a campanha, o novo líder deu um sinal nesse sentido. No último mês, muito se especulou sobre o que faria à bancada parlamentar encabeçada por um dos maiores apoiantes de Rio. Na véspera do Congresso foi desfeito o mistério. Paulo Mota Pinto foi afastado a pedido de Montenegro e o homem que ficou conhecido como o ‘Centeno de Rio’ foi o candidato escolhido para comandar o grupo parlamentar do PSD. Menos de dois meses depois de ter sido eleito, Mota Pinto deixa a liderança da bancada social-democrata e convocará eleições para 12 de julho, depois de se ter tornado evidente que a relação política com Montenegro não oferecia condições para continuar no cargo.

Já Miranda Sarmento, que coordenou a moção de estratégia de Luís Montenegro naquilo que foi interpretado como um primeiro sinal da unidade que quer imprimir no partido, terá agora a difícil missão de reagrupar o grupo parlamentar escolhido a dedo por Rio. Se é certo que conquistou relevância interna ao lado do líder cessante, enquanto autor do programa eleitoral do PSD nas últimas legislativas, também é verdade que a aproximação a Montenegro não caiu bem junto de alguns setores do rioísmo. E essa poderá ser uma mais-valia na frente parlamentar.

Os discursos das restantes figuras do partido estão reservados para este sábado. Muito aguardada é a intervenção do candidato derrotado, Moreira da Silva, que desde 28 de maio se tem escusado a comentar a situação interna. Marcará ainda presença no encerramento da reunião Rui Moreira, que aceitou o convite do partido.

 

Rio sai de cena em setembro

Além de fazer um balanço dos seus três mandatos à frente do PSD, admitindo ter cometido erros pelo caminho, Rio reafirmou a sua visão sobre o que é melhor para o país. Mas tentando evitar entrar em conflito com o seu eterno rival que, este domingo, será consagrado líder do PSD, eleito nas diretas de 28 de maio com mais de 72% dos votos.

Rio deixa a liderança do PSD nas mãos de Montenegro, mas vai manter-se como deputado. O debate sobre o Estado da Nação, agendado para o dia 20 de julho, na Assembleia da República, deverá ser o último em que estará presente, mas já garantiu que ficará na Assembleia da República até ao início de setembro.